Justiça do Ceará condena plano de saúde a realizar cirurgia de mastectomia para homem trans (TJCE)

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O Poder Judiciário cearense condenou a Amil Assistência Médica Internacional S.A. a realizar cirurgia de mastectomia bilateral masculinizadora de homem transexual, bem como a pagar indenização por danos morais. A decisão, da 19ª Vara Cível da Comarca de Fortaleza, atende ao Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

De acordo com o processo, o homem transexual (se identifica com um gênero diferente do sexo biológico que lhe foi atribuído no nascimento) deu início à harmonização e uma série de exames e consultas visando à cirurgia de mastectomia bilateral masculinizadora. O procedimento, que consiste na retirada da glândula mamária feminina com o objetivo de transformar o tórax em uma configuração anatomicamente masculina, foi solicitado junto ao plano de saúde e acompanhado por médica especialista.

No entanto, superada a fase pré-operatória, e mesmo após o envio da documentação complementar necessária, a Amil deixou de fornecer resposta sobre a liberação da cirurgia, no prazo estabelecido, impossibilitando o procedimento almejado. Por essa razão, o paciente acionou a Justiça. Requereu que a empresa autorizasse e garantisse a mastectomia, sob pena de multa diária pelo descumprimento, e solicitou indenização por danos morais pelos constrangimentos sofridos.

Citada, a operadora de saúde justificou que os procedimentos de reconstrução do complexo aréolo-mamilar, reconstrução mamária com retalhos cutâneos e excisão de retalhos da região, todos requeridos por analogia, não encontram respaldo técnico ou contratual para cobertura obrigatória, e alegou ausência de danos morais. Ao final, pediu o completo indeferimento da ação.

Ao julgar o caso, no último dia 22 de julho, a juíza Renata Santos Nadyer Barbosa, titular da 19ª Vara Cível de Fortaleza, considerou que os laudos apresentados são suficientes para atestar a necessidade da cirurgia, salientando que “os procedimentos cirúrgicos mencionados neste processo são considerados essenciais à saúde psíquica da pessoa transexual, traduzindo-se na garantia de dignidade humana, da vida e da integridade física”.

A magistrada ainda ressaltou que “a vida e a saúde humanas não podem, jamais, ficar à mercê do interesse meramente econômico da empresa fornecedora de serviço de plano de saúde, em especial decorrente de interpretação/aplicação das cláusulas contratuais em desconformidade com a legislação pátria”. Quanto aos danos morais, entendeu como plenamente configurados e fixou em R$ 5 mil o valor da indenização.

PERSPECTIVA DE GÊNERO

A decisão considerou o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do CNJ. Essa ferramenta objetiva identificar e neutralizar vieses de gênero que influenciem a interpretação do Direito e a aplicação das leis. É uma forma de assegurar decisões judiciais mais justas e equitativas, rompendo com a discriminação e o machismo no Sistema de Justiça.

O Protocolo abrange as diferentes experiências de mulheres e grupos vulneráveis, levando em conta não apenas o gênero, mas também raça, etnia e outros fatores sociais. No caso em questão, o intuito é evitar preconceitos, reconhecer a identidade autopercebida e garantir que as especificidades de gênero de pessoas trans sejam consideradas nos processos, incluindo a realização de cirurgias sem a necessidade de autorização judicial.

Fonte: TJCE, em 02.09.2025