Mariana Paiva1

Mariana Monte Alegre de Paiva

Mariana Monte Alegre Paiva: Sócia de Pinheiro Neto Advogados, atua na área tributária e previdenciária com ênfase em consultivo e contencioso administrativo e judicial, pincipalmente em questões relacionadas à previdência complementar aberta e fechada. Formada em Direito pela FGV DIREITO SP em 2009. Pós-graduada em Economia pela FGV-EESP em 2013. Mestre em Direito Tributário pela FGV DIREITO SP em 2018. Indicada no Análise 500 de 2017 como advogada tributarista no setor de máquinas e equipamentos. Shortlisted na categoria “Rising Star in Tax” na Women in Business Law Americas Awards 2020. Premiada pela Análise Advocacia 2021 – Edição Mulheres Mais Admiradas como advogada previdenciária. Indicada como “Best Employee Benefits Lawyer” no The Best Lawyers in Brazil – 2022.

artigos colunistasLeia todos os artigos

Os impactos do Projeto de Lei Complementar da Reforma Tributária do Consumo sobre o setor de Previdência Privada

Voltar

Mariana Monte Alegre de Paiva
Pedro Javier Martins Uzeda Leon
Sócia e associado de Pinheiro Neto Advogados

Após muita especulação e espera, no dia 25.4.2024 o Ministro da Fazenda Fernando Haddad apresentou o Projeto de Lei Complementar n° 68/2024 (“PLP nº 68/2024”) ao Congresso Nacional para regulamentar parte da Emenda Constitucional nº 132/2023 que instituiu a Reforma Tributária do Consumo.

No que diz respeito ao setor de previdência privada, uma grande preocupação era a inclusão das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (“EFPC”) no rol dos serviços financeiros. E foi justamente isso que ocorreu, a despeito de diversas tentativas de emplacar um regime diferenciado a esse segmento.

O setor de previdência complementar é abordado no PLP nº 68/2024, principalmente na Seção X, em seus artigos 206 a 212, os quais determinam a incidência da CBS e IBS[1] sobre as operações do setor. Mais especificamente, o artigo 207 prevê a incidência sobre contribuições destinadas à entidade – sem especificar qual tipo de contribuição – e encargos decorrentes de estruturação e manutenção de planos de previdência, não incidindo sobre rentabilidade auferida por aplicações financeiras destinados ao pagamento dos benefícios do plano e resgates.

Além disso, o artigo 210 veda o creditamento de IBS e CBS nas operações de aquisições de serviços de previdência complementar, o que leva a crer que aportes feitos por empresas patrocinadoras não gerariam qualquer crédito a compensar. Vale também mencionar o artigo 211, que estabelece a necessidade de as EFPC apresentarem a identificação dos participantes e os valores de suas contribuições pelos valores brutos e líquidos das provisões constituídas, a título de obrigação acessória.

Por fim, um ponto importante que não foi fixado pelo PLP nº 68/2024 é justamente as alíquotas de CBS e IBS incidentes sobre as operações em questão, que, segundo o artigo 209, ainda deverão ser fixadas observados determinados critérios previstos no Projeto. Assim, ainda não há clareza se haverá aumento de carga tributária em comparação com o modelo atual.

Sem prejuízo disso, a nosso ver, o modelo de tributação atribuído ao setor parece não ser o mais adequado. Isso porque, diferentemente das instituições financeiras, seguradoras e mesmo das Entidades Abertas de Previdência Complementar, as EFPC são entidades sem fins lucrativos que apenas gerem e administram recursos de terceiros com a finalidade de futuramente pagar benefícios previdenciários. Logo, a lógica prevista no PLP nº 68/2024 que visa tributar a margem das atividades[2] seria a princípio inaplicável ao caso das EFPC, já que não há qualquer margem agregada.

Nesse sentido, vale lembrar a discussão interminável quanto à diferenciação das EFPCs no que tange ao julgamento do Recurso Extraordinário nº 609.096/RS (Tema nº 372 em Repercussão Geral) que analisou a incidência de PIS e COFINS sobre receitas auferidas por instituições financeiras e equiparadas. Finalmente, o STF houve por bem afetar o Recurso Extraordinário nº 722.528 (Tema nº 1.280) para tratar de forma específica da incidência de tais contribuições sobre as “receitas” auferidas pela EFPC. O julgamento desse segundo Leading Case ainda está pendente, mas, ao que tudo indica, a mesma discussão quanto à incidência de CBS e IBS nas atividades das EFPC deveria se iniciar caso o PLP nº 68/2024 seja aprovado nos termos propostos.

Importante notar que o PLP nº 68/2024 agora começa a tramitar no Congresso Nacional. Até a sua aprovação, esperamos mudanças positivas no texto original, já que a tributação incialmente prevista levaria, possivelmente, à uma oneração demasiada ao segmento, o que certamente prejudicaria sua atratividade no mercado.

Cumpre mencionar que, em paralelo, tramita o Projeto de Lei Complementar n° 52/2024 (“PLP 52/2024”) com objetivo de regulamentar regimes específicos de tributação instituídos pela Reforma Tributária do Consumo. No que tange ao setor de previdência complementar, o PLP bem dispõe que as entidades de previdência privada sem fins lucrativos deveriam se sujeitar à alíquota zero de IBS e CBS.

Na nossa visão, seria essencial que tal lógica fosse adotada, a fim de considerar as particularidades do setor de previdência complementar que, obviamente, merece toda proteção social dada a sua inegável importância como mecanismo de formação de poupança privada de longo prazo.


[1]Contribuição Social sobre Bens e Serviços e Imposto sobre Bens e Serviços, que compõem o chamado “IVA-Dual” e que substituirão, juntamente com o Imposto Seletivo, ao final do período de transição, os atuais PIS/COFINS, ICMS, IPI e ISS.

[2] “153. Na previdência complementar e na capitalização, a base de cálculo é o valor recebido do contratante, com determinados acréscimos previstos em lei, e com a dedução dos valores devidos aos contratantes, de modo a se calcular a margem das atividades. Fica vedado o creditamento do IBS e da CBS para os adquirentes desses serviços, como facultado pela Constituição Federal, uma vez que esses são, tipicamente, pessoas físicas não contribuintes do IBS e da CBS”.

(06.05.2024)