Mudanças à vista no equacionamento de déficit e destinação de superávit
Mariana Monte Alegre de Paiva
Pedro Javier Martins Uzeda Leon
Sócia e associado de Pinheiro Neto Advogados
Entre os temas que mais mobilizam o setor de previdência complementar, poucos são tão sensíveis quanto o equacionamento de déficits e a destinação de superávits de planos. O motivo é evidente: ambos representam impactos financeiros diretos sobre participantes, patrocinadoras e entidades a depender dos resultados financeiros do plano no exercício. O tema se torna ainda mais sensível em função do cenário macroeconômico tão instável e volátil como o brasileiro.
É nesse contexto que a proposta encaminhada pela Diretoria Colegiada da PREVIC ao Conselho Nacional de Previdência Complementar (“CNPC”) em 21.10.2025, com vistas a alterar a Resolução CNPC nº 30/2018, merece especial atenção. A princípio, a proposta promove a adoção do conceito “índice de solvência” como indicador central para aferir a necessidade de equacionamento de déficit ou de distribuição de superávit, estruturando uma meta de 100% de solvência, com bandas de tolerância de 25% para mais ou para menos, em um período de transição de até oito anos. No interior desse corredor, abre-se a possibilidade de aguardar até três exercícios para o retorno ao alvo, sem o acionamento compulsório de planos de equacionamento ou de distribuição de superávit.
O reconhecimento por parte da PREVIC de que choques de mercado, ciclos de juros e volatilidade de ativos, dentre outros fatores, podem, temporariamente, comprimir métricas de solvência — sem traduzir, por si, um problema estrutural do plano, mas sim da conjuntura econômica nacional — incorpora uma lógica contracíclica salutar ao regime.
A nosso ver, há aqui virtudes técnicas claras. O gatilho para definições como equacionamentos de déficits passa a dialogar com um indicador que mede a capacidade efetiva de pagamento ao longo do tempo, e não apenas um recorte de desempenho. Ademais, a tolerância temporal evita respostas que forçam liquidações em mercados estressados e sobrecarregam o setor com contribuições extraordinárias que, à frente, se revelariam desnecessárias.
O desenho, porém, não confunde prudência com complacência. A tolerância é condicionada à manutenção de um piso de 75% e teto de 125% do índice de solvência. Exaurido o prazo de observação sem reversão, retomam-se os mecanismos de equacionamento ou de destinação de superávit. A mensagem é inequívoca: admite-se a ciclicidade; não se admite a inércia diante de déficits estruturais.
Em complemento, a proposta parece recomendar que o somatório de contribuições normais e extraordinárias observe um teto de 35% sobre salário ou benefício previdenciário. Trata-se de medida com racional econômico e social robusto. A partir de determinado patamar, o desconto compulsório corrói a própria finalidade protetiva do plano.
Sob essa ótica, nos parece que o pacote proposto conjuga proteção do participante e estabilidade sistêmica. Ao adaptar o regime de apuração e reação a flutuações conjunturais, confere-se fôlego para que os planos atravessem ciclos sem impor, de forma automática, procedimentos complexos (como equacionamento de déficit) que podem se revelar desnecessários com o passar dos anos.
Agora nos resta torcer e aguardar para que seja dado andamento à proposta encaminhada pela Diretoria Colegiada da PREVIC ao CNPC.
Em outrtubro de 2025


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