As recentes mudanças na tributação sobre aportes em planos de previdência complementar
Mariana Monte Alegre de Paiva
Selton Laurenti Preto
Sócia e associado de Pinheiro Neto Advogados
Nas últimas semanas, os aportes extraordinários na previdência complementar foram objeto de importantes avanços e debates no cenário jurídico brasileiro. De um lado, tramita o Projeto de Lei nº 1.952/2019 no Congresso, cujo texto propõe um tratamento fiscal diferenciado para as contribuições adicionais realizadas para entidades fechadas de previdência complementar (EFPC). De outro, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do REsp 2167007/RJ, consolidou o entendimento favorável à não incidência de contribuições previdenciárias sobre aportes extraordinários efetuados de forma eventual. Esses movimentos, embora em contextos distintos — o primeiro voltado aos beneficiários e o segundo às patrocinadoras —, apontam para um ambiente mais favorável à previdência complementar, com redução de ônus fiscal em situações extraordinárias e estímulo à adesão e manutenção dos planos.
Em primeiro lugar, sobre o PL nº 1.952/2019, de iniciativa do Senador Eduardo Braga (MDB/AM), é oportuno observar que o projeto, originalmente, tratava de temas como alteração da tabela progressiva do IRPF, incidência do IR sobre lucros e dividendos, redução da alíquota do IRPJ e revogação da isenção do IR sobre determinados ativos financeiros.
No entanto, em 24.9.2025, o Senador Esperidião Amin (PP - SC) apresentou a décima primeira emenda ao PL, propondo a inclusão do artigo 4º para alterar o artigo 11 da Lei no 9.532/1997, com a criação do § 8º, que prevê que “As deduções relativas às contribuições adicionais para entidades fechadas de previdência complementar a que se refere o § 1º do art. 21 da Lei Complementar nº 109/2001 não se sujeitam ao limite previsto no caput”.
Em suas razões, o Senador Esperidião argumentou que a medida busca promover justiça fiscal, proteger os participantes e garantir a sustentabilidade do sistema, especialmente diante de um contexto recente de instabilidade no setor previdenciário. De forma mais detalhada, o Senador esclareceu que a proposta não cria isenção ou imunidade tributária, mas apenas altera o momento da incidência do Imposto de Renda, transferindo-o para a fase de recebimento do benefício pelo participante.
Caso aprovada, os efeitos da proposta corrigiriam uma distorção fiscal relevante, promovendo maior proteção aos trabalhadores. O texto prevê a redução do ônus para participantes de fundos de pensão que vêm sendo obrigados a arcar com contribuições extraordinárias para equacionar déficits atuariais, muitas vezes comprometendo parcela significativa de sua remuneração mediante a possibilidade de dedução integral dessas contribuições extraordinárias do seu IRPF, sem atual o limite de 12%.
Importante ressaltar que, até o momento, o PL foi aprovado apenas pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, devendo ainda ser analisado pela Câmara dos Deputados e, posteriormente, submetido à sanção presidencial para que possa entrar em vigor.
Em paralelo, em 27.8.2025, foi publicado Acórdão nos autos do REsp 2167007/RJ, sob relatoria do Ministro Marco Aurélio Bellizze, o qual adotou posicionamento mais favorável às patrocinadoras, no sentindo de que isenção fiscal prevista no art. 28, § 9º, p, da Lei no 8.212/1991 se estende também às contribuições extraordinárias destinadas a planos de previdência complementar, desde que o plano seja acessível à totalidade dos empregados e dirigentes.
Essa é outra problemática da legislação que vem sendo há muito tempo debatida: a legislação isenta de tributação previdenciária aportes feitos em benefício de participantes pelas patrocinadoras a planos de previdência, mas não havia similar regra isentando no caso de contribuições extraordinárias, devidas em situação de déficit atuarial.
Ao analisar o Acórdão, é possível concluir que a isenção dos aportes extraordinários decorre da ausência de natureza remuneratória desses valores, uma vez que não são habituais – justamente porque devidos em casos excepcionais de déficit da entidade de previdência – nem constituem contraprestação direta ao trabalho, não compondo, assim, a base das contribuições previdenciárias. Assim, o STJ excluiu expressamente tais aportes do conceito de salário de contribuição, reforçando que a eventualidade e a finalidade previdenciária afastam o caráter salarial.
Importante destacar que a decisão condiciona a isenção ao cumprimento de alguns requisitos, como (i) a universalidade do plano, estando disponível para a totalidade de empregados e dirigentes; (ii) a realização de aportes pontuais, que não atraiam a característica de habitualidade; e (iii) que os planos de previdência possuam documentação comprobatória para sustentar o benefício em eventual questionamento (como, por exemplo, regulamento do plano, deliberações internas, critérios objetivos e registros que evidenciem a natureza previdenciária e extraordinária dos aportes).
Em última movimentação mapeada, foram opostos Embargos de Declaração pela Fazenda Nacional no REsp 2167007/RJ, os quais permanecem pendente de julgamento até o momento.
Em suma, o PL nº 1.952/2019 busca beneficiar diretamente os participantes e assistidos no âmbito do imposto de renda, enquanto a decisão do STJ confere segurança jurídica às patrocinadoras quanto à não incidência de encargos previdenciários sobre aportes extraordinários. Assim, embora tratem de aspectos distintos, o Projeto de Lei e o julgamento do STJ são complementares e versam especificamente sobre a realização de aportes extraordinários, contribuindo para maior equilíbrio e previsibilidade no regime de previdência complementar, ao fornecer instrumentos de proteção e redução de ônus tanto para participantes quanto para patrocinadoras.
Portanto, a agenda recente sinaliza um ambiente jurídico-tributário mais favorável aos aportes extraordinários na previdência complementar. Os exemplos analisados demonstram na prática que a conjugação das frentes do Poder Legislativo e Judiciário tende a fortalecer a sustentabilidade dos planos e a segurança jurídica dos seus mecanismos extraordinários.
Em setembro de 2025