Joo Marcelo Carvalho

João Marcelo Carvalho

Sócio do escritório Santos Bevilaqua Advogados. Graduado em Direito e em Ciências Atuariais, com Mestrado em Direito e MBA em Administração Financeira.



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Seis pontos da PEC da Reforma da Previdência que impactam as EFPC

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Após intensas discussões e muitas especulações, o governo federal apresentou ao Congresso Nacional a Proposta de Emenda Constitucional que recebeu o número 6/2019, mas que será mais conhecida como a PEC da Reforma da Previdência.

A proposta objetiva promover diversas mudanças, abrangendo não só aspectos previdenciários, mas também questões relacionadas à proteção social de uma maneira mais ampla. Ao lado dos temas mais polêmicos da PEC, estão algumas mudanças que tendem a não ser abordadas com protagonismo pela grande mídia, mas que são de interesse daqueles que militam no segmento que abrange as entidades fechadas de previdência complementar - EFPC.

Por isso, este artigo propõe-se a analisar o texto da PEC com um olhar dedicado às questões relacionadas aos fundos de pensão. Neste particular, seis são os pontos que merecem destaque. Vamos a eles, sem antes sublinhar que o texto da proposta ainda tramitará nas duas casas do Congresso Nacional, podendo sofrer alterações ou mesmo nem ser aprovado.

1. O art. 202 passou incólume

O único artigo da CF/88 que dispõe, exclusivamente, sobre o regime de previdência complementar é o 202, estruturado em caput e seis parágrafos, todos com redação dada pela Emenda Constitucional nº 20/1998.

A PEC apresentada não propõe qualquer mudança no referido dispositivo, o que preserva as características basilares do segmento de previdência complementar, não impondo a realização de alterações nas Leis Complementares nº 108 e nº 109, ambas de 2001.

2. O Regime de Previdência Complementar para os servidores públicos passa a ser uma imposição, e não mais uma faculdade

Caso a proposta prospere como apresentada, o art. 40 da Constituição passará por severas modificações, sendo uma delas a que se refere à redação do § 14. Atualmente, esse dispositivo disciplina que os entes federativos (assim entendidos a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios) poderão instituir regime de previdência complementar - RPC, enquanto que, no texto proposto, a implementação desse regime passa a ser mandatória. Tanto no texto vigente quanto no proposto este regime se aplica à parcela da remuneração do servidor que ultrapasse o teto do regime geral de previdência social – RGPS.

Permanece, contudo, a regra de que cada regime complementar de previdência seja criado por lei de iniciativa do Poder Executivo do ente interessado, o que deve ser feito no prazo de dois anos contados da promulgação da Emenda Constitucional, sob pena de incorrer em infração cuja sanção constará de lei complementar. Prevê, ainda, o texto da Reforma que o teto do RGPS só será aplicável aos servidores públicos daquele ente quando o RPC estiver em operação, regra essa que já se observa hoje.

3. A previdência complementar dos servidores públicos poderá ser administrada por EFPC ou EAPC

Diferentemente da regra vigente, que disciplina que apenas as EFPC podem administrar a previdência complementar de servidores públicos, a PEC estabelece que haverá três formas de estabelecimento do RPC nos entes federativos, a saber, (i) por EFPC instituída pelo próprio ente; (ii) por adesão a qualquer outra EFPC; ou (iii) por adesão a uma Entidade Aberta de Previdência Complementar – EAPC.

Hoje, apenas EFPC que tenham natureza pública podem operar planos de servidores públicos. Esse requisito – a natureza pública – não será mais exigido e caso o ente opte pelas opções “ii” ou “iii” acima, terá que realizar processo licitatório, estimulando uma competição dentre as EFPC e entre elas e as EAPC. Essa exigência de licitação precisará ser melhor compreendida, tendo em vista que a ausência de finalidade lucrativa que as EFPC ostentam dificulta a aplicação da Lei 8.666/1993 quando elas estão na posição de prestadoras do serviço.

4. Estabelecimento de aposentadoria compulsória para empregados de consórcios públicos, de empresas públicas, de sociedades de economia mista e de suas subsidiárias

Atualmente, só estão sujeitos à aposentadoria compulsória os servidores estatutários, ou seja, aqueles servidores de cargos efetivos da administração pública direta ou de autarquias e fundações públicas.

A PEC propõe que empregados de consórcios públicos, de empresas públicas, de sociedades de economia mista e suas subsidiárias também estejam afetos à aposentadoria compulsória, aplicando-se a eles a mesma idade que for estabelecida para os servidores estatutários, conforme lei complementar venha a disciplinar (enquanto não for publicada tal lei, vigerá o limite de 75 anos de idade).

Considerando que a maior parte dessas organizações patrocina fundos de pensão, a nova regra poderá gerar repercussões nessas EFPC, embora o art. 202 garanta a independência entre o RPC e o RGPS.

5. Criação de um sistema integrado de dados previdenciários

Propõe-se a criação de um novo último artigo da CF/88, que receberia o número 251. Este disporia sobre a criação de um sistema integrado de dados compreendendo os regimes próprios de previdência social – RPPS, o RGPS, os fundos de pensão, os programas de assistência social e os sistemas previdenciários dos militares, de modo a fortalecera gestão, governança e transparência desses organismos.

A efetiva implementação desse sistema integrado de dados dependerá de posterior previsão legal.

6. Aproveitamento de experiência das EFPC nos novos RGPS e RPPS

A Reforma da Previdência proposta dispõe que os RPPS e o RGPS instituam sistemas de capitalização individual, na forma que venha a ser disposto em lei complementar a ser publicada, sendo admitida a adoção do regime de capitalização nocional.

Dispõe a proposta que os RPPS de cada ente deverão administrar as contas individuais dos servidores e que, no âmbito dos empregados privados, essas contas individuais serão geridas por “entidades de previdência públicas e privadas, habilitadas por órgão regulador, assegurada a ampla transparência dos fundos, o acompanhamento pelos segurados, beneficiários e assistidos dos valores depositados e das reservas, e as informações das rentabilidades e dos encargos administrativos”.

Trata-se de modelo muito semelhante ao que hoje é operado nos planos de contribuição definida das EFPC, com a novidade de que o regime nocional de capitalização permite que se tenha um controle de contas individuais, mas sem que haja o respectivo lastro financeiro daqueles valores, num modelo que também é conhecido como de “contas virtuais”. O detalhamento sobre o funcionamento desse regime capitalizado constará da lei complementar que o instituirá.

(21.02.2019)