CONTEÚDO
RESOLUÇÃO CFM Nº 2.434, DE 03.07.2025
Dispõe sobre a responsabilidade técnica e ética, os deveres, as prerrogativas e o cadastro dos coordenadores de cursos de graduação em medicina e dos campos de estágio curriculares, e estabelece normas para a fiscalização e a interdição ética.
O CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA (CFM), no uso das atribuições conferidas pela Lei nº 3.268, de 30 de setembro de 1957, regulamentada pelo Decreto nº 44.045, de 19 de julho de 1958, considerando as deliberações tomadas na XXI Sessão Plenária Extraordinária, realizada em 3 de julho de 2025, resolve:
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
Art. 1º Esta resolução estabelece a responsabilidade técnica e ética dos coordenadores dos cursos de medicina quanto aos campos de estágio, incluindo-se o estágio obrigatório de formação em serviço (internato) ou em quaisquer outras atividades que envolvam interações entre graduandos de medicina, preceptores ou professores e médicos com pacientes e/ou familiares; e institui o cadastro único de coordenadores de curso para facilitar a fiscalização da infraestrutura necessária ao aprendizado, conforme disposto nesta resolução.
§ 1º O objetivo é garantir um ato médico supervisionado e a segurança do paciente atendido em cenários de ensino para um aprendizado eficiente e de boa qualidade, envolvendo práticas clínicas seguras, comunicação efetiva, ética, humanização, prevenção de erros e valorização da relação médico-paciente.
§ 2º O coordenador de curso de graduação em medicina, no âmbito das atribuições descritas nessa resolução, responderá perante o Conselho Regional de Medicina (CRM) de sua jurisdição.
§ 3º O médico que atua como preceptor ou professor em campo de estágio não substitui, nem exclui, a responsabilidade técnica do coordenador do curso, configurando-se como corresponsável limitado às atividades que supervisiona diretamente.
Art. 2º É competência do CFM e dos CRMs regular e fiscalizar todas as atividades que envolvam o exercício da medicina mediante a Lei nº 3.268/1957, incluindo as de coordenação dos cursos de graduação em medicina, contidas na Lei nº 12.842, de 10 de julho de 2013, sem prejuízo da supervisão pedagógica e regulatória do Ministério da Educação (MEC).
Parágrafo único. Esta resolução não tem o alcance de fiscalizar ou interferir na atuação do coordenador de curso de graduação de medicina quanto ao estabelecimento dos padrões pedagógicos, da estrutura curricular, da infraestrutura educacional e do corpo docente para fins de autorização e reconhecimento do curso de medicina em respeito à autonomia universitária e às prerrogativas do MEC.
CAPÍTULO II
DOS CONCEITOS E DAS DEFINIÇÕES
Art. 3º Para os efeitos desta resolução, aplicam-se os seguintes conceitos e definições:
I - Instituição de ensino superior (IES): instituição autorizada a ofertar cursos de educação superior, nos termos da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996.
II - Coordenador de curso de graduação em medicina: profissional médico legalmente habilitado, com registro ativo e regular no CRM da jurisdição onde atua, designado pela IES para a gestão integral do Projeto Pedagógico do Curso de Medicina (PPC), abrangendo suas dimensões acadêmica, didático-científica, ética e administrativa.
III - Coordenador de estágio obrigatório de formação em serviço (internato): profissional médico formalmente designado pela IES e pelo coordenador do curso de medicina para gerenciar, operacionalizar e supervisionar diretamente as atividades práticas dos estudantes no estágio curricular obrigatório de formação em serviço (internato), garantindo a conformidade com as diretrizes éticas, técnicas e pedagógicas estabelecidas no PPC e pelo coordenador do curso de medicina.
IV - Campos de estágio no curso de medicina: toda unidade, serviço, setor ou estabelecimento de saúde, público ou privado, que mantenha convênio formal com instituição de ensino superior responsável por curso de graduação em medicina e que seja utilizado para o desenvolvimento de atividades práticas curriculares obrigatórias, contidas no projeto pedagógico do curso, aprovado no ato autorizativo de funcionamento e que envolvam a interação entre estudantes e médicos professores ou preceptores em qualquer cenário prático de ensino/aprendizagem de disciplinas médicas. Incluem-se tanto as atividades envolvendo o contato direto do estudante com pacientes, familiares ou situações clínicas, em qualquer nível de atenção à saúde, laboratórios de técnica cirúrgica, laboratórios de habilidades clínicas com ou sem simulações realísticas e sempre sob supervisão direta e obrigatória de profissional médico habilitado.
V - Estágio curricular obrigatório de formação em serviço (internato): etapa integrante e obrigatória da graduação, caracterizada por um processo específico de imersão integral e intensiva do estudante em cenários reais de prática profissional médica sob supervisão direta e contínua de médicos preceptores e professores, regulamentada pelas diretrizes curriculares dos cursos de medicina. Seu objetivo precípuo é a integração plena e progressiva dos conhecimentos teóricos e habilidades clínicas, desenvolvendo a autonomia e a responsabilidade inerentes ao exercício do ato médico, preparando o futuro profissional para atuar de forma competente, ética e segura.
VI - Estágio curricular obrigatório: procedimento didático-pedagógico que deve proporcionar ao estudante a vivência em situações reais de trabalho na área da saúde, sendo realizado na comunidade ou com pessoas jurídicas de direito público ou privado, sob responsabilidade e coordenação da instituição de ensino, colaborando no processo educativo.
CAPÍTULO III
DO COORDENADOR DO CURSO DE MEDICINA
Art. 4º O coordenador do curso de medicina deve obrigatoriamente ser médico, em consonância com a Lei nº 12.842, de 10 de julho de 2013, em seu art. 5º, inciso IV, e ter seu registro no CRM do local de jurisdição onde os campos de estágio são desenvolvidos.
§ 1º Em caso de campos de estágios curriculares desenvolvidos em outra jurisdição, é necessário que o coordenador de curso de graduação tenha inscrição em cada jurisdição.
§ 2º Em se tratando de cargo de responsabilidade técnica, o médico desempenhando o papel de coordenador de curso de graduação ou de coordenador de estágio curricular obrigatório deve receber remuneração justa e digna para essa função.
§ 3º O coordenador de curso em campos de estágio deve ser o guardião e fiscalizar os atos próprios dos médicos, seus aspectos jurídicos, sua responsabilidade e autonomia e os limites inerentes a essas atribuições, de acordo com as normas éticas pertinentes editadas pelo CFM.
Art. 5º O coordenador do curso de medicina, nos termos da lei, é o responsável técnico perante os CRMs pelos aspectos formais, éticos e técnicos do funcionamento dos campos de estágios contidos no PPC, aprovados pelo ato autorizativo do MEC.
§ 1º O provisionamento do cargo, ou função, de coordenador do curso de medicina se dará por designação da própria IES, desde que tenha registro ativo no CRM da jurisdição da IES, sem qualquer interferência com a autonomia administrativa e pedagógica da IES.
§ 2º No caso da existência de vice-coordenador, coordenadores de internato, coordenadores de campo de estágios locais ou similares, esses deverão ser médicos com registro ativo no CRM da jurisdição.
§ 3º O coordenador do curso de medicina detém a responsabilidade técnica primária, indelegável e hierárquica sobre todas as atividades de ensino e aprendizagem de disciplinas médicas.
CAPÍTULO IV
DOS DEVERES DO COODENADOR DE CURSO
Art. 6º São deveres do coordenador do curso nos campos de estágio curriculares:
I - garantir que todos os professores e/ou preceptores tenham inscrição no CRM da jurisdição do campo de estágio;
II - assegurar que o ensino de disciplinas especificamente médicas seja ministrado por médicos devidamente inscritos no CRM da jurisdição;
III - assegurar que todos os alunos tenham supervisão médica presencial e adequada ao objetivo de aprendizagem dentro do campo de estágio e alinhado com o PPC;
IV - respeitar todas as normas exaradas pelo CFM;
V - proceder ao cadastramento no CRM de dados e informações sobre os campos de estágios e, se houver, o coordenador do internato médico;
VI - assegurar ao CRM acesso às instalações físicas dos diversos campos de formação do curso;
VII - zelar pela segurança dos pacientes em todos os campos de estágio, implementando e monitorando protocolos de biossegurança e de assistência e adotando as medidas corretivas necessárias diante de não conformidades;
VIII - comunicar ao CRM quaisquer irregularidades, infrações éticas ou eventos adversos graves observados nos campos de estágio que envolvam estudantes, professores ou preceptores;
IX - promover a educação permanente dos professores e preceptores, especialmente no que tange às diretrizes éticas, técnicas e pedagógicas da preceptoria em medicina;
X - fornecer todas as informações solicitadas pelo CRM nos prazos estabelecidos pela autarquia;
XI - monitorar continuamente a adequação das condições de infraestrutura e dos recursos humanos dos campos de estágio à formação médica proposta no PPC, assegurando que a qualidade da aprendizagem e a segurança do paciente não sejam comprometidas por deficiências, compartilhamento com outras IES ou alterações nessas condições;
XII - notificar imediatamente o CRM, em prazo máximo de 48 (quarenta e oito) horas, sobre qualquer alteração nas condições dos campos de estágio que possa comprometer a qualidade da formação médica, a segurança do paciente ou que resulte em descumprimento do PPC.
CAPÍTULO V
DAS PRERROGATIVAS E DIREITOS DO COODENADOR DE CURSO
Art. 7º São prerrogativas do coordenador do curso nos campos de estágio curriculares para o devido cumprimento de seus deveres:
I - ter acesso garantido a recursos humanos, materiais e financeiros adequados e compatíveis com a dimensão do curso e a complexidade dos campos de estágio, a fim de viabilizar a implementação e a manutenção das condições necessárias à formação médica e à segurança do paciente;
II - exercer autoridade deliberativa com autonomia e nas matérias relacionadas à gestão pedagógica, ética e prática dos campos de estágio, incluindo a proposição de rotinas, normas internas e a implantação de medidas corretivas e disciplinares quando cabíveis, em conformidade com o PPC e a legislação;
III - ter acesso irrestrito e tempestivo a todas as informações, dados e registros pertinentes à atuação de professores, preceptores e estudantes nos campos de estágio, incluindo prontuários (com a devida salvaguarda ética e legal da confidencialidade), relatórios de supervisão e avaliações de desempenho;
IV - ser consultado e ter sua anuência formal nos processos de celebração, aditamento, rescisão e avaliação de convênios ou instrumentos congêneres que estabeleçam ou modifiquem as condições dos campos de estágio do curso;
V - ter garantido o acesso a programas de formação e aperfeiçoamento contínuo em gestão acadêmica, didática, ética e em temas relacionados à segurança do paciente e à preceptoria em medicina.
Parágrafo único. Caso as prerrogativas aqui estabelecidas não sejam integralmente atendidas pela IES, o coordenador do curso deverá comunicar formalmente o fato ao CRM, nos termos da Resolução CFM nº 2.056/2013.
CAPÍTULO VI
DA FISCALIZAÇÃO
Art. 8º Os CRMs, sob a coordenação do CFM, têm a prerrogativa legal e ética de fiscalizar todos os locais onde se exerça medicina, em todas as suas modalidades, incluindo os campos de estágio de cursos de graduação em medicina e as atividades de internato médico, visando garantir a qualidade do ensino-aprendizagem, a segurança do paciente e o cumprimento das normas éticas e legais do exercício profissional.
§ 1º A fiscalização dos campos de estágio curriculares será realizada por conselheiros e/ou médicos fiscais dos CRMs de forma programada ou por denúncia, que terão acesso irrestrito e incondicional a todas as instalações, prontuários, documentos e informações pertinentes à formação médica e à prática supervisionada, conforme previsto no art. 6º, inciso VI, desta resolução.
§ 2º Constatado comprometimento das condições de infraestrutura, recursos humanos, responsabilidade técnica, segurança do paciente ou da supervisão médica adequados à formação, o CRM poderá, mediante decisão fundamentada, determinar interdição ética, total ou parcial, temporária ou definitiva, das atividades médicas de ensino no campo de estágio irregular.
§ 3º A interdição de um campo de estágio implica a imediata suspensão da participação de estudantes de medicina em quaisquer atividades profissionais naquele local, até que as irregularidades sejam devidamente sanadas e atestadas pelo CRM.
§ 4º O CRM comunicará formalmente ao MEC e demais órgãos competentes as interdições para as providências administrativas e acadêmicas cabíveis.
§ 5º O coordenador do curso de medicina e a IES serão notificados das irregularidades e terão prazo para apresentar defesa e promover as adequações necessárias, sob pena de interdição da atividade médica de ensino no campo de estágio irregular.
Art. 9º É vedado ao coordenador de campos de estágio participar da execução, direta ou indireta, de convênios ou quaisquer outros termos obrigacionais, para a realização de estágios ou internatos, destinados a alunos oriundos de faculdades/cursos de medicina de outros países, junto a instituições de saúde privada, filantrópica ou pública.
Parágrafo único. Excetuam-se do mandamento disposto no caput do artigo os hospitais públicos universitários, quando da vigência de acordo oficial celebrado entre as universidades.
CAPÍTULO VII
DO REGISTRO DOS COORDENADORES
Art. 10. É dever da IES informar ao CRM a identidade do médico designado como coordenador de curso de graduação em medicina, para cada um dos seus campi que ofereçam o curso, com a data de início de suas atribuições no cargo, assim como seu desligamento ou substituição.
§ 1º As IES têm o dever de notificar o CRM, tempestivamente e em prazo máximo de 15 (quinze) dias, sobre a designação de um novo coordenador do curso de medicina ou sobre a cessação das funções do coordenador anterior.
§ 2º As notificações devem ser formalizadas por meio de ofício para o CRM, sendo permitido o encaminhamento de uma via assinada digitalmente, anexada a e-mail, para a conta do CRM constante em seu sítio oficial.
CAPÍTULO VIII
DAS DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 11. A interdição ética dos campos de estágio poderá ser decretada quando não forem atendidas as condições mínimas exigidas pela Resolução CFM nº 2.056/2013 e demais legislações pertinentes, devendo a tramitação nos CRMs observar o disposto na Resolução CFM nº 2.062/2013.
Parágrafo único. O CFM poderá revisar, em sede recursal, as interdições éticas decretadas pelos CRMs.
Art. 12. Os médicos que assumirem coordenações de cursos de graduação em medicina devem assegurar que a IES tenha toda a infraestrutura prevista nesta resolução e nas normas legais vigentes.
Art. 13. É obrigatório o exercício presencial do coordenador.
Art. 14. Fica criado no âmbito do CFM o sistema específico com a consolidação das informações de todos os coordenadores de cursos de medicina em campos de estágio do país.
Art. 15. Esta resolução entra em vigor no prazo de 60 (sessenta) dias a contar da data de sua publicação.
JOSÉ HIRAN DA SILVA GALLO
Presidente do Conselho
ALEXANDRE DE MENEZES RODRIGUES
Secretário-Geral
(DOU de 01.08.2025 – págs. 194 e 195 - Seção 1)