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Thabata Najdek

Thabata Najdek é advogada e atualmente cursa LLM em Direito dos Mercados Financeiros e de Capitais no INSPER. Há oito anos no mercado segurador, atua nas áreas de responsabilidade civil e linhas financeiras nas companhias líderes de mercado com experiência nos produtos de linhas financeiras D&O, E&O, BBB, Commercial Crime, EPL, e Liability. Experiência na análise e regulação de sinistros, subscrição, colocação de riscos com resseguradores, revisão e desenvolvimento de produtos, bem como treinamentos e capacitação de colaboradores e corretores nestes ramos.



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Impactos da Circular nº 541 no D&O

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Na última semana, a SUSEP publicou a circular nº 541 estabelecendo diretrizes para o seguro de Responsabilidade Civil Administradores, também conhecido como seguro D&O (Directors and Officers).

Há definições que já constavam da circular n.º 336 (que determina regras para todas as apólices à base de reclamação), definições inócuas e algumas que impactam diretamente na aplicação de cobertura, objeto deste artigo.

As definições sobre: apólice à base de ocorrências, apólice à base de reclamações, data limite de retroatividade, limite máximo de garantia da apólice (LMG), limite máximo de indenização por cobertura contratada (LMI), limite agregado (LA), notificação, período de retroatividade, prazo complementar e prazo suplementar são muito parecidas ou idênticas às definições da circular nº 336, ou seja, não implicam alteração ao que hoje é ofertado aos segurados.

As definições dano corporal, dano físico à pessoa, dano material, dano moral e dano patrimonial; apesar de citadas não são utilizadas em nenhuma parte da circular, portanto inócuas.

As definições ato ilícito culposo, ato ilícito doloso, ato ilícito/ato danoso, aviso de sinistro, culpa grave, dano, perda, perdas financeiras, prejuízo, prejuízo financeiro e sociedade; ainda que não estejam redigidas da melhor forma não trazem prejuízos significativos à cobertura do produto.

A redação dos custos de defesa não está tão abrangente quanto às condições gerais da maioria das seguradoras, entretanto, a definição não é “fechada”, pois enumera algumas situações e em seguida, utiliza o termo “despesas necessárias” para apresentação de defesa e recursos relativos a reclamações.

Fato gerador: reduz o alcance de cobertura, uma vez que vincula o fato gerador à existência de um processo administrativo formal ou judicial contra o segurado.

Algumas seguradoras oferecem cobertura independentemente da necessidade de um processo judicial ou procedimento administrativo, tais como: notificação extrajudicial de terceiros, gerenciamento de crise e despesas de publicidade.

O texto também deixa de citar as omissões e erros característicos dos atos de gestão que facilitariam o entendimento acerca do objeto da apólice D&O.

Reclamação: a redação do texto é confusa, além de limitar reclamação a processos civis ou penais. Os produtos atuais cobrem também reclamações trabalhistas, consumeristas, tributárias e previdenciárias, por exemplo. Com esta definição limitada, estes tipos de reclamação deverão ser concedidos por meio de condições particulares.

Segurado: outra definição confusa e equivocada em alguns aspectos. Conforme a circular, o segurado que possui essa condição em virtude de um cargo de gestão, necessita que haja legalmente a responsabilidade solidária do tomador em relação aos atos praticados. Esta disposição limita o alcance de cobertura destes gestores, pois civilmente um gestor pode tomar uma decisão equivocada que gere prejuízo financeiro para a empresa e consequentemente para os acionistas sem qualquer previsão legal de responsabilidade solidária, até porque nesta hipótese de fato gerador o terceiro prejudicado é a própria empresa, sendo ilógica sua responsabilização solidária. Isto é, conforme a circular, não haveria cobertura para reclamação de sócios e/ou da empresa contra o segurado quando não for exclusivamente em virtude de uma ação de regresso contra o gestor.

Segurados de subsidiárias: os produtos, em sua cobertura básica, atualmente protegem os segurados de subsidiárias da tomadora. Agora, conforme a circular, isto não é automático e terá de ser concedido por meio de extensão de cobertura. Isso prejudica o cliente, pois será necessário ficar atento se a extensão foi concedida na proposta, para que não seja surpreendido com uma limitação de cobertura.

Outra previsão de extensão de cobertura de segurado, cuja redação pode ocasionar interpretação equivocada é a de pessoas físicas contratadas para prestarem assessoria, tais como advogados, contadores, secretários entre outros. Nos produtos em que estes profissionais podem ser considerados segurados há a necessidade de serem empregados do tomador.

O termo utilizado pela SUSEP é “contratado”, possibilitando a interpretação de cobertura inclusive de terceirizados, situação sem amparo no seguro D&O.

Hoje as apólices que oferecem essa possibilidade de proteção, o fazem porque alguns profissionais empregados, pela natureza de sua atividade estão expostos a riscos e a tomadora não pode contratar uma apólice de E&O para seus “departamentos internos”. Portanto essa foi uma solução do mercado para que eles não ficassem desamparados.

Ao contrário deste objetivo, a circular dá margem à cobertura de E&O dentro do produto de D&O ao prever a possibilidade de incluir como segurado profissionais “contratados” de forma ampla. Estes sim poderiam contratar apólice de responsabilidade civil profissional – E&O para eventuais falhas na prestação de seus serviços.

Tomador: na definição de tomador, a circular informa que a empresa se responsabiliza “quando solicitado” a adiantar quantias relativas à defesa em juízo civil ou em indenização cobertas pelo seguro aos segurados.

A faculdade de adiantar os valores de custos de defesa ou indenização é uma decisão exclusiva da empresa. O produto pode cobrir, neste caso, o reembolso à tomadora, mas não deve prever que ela seja responsável por tal ato. Dependendo do objeto de reclamação, se a conduta do gestor ocasionou prejuízos a própria tomadora, este dispositivo vai de encontro às boas práticas de governança corporativa.

No artigo 4º da circular fica expressamente vedada a possibilidade de contratação deste seguro na modalidade à base de ocorrências. Na prática não há impacto, pois as segurados já comercializam o produto à base de reclamação.

O artigo 5º, §1º dispõe que:

§1º A garantia está condicionada a que tenham sido atendidas as disposições do contrato de seguro, em particular aquelas que regulam as apólices à base de reclamações, bem como as datas de ocorrência dos danos e as datas de apresentação das reclamações.

Na apólice à base de reclamações o termo correto é fato gerador e não data de ocorrência. Este último é utilizado nas apólices à base de ocorrência. A utilização de termos técnicos equivocados pode induzir os segurados a erro de entendimento de como a apólice funciona.

No §3º do artigo 5º:

§3º A garantia não cobre os custos de defesa e os honorários dos advogados dos segurados, exceto se contratada cobertura adicional específica.

Mais uma situação em que os segurados deverão ficar atentos para não sofrer prejuízo de cobertura. Aqui há a impossibilidade de oferecer o reembolso de custos de defesa na garantia básica. 

A cobertura de custos de defesa é mais utilizada na apólice que a própria indenização, o que torna ilógico impor que ela não possa fazer parte das garantias básicas. Os segurados e corretores deverão ficar atentos aos limites concedidos nesta cobertura “adicional específica”.

Um ponto positivo do artigo 5º é o §4º:

A garantia poderá abranger cobertura de multas e penalidades contratuais e administrativas impostas aos segurados quando no exercício de suas funções, no tomador, e/ou em suas subsidiárias, e/ou em suas coligadas. 

Após encaminhar ofício a todas as seguradoras proibindo a comercialização da extensão de cobertura de multas, a SUSEP oficializou a permissão para oferecer esta garantia. Ponto favorável aos segurados já que eles estão consideravelmente expostos à aplicação de multas administrativas.

Outro ponto positivo da circular, é o §6º artigo 5º:

§6º As sociedades seguradoras não podem atuar concomitantemente como tomador e segurador em seguro de RC D & O que garanta seus próprios executivos, e/ou de suas subsidiárias e/ou de suas coligadas.

Um dos objetivos da apólice de seguros é a transferência de risco. Difícil concluir que esta transferência ocorre quando a sociedade seguradora protege seus administradores. Ainda há a questão do conflito de interesse na regulação de sinistros e a impossibilidade da tomadora ser terceira, pois ela é seguradora. Enfim, para aqueles que faziam o “auto seguro” de seus gestores, há SUSEP vetou tal possibilidade.

A redação do artigo 7º no geral é confusa e cita pela primeira vez a obrigatoriedade de cobrir a defesa em juízo trabalhista, até então negligenciada na definição de reclamação e objeto do seguro.

O item II deste artigo repete as definições de segurado na maioria das alíneas. Entretanto na alínea “e” prevê a contratação por meio de extensão de cobertura para segurados de subsidiárias adquiridas ou constituídas após o início de vigência da apólice. Esta garantia é oferecida pelo mercado, mas há uma série de requisitos para sua aplicação. Não pode ser ofertada com a simplicidade que a circular dispõe.

Após publicação da circular, as seguradoras que possuem produto protocolado na SUSEP deverão fazer as devidas alterações para seguir as diretrizes.

Esperamos que a SUSEP seja flexível aprovando as extensões de coberturas não previstas na circular; bem como aceitando a adaptação dos termos que trouxeram redução de garantias para os segurados e ainda permitindo que sejam complementadas as exclusões pertinentes ao produto que não foram mencionadas no documento.

(25.10.2016)