O que muda para os Seguros de Danos de acordo com a Consulta Pública nº 10/2025
Marcella Hill, Jaqueline Suryan e Mariana Jardim
A alguns poucos dias da entrada em vigor da nova Lei de Seguros (Lei nº 15.040/2024), a SUSEP colocou em consulta pública minuta de resolução destinada a substituir a Circular SUSEP nº 621/2021. A proposta visa a adequar o regime infralegal aplicável às regras de funcionamento e aos critérios de operação das coberturas de seguros de danos às diretrizes introduzidas pelo novo diploma legal.
A seguir, elencamos alguns dos ajustes relevantes sugeridos na minuta, cuja análise demanda atenção do mercado em razão de seus potenciais impactos regulatórios e operacionais.
· Grandes riscos: A minuta de resolução SUSEP em consulta pública (“Resolução”) estabelece sua aplicabilidade compulsória a todos os seguros de danos, inclusive para coberturas de grandes riscos, na forma que dispuser a regulamentação específica. Como não foi replicada a facultatividade da sua aplicação aos grandes riscos, como é disposto na Circular SUSEP nº 621/2021, seria interessante que esta resolução previsse a sua aplicação aos grandes riscos apenas naquilo que não contrariasse a lei e o normativo específico para grandes riscos, seja a Resolução CNSP nº 407/2021, conforme alterada para fins de adaptação para a nova lei, ou norma que a substitua.
Além disso, como antecipado pelo mercado, a Resolução traz regra específica aplicável à regulação e liquidação de sinistros, estabelecendo um prazo de 120 (cento e vinte) dias para regulação e manifestação sobre cobertura e de mais 120 (cento e vinte) dias para a liquidação e pagamento de indenização, se o caso, prazos estes que são superiores ao da regra geral de 30 (trinta) dias. O real impacto da nova regra proposta dependerá da definição de grandes riscos ser alterada ou não pelo regulador quando da revisão do normativo específico.
Também seria uma boa oportunidade para o regulador disciplinar a forma pela qual os clausulados de coberturas de grandes riscos deverão ser “registrados” perante a SUSEP, tal como previsto na nova lei, de modo a prever de forma ponderada as particularidades desse tipo de cobertura qualificada.
· Ilícitos criminais: AResolução replica na integralidade a redação da Lei de Seguros sobre vedação de coberturas para multas e penalidades para atos cometidos pelo segurado “que caracterizem ilícito criminal”. Perde, assim, a oportunidade de diferenciar acobertura de atos dolosos do segurado, claramente contrária ao ordenamento jurídico brasileiro, da prática de um ato que se “caracterize” um ilícito criminal, que pode eventualmente ser na modalidade culposa e possa ser segurável, tal como ocorre na grande maioria dos países ocidentais.
· Proposta de seguro: A Resolução trata das duas modalidades de propostas estabelecidas na Lei de Seguros, quais sejam, as que têm origem no segurado, reproduzindo o praticado no mercado de seguros até então, e uma nova modalidade, a proposta que tem origem na própria seguradora. A novidade trazida pela Resolução é a restrição desse tipo de proposta da seguradora apenas aos seguros comercializados por meio de bilhete o que não só nos parece ilegal por extrapolar competência regulatória da SUSEP e restrigir algo quando a Lei de Seguos não o faz, como, principalmente, por esvaziar, nos seguros de danos, o próprio novo conceito trazido pela Lei ao restringir tal proposta a uma relação que sequer depende de proposta.
Da existência desses dois tipos de proposta decorre a necessidade de ajuste na Resolução tanto de terminologia quanto de outros conceitos a depender de quem partiu a proposta (se da seguradora ou do segurado). Isso é o que ocorre, por exemplo, quando a Resolução trata dos elementos mínimos e da data de aceitação da proposta.
· Renovações: A Resolução também inova na ordem jurídica – algo vedado a uma regulamentação – ao transformar, na prática, a renovação automática como regra, já que passa a demandar uma notificação da seguradora de sua intenção de não renovar previamente tanto nos seguros com previsão de renovação automática quanto nos regulares, sob a consequência (ou penalidade) de se ter a apólice renovada obrigatoriamente.
· Mora: A Resolução determina expressamente a dispensa de notificação ao segurado na hipótese de inadimplemento do prêmio devido em parcela única ou da primeira parcela do prêmio para fins de resolução do contrato de seguro.
Em caso de suspensão da garantia por mora do segurado referente a qualquer parcela do prêmio subsequente à primeira, a redação da comunicação da seguradora ao interessado será determinante para a dispensa de nova notificação antes da efetiva resolução do contrato, nos termos da redação proposta na regulamentação.
Em qualquer caso, quando da constituição em mora referente a parcela diversa da primeira, a seguradora deve considerar, antes da suspensão ou resolução do contrato, o período de cobertura correspondente à proporção do valor do prêmio efetivamente pago.
· Sinistro: A Resolução implementa os novos conceitos e prazos de regulação e liquidação de sinistros trazidos pela Lei de Seguros, fazendo distinção dos seguros de danos em geral para os grandes riscos.
No mais, determinacritérios sobre determinadas alegações de negativas de cobertura pela seguradora, além deinovar ao estabelecer elementos mínimos do relatório de regulação e liquidação, o que demandará ajustes operacionais e de cultura das seguradoras.
· Agravamento de risco: A Lei de Seguros regula o agravamento intencional continuado do risco, sendo omissa com relação ao agravamento intencional pontual. A Resolução busca corrigir essa omissão, submetendo este tipo de agravamento também à hipótese de perda de direito à indenização, sob a justificativa de o contrário configurar ofensa ao princípio da boa-fé que deve guiar as relações contratuais de seguro.
Além disso, insere como opção – ao lado da cobrança de diferença de prêmio ou da resolução do contrato quando da impossibilidade técnica de se garantir o novo risco – a restrição da cobertura contratada, como já é previsto na Circular SUSEP nº 621/2021, mas não na Lei de Seguros. Isso endereça a preocupação com o (des)alinhamento do risco agravado com a política de subscrição da seguradora, por exemplo.
· Redução do risco: A Resolução fixa parâmetros da redução do risco e determina procedimentos para a comunicação entre segurado e seguradora sobre o assunto. Requer que a redução conduza à diminuição significativa e continuada da probabilidade de ocorrência do risco descrito no questionário de avaliação de risco ou da severidade dos efeitos de tal realização. Por se tratar de conceitos abertos, o alcance dessa disposição dependerá da construção doutrinária e do desenvolvimento de precedentes administrativos, judiciais e arbitrais nos próximos anos.
· Condições contratuais: No geral, a Resolução traz regras que visam a maior transparência para segurados e beneficiários e que demandarão alteração nos clausulados, como aquelas com relação a sinistros parciais, critérios e fórmulas para determinação de valores de indenização e pagamento de indenização por prestação de serviço, por exemplo.
Além disso, a Resolução estabelece e/ou altera o conteúdo mínimo para determinadas cláusulas dos clausulados de seguro de dano, como da cláusula de concorrência de contratos de seguros, prescrição e transferência do interesse garantido. Traz também novas definições de conceitos relevantes em seu Anexo, que também merecem atenção e ajustes de acordo com o praticado pelo mercado e com as novas diretrizes introduzidas pela Lei de Seguros.
(01/12/2025)



