Irapua Beltrao

Irapuã Beltrão

Procurador Federal da AGU e Bacharel em Direito pela UERJ, com pós-graduação em 'Direito Econômico' pela FGV/RJ e 'Direito do Estado' pela UERJ, Master of Law (Insurance Law) pela University of Connecticut e mestrado e doutorado pela Universidade Gama Filho. Atua ainda como professor universitário e de cursos de extensão e pós-graduação. Autor de diversas obras de Direito Tributário, Regulação e Seguros e articulista e colaborador de diversos sites jurídicos, com diversos artigos publicados por diversas revistas.

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Ainda temos que falar da LGPD...

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Não há novidades quanto a importância do uso dos dados no mercado de seguro, nem tampouco do relevo que a Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD terá em todos os segmentos de atividade econômico e social da vida de todos. Muito já se falou sobre o nascimento da lei, desde sua concepção, motivação, da confusão sobre a sua vigência, principais pontos de aplicação, etc. Certamente, as empresas e operadores do mercado já foram apresentadas às suas exigências e os cuidados que a lei exige.

Sem prejuízo de todos aqueles cuidados e medidas que já se modificaram em face da nova legislação, o momento ainda traduz a necessidade de que se fale sobre a LGPD por alguns e diversos motivos. O primeiro grande ponto é decorrente da instalação da Autoridade Nacional – ANPD e suas primeiras normatizações, como por exemplo a Portaria nº 16, de 8 de julho de 2021, que estabeleceu procedimentos para a elaboração da agenda regulatória e de atos normativos editados pela ANPD.

Até mesmo por tudo o que já se comentou, o âmbito de aplicação da lei possui aspectos que irá combinar os elementos gerais da proteção de dados com as regulamentações setoriais. Parte da atenção remeterá os olhos para a necessidade de convivência das normatizações, já que o tratamento determinado pela ANPD não afastará os regramentos do Sistema Nacional de Seguros Privados, e vice-versa. Considerando o legítimo interesse das seguradoras e entidade de previdência aberta em dados sensíveis, basta lembrar a previsão do art. 38 de que a autoridade nacional poderá determinar ao controlador que elabore relatório de impacto à proteção de dados pessoais, inclusive de dados sensíveis, referente a suas operações de tratamento de dados, observados os segredos setoriais.

Outro ponto que tem sido bastante destacado nas últimas manifestações é o início da vigência dos arts. 52, 53 e 54 da Lei, trazendo a partir de 1º de agosto deste ano de 2021 a plena eficácia e aplicação dos dispositivos que versam sobre as sanções administrativas, que já podem ser aplicadas pela Autoridade Nacional em processos de fiscalização.

Mas, além dos receios quanto aos processos de fiscalização e eventual ocorrência das medidas sancionadoras, a verdade é que muitos aspectos da lei ainda dependem de efetiva implementação nas relações empresariais e nas práticas comerciais. Ainda que muitos contratos já tenham sido adaptados e contenham cláusulas e previsões em referência à LGPD, basta indagar quais consumidores, segurados, participantes, beneficiários e contratantes em geral estão sendo devidamente informados sobre isto. Não por outro motivo, dentre as esperadas boas práticas a isto relacionado são esperadas as ações educativas, como explicitamente mencionado no art. 53 da lei. Evidentemente muito ainda irá se aperfeiçoar neste campo, mas não é sequer questionável que a informação sobre os cuidados e ditames da lei ainda não se fazem presente no dia-a-dia das transações.

No caso específico do mercado segurador ainda é necessário que as preocupações sobre a LGPD deixem de ser apenas cláusulas nos modelos contratuais e passem a fazer parte das conversas e negociações das fases pré-contratuais, devendo ser incorporadas por todos os agentes e figuras que atuam na intermediação para os fins de contratualização de coberturas securitárias e planos previdenciários.

Além dos cuidados, portanto, das sociedades seguradoras e entidade de previdência aberta de revisão dos seus modelos de propostas, contratos, certificados, e demais instrumentos, espera-se de tais entidades que promovam a cultura da informação sobre o tratamento dos dados por serem controladores e detentores finais dos dados, forçando aos operadores – inclusive os corretores e demais agentes de intermediação – a uma efetiva implementação desde os primeiros contatos com os consumidores e proponentes aos seguros e contratos de previdência.

Ainda neste sentido é relevante notar que, mesmo que as negociações não concretizem contratações, o dever de informação e os decorrentes da boa-fé objetiva de todos os agentes de mercado persistem em todos os seus aspectos.

O fato é que a LGPD e seus novos predicados ainda estão no momento inicial de sua compreensão e certamente contarão com inevitável evolução nos próximos tempos, mas ainda não se verifica em diversos campos do Sistema Nacional de Seguros, Previdência Aberta e de Capitalização preocupações com as ações educativas, com o efetivo cumprimento do dever de informação dos direitos dos titulares dos dados, entre outras consequências decorrentes. Daí porque ainda temos que muito falar sobre a LGPD....

02.08.2021