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Um trabalho eterno dedicado à sofisticação dos Controles Internos

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Muita coisa mudou na governança corporativa das empresas. E, em boa parte, isso se deve à dedicação dos profissionais de Controles Internos e de Gestão de Riscos das companhias e das áreas técnicas da CNseg, que buscam formas de mitigar, cada dia mais, os riscos que envolvem a operação e aumentar a consciência da importância do controle. Em 2004 surgiu a primeira norma de controle interno para o mercado segurador e, a partir de 2006, os regulamentos que definem e quantificam os riscos. Para contar um pouco da trajetória dos últimos dez anos, o Portal da CNseg entrevistou Assizio Oliveira, presidente da Comissão de Controles Internos da Confederação. “Temos nos dedicado à sofisticação dos Controles Internos e da Gestão de Riscos e esse é um trabalho eterno”, diz, na entrevista, a seguir:

Quais os principais temas debatidos em 2013? O que foi concluído e o que ficou para este ano?

2013 consumiu bom tempo da comissão em estudos que também envolveram colegas de outras comissões, como a Atuarial, Administração e Finanças e a Jurídica, além do Núcleo de Estudos e Projetos da CNseg e a própria Susep, sobre a formação da base de dados de perdas, importante para a quantificação do capital adicional baseado no risco operacional. Esse tema tem sido alvo de amplas discussões, o que é natural porque nem mesmo as autoridades encarregadas das regras de Solvência II, na Europa, conseguiram chegar a um consenso. É muito difícil calcular o capital adicional com base nesse quesito e, do ponto de vista matemático, é preciso ter um histórico confiável sobre as perdas passadas.

E como ficou?

Passa por avaliação uma minuta de regulamento que estabelece os conceitos, procedimentos e prazos para que cada uma das empresas contem com uma base de perdas para viabilizar o cálculo do risco operacional. Esse tema tomou muito tempo e gerou muitas idas e vindas, o que é compreensível em face da sua complexidade, esperando-se que na primeira metade de 2014 tenhamos a sua regulamentação pela Susep, talvez ainda no formato de audiência pública, o que proporcionará discutir algum outro detalhe antes da publicação definitiva.

E o novo regulamento sobre lavagem de dinheiro?

Esse tema começou a ser tratado pela Susep em 2002, portanto quando ainda não havia a obrigatoriedade da implantação dos Controles Internos e da Gestão de Riscos. No entanto, a partir da atualização do regulamento trazida por sucessivas circulares, até os dias atuais, quando está vigente a Circular 445, o assunto vem sendo corretamente tratado sob aqueles dois enfoques conceituais. No entanto, a despeito de terem havido avanços importantes nos regulamentos que permitiram melhor operacionalizar o tratamento dos indícios de lavagem de dinheiro, outro tanto ainda precisaria ser feito para enquadrar o mercado segurador à realidade do negócio e às referências internacionais a que o Brasil, por acordo, se obriga a seguir. Com efeito, quando se analisam as informações do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF), entidade do Ministério da Fazenda criada como uma Unidade de Inteligência Financeira, o setor é indevidamente visto como um caminho em que seria menos difícil praticar a lavagem de dinheiro, na medida em que, por força do regulamento atual, ainda comunica àquele órgão cerca de dez vezes mais operações entendidas como suspeitas do que o mercado bancário, o que, por si só, e sem a necessidade de análises mais aprofundadas, indica uma grave distorção a ser tratada. Ademais, e nas palavras dos próprios representantes do COAF, geram informações irrelevantes aos propósitos daquele órgão, que se vê às voltas com excessivo número de informações de seguros, que, ao final, resultam em índices muito baixos de aproveitamento, o que também acaba por afetar, também indevidamente, a imagem do setor. Por isso, a comissão mantém-se no esforço de negociar com a Susep novos avanços nos regulamentos, o que faz mediante estudos baseados na realidade brasileira e em análises comparativas com a legislação e os regulamentos de países avançados nesse tema. Entendemos que a Susep poderia tomar a iniciativa de chamar o COAF para participar do processo de aprimoramento das regras, uma vez que como destinatário das informações e maior interessado, agregaria muitíssimo às discussões. Estamos otimistas que isso ocorrerá e que a Susep possa editar nova atualização do tema em 2014, de forma a enquadrar o mercado segurador à realidade. Por outro lado, inspirados pela Febraban e em seu relacionamento com o Banco Central, e a depender do andamento das tratativas atuais, a comissão poderia desenvolver uma auto regulamentação sobre o assunto no que toca ao negócio de seguros.

Que impacto trará o FATCA ao setor?

A Lei Americana do FATCA implica que as entidades financeiras de todo mundo têm de dar informações ao fisco americano sobre recursos financeiros de empresas e cidadãos americanos ao redor do mundo, sob pena de sanções relevantes. Trata-se de regra elaborada de forma inteligente, dado que afeta as empresas e seus interesses nos EUA, ao invés de afetar os países em que elas estão sediadas. O debate gira em torno de como agir com esse assunto, que é importante para bancos e seguradoras que têm clientes americanos que aplicam em produtos financeiros como, por exemplo, fundos de previdência. Há vários aspectos a considerar, inclusive a legislação brasileira que assegura o sigilo de tais informações, porém é relevante recomendar que cada seguradora brasileira se cadastre como empresa aderente ao programa, o que, em princípio, deve ser feito até 25 de abril deste ano. A Febraban, o Banco Central e a Receita Federal têm-se debruçado de forma mais aprofundada sobre o assunto, o que levou a CNseg a passar a acompanhar as reuniões promovidas naqueles fóruns e a consultar a Susep sobre os impactos para o setor de seguros. Por outro lado, a comissão de Controles Internos formará um grupo de trabalho para, no seu âmbito, estudar o assunto e indicar as recomendações pertinentes. Por outro lado, há gestões avançadas no sentido de que o Brasil assine com os EUA um acordo bilateral que permitirá tratar o tema de forma mais amigável; portanto, a expectativa é grande para que isso ocorra, uma vez que há enorme diferença de tratamento do trânsito das informações com e sem o acordo. Por outro lado, é tema que deve se alastrar na legislação de outros países e, até mesmo, tornar-se um programa com alcance mundial.

Em 2012, a comissão de Controles Internos elaborou o Guia de Boas Práticas em Compliance, que foi muito bem recebido pelo mercado. Há algum outro projeto em discussão no âmbito da comissão que envolva a criação de um outro guia?

Os guias de boas práticas são importante fonte de consulta e, na medida das necessidades, a comissão poderá editar outros ou atualizar os existentes. No entanto, eles têm a limitação de ter que tratar os assuntos de forma genérica, não podendo, por óbvio, entrar em detalhes operacionais específicos. Por isso, em 2013 começamos a tratar os temas de forma mais pontual, mediante a emissão de pareceres técnicos, que, após elaborados, sobem para aprovação do Conselho Diretor da CNseg e são divulgados não apenas com a função de orientar determinada prática, mas também com o objetivo de harmonizar o tratamento de determinado aspecto em todo o setor. Na primeira reunião da comissão deste ano ficou deliberada a formação de grupos especialistas de trabalho, com caráter permanente, o que permitirá o rápido tratamento de temas emergentes, como, por exemplo, o FATCA, anteriormente comentado. Outros exemplos importantes são o da intervenção da Auditoria Interna no processo de implementação e validação do banco de dados de perdas operacionais e o de prevenção dos delitos de lavagem de dinheiro, também já anteriormente comentados. Tomando esses três exemplos, que refletem necessidades já conhecidas, a comissão passará a contar com grupos de trabalho permanentes, cujas primeiras missões serão, respectivamente, a preparação de pareceres técnicos relacionados às operativas do FATCA, aos trabalhos de campo da Auditoria Interna voltados à revisão da base de dados de perdas operacionais e às esperadas alterações no regulamento sobre prevenção da lavagem de dinheiro. Como exemplo recente e bem sucedido, pode-se citar a emissão do parecer técnico sobre como a Auditoria Interna deve conduzir seus trabalhos e reportar seus resultados no tocante à revisão do relatório semestral da Ouvidoria, obrigação esta regulamentada na Resolução 279 do CNSP. Outros grupos de trabalho permanentes como os de Compliance e de Gestão de Riscos serão formados na comissão e ficarão de sobreaviso para atuar sempre que alguma nova circunstância assim o exija. Percebemos essa mudança de estratégia como um avanço, posto que sai-se do “que” dos guias para o “como” dos pareceres técnicos.

Observamos ao longo dos últimos anos o aumento da importância do controle de risco na operação de empresas do setor de seguros. Isso certamente demanda a qualificação de pessoal especializado para a realização dessa função. Como a comissão tem colaborado nesse cenário?

Investir na qualificação dos profissionais da área passou a ser a menina dos olhos da comissão, uma vez que, do ponto de vista conceitual, os quase dez anos que se passaram desde a edição da Circular 249 e as gestões realizadas permitem concluir que há uma consolidação do assunto no setor, o que nos remete à busca da sofisticação de cada um dos distintos aspectos que o formam. Neste ano organizaremos o oitavo Seminário de Controles Internos e Gestão de Riscos, evento para o qual trazemos pessoas qualificadas, dos mercados local e internacional, para apresentar e discutir os temas prioritários da agenda do segmento. Mais de 300 profissionais se inscreveram no último seminário e a cada ano cresce o número de interessados. Além disso, a comissão desenvolveu, em parceria com a Escola Nacional de Seguros, que o mantém, um curso de extensão universitária sobre Controles Internos, que se desenvolve ao longo de quatro meses, com carga horária compatível com a larga gama de assuntos a serem abordados. Nossa expectativa para este ano é que sejam formadas quatro turmas, sendo duas em cada semestre, uma no Rio de Janeiro e outra em São Paulo. Em 2013 as duas turmas que frequentaram o curso alcançou cerca de 60 alunos, o que nos faz crer na necessidade de uma maior oferta daqui por diante. Estimamos que sua boa aceitação e avaliação se deve ao fato de ter sido desenvolvido e ministrado por profissionais de Controles Internos do mercado segurador, que lidam dia a dia com o tema, aliada à reconhecida qualidade acadêmica e logística da Escola Nacional de Seguros.

Também há um livro na agenda da comissão, não?

Sim. Em 2006 a comissão apoiou a publicação do livro “Controle interno no mercado segurador brasileiro - Conceitos e práticas”. O tempo, porém, dadas as inúmeras mudanças havidas com o assunto, se encarregou de deixá-lo desatualizado. Nosso propósito é reeditar o livro, atualizando-o e agregando aspectos que não foram tratados na primeira edição ou foram tratados sem a profundidade que merecem. Em princípio, a nova edição terá como título “Controle interno e gestão de riscos no mercado segurador – Conceitos, regulamentos, práticas e auditoria”, que melhor reflete seu novo e incrementado conteúdo.

Qual a sua expectativa em relação à criação do banco de dados de perdas operacionais demandado pela Susep? O senhor acha que essa iniciativa aumentará ainda mais o comprometimento do alto escalão das empresas com a gestão dos processos das companhias?

Acredito que sim, uma vez que o assunto passará a ser tratado e expresso de forma quantitativa, melhor dizendo, financeira, que é uma linguagem mais bem compreendida pelos altos escalões das companhias. Com efeito, na medida em que, por exemplo, uma parada de sistemas, um erro funcional, uma deficiência de procedimento, uma falha de controle ou uma fraude deve ser medida e registrada sob o ponto de vista pecuniário, haverá argumentos mais consistentes para que o alto escalão fique mais comprometido em entender as razões da perda operacional e investir na sua prevenção, se não para eliminar, para mitigá-las. Com certeza a iniciativa servirá para aumentar a conscientização de todos.

Como o cliente se beneficia de processos de controle eficientes por parte de uma seguradora, entidade de previdência ou empresa de capitalização?

A missão principal do órgão regulador é proteger o consumidor de seguro e garantir a saúde do setor, o que é feito mediante a edição de regras cada vez mais focadas naqueles objetivos. Isso obriga as empresas a implementarem governança, processos e controles que, além propiciar a sustentabilidade, protegem o cliente e demais partes relacionadas. Gosto de enfatizar o título de um livro de Manoel Marcondes de Neto, que bem reflete esse enfoque e destaca o componente “ambiente de controle” do Controle Interno: “A transparência é a alma do negócio”. É uma filosofia de atuação que se contrapõe àquela que dizia que “o segredo é a alma do negócio”. Quanto mais claras as informações, os produtos, os controles, a governança, mais o cliente confiará que está entregando a proteção de seus bens e de seu futuro a uma empresa que foge do lucro fácil e imediato e prefere um crescimento sustentável e duradouro. Ao aumentar de forma consistente e veraz a imagem de segurança para o consumidor, a seguradora logra reduzir seu custo de aquisição e de manutenção de clientes. O benefício do cliente, por conseguinte, é o aumento de sua segurança.

Há estatísticas que demonstrem que o controle interno reduz o risco de fraudes e que traz ganhos para a imagem ou mesmo financeiro às empresas? Pode citar alguns exemplos?

Há aqui ou ali estatísticas e estudos que indicam que boa governança, bons controles e boa transparência redundam em rentabilidade acima da média do mercado e, no caso das empresas de capital aberto, menor volatilidade de suas ações, logros que claramente estão relacionados à boa imagem, ou seja, aquela que leva à confiança do cliente. Por outro lado, e muito embora ainda intangível, parece lógico concluir que governança, controle e transparência resultam em sustentabilidade e longevidade do negócio. Pode-se ilustrar esses ganhos olhando para a crise de 2008: fez um estrago no mundo, mas as seguradoras brasileiras passaram incólumes em razão das bases fortes de governança, de capital, de solvência, resultantes de normas de controle interno e de gestão de riscos, que a cada ano vão se tornando mais rígidas. Hoje o profissional de Controles Internos e de Gestão de Riscos tem bons argumentos para vender a sua função para a alta administração, uma vez que, no ambiente atual, não é possível sobreviver sem controles internos de forma sustentável e longeva. Outro dado interessante é que o mercado brasileiro de seguros, que cresce a uma taxa anual de dois dígitos apesar do crescimento do PIB nacional mal chegar a 2%, apresenta um índice de demandas judiciais que não chega a 0,8%. Isso demonstra que esse esforço de implementar bons controles e boa gestão de riscos leva o mercado segurador a não sofrer tanto como outros segmentos.

Fonte: logo cnseg