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Seguradoras devem aderir ao Fatca mesmo sem acordo intergovernamental

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Os bancos saíram na frente, mas as seguradoras poderão recuperar o atraso se iniciarem desde já a adesão ao Fatca (na sigla em inglês, de Foreign Account Tax Compliance Act). A orientação foi transmitida em evento da CNseg, realizado nesta quinta-feira, 5 de dezembro, no auditório da Bradesco Seguros, em São Paulo, com a participação de especialistas da consultoria KPMG. “Estamos atrasados, mas nunca é tarde”, afirmou Alexandre Leal, superintendente de Regulação da CNseg.

Ele relatou que, no dia anterior, havia participado de evento do setor bancário, em que foi discutido o cronograma de adesão das instituições financeiras, e percebeu o ambiente mais propício para implantação desse regime. “Dizia-se, antigamente, que era uma medida unilateral do governo norte-americano. Mas, hoje, já se percebe que a medida é vista como multilateral, com a adesão de vários países”, observou.

Julio A. Castro, que há 15 anos atua na KPMG nos Estados Unidos, explicou que o Fatca foi promulgado em 2010 pelo governo norte-americano, devido às dificuldades enfrentadas cinco anos antes para conter a sonegação fiscal. De acordo com a legislação daquele país, os americanos são obrigados a pagar impostos ainda que morem em outro país. Foi por volta de 2005 que estourou um escândalo envolvendo um banco estrangeiro, que ajudava americanos no exterior a “esconderem” seus ativos. “Assim surgiu o Fatca, que permite ao governo americano ter acesso a informações sobre transações financeiras de cidadãos e empresas que residam ou atuem fora do país, os denominados US persons”, disse.

Segundo Castro, o Fatca, que é a lei norte-americana de conformidade tributária para contas estrangeiras, estabelece que as informações sobre transações financeiras dos US persons devem ser controladas e reportadas às autoridades fiscais dos Estados Unidos pelas FFIs e NFFEs – siglas que denominam as instituições financeiras estrangeiras e não-financeiras, respectivamente.

Por que as seguradoras brasileiras devem aderir ao Fatca? Castro explicou que a adesão é voluntária, porém, as seguradoras que mantêm negócios com os Estados Unidos ou com US persons estarão sujeitas a penalidades em caso de recusa. A seguradora que se encaixar na condição de FFI ou NFFE e não reportar as informações sobre as movimentações financeiras de US persons estará sujeita à retenção de 30% sobre os pagamentos a receber de fontes dos Estados Unidos. A mesma penalidade será aplicada aos segurados US persons que se negarem a autorizar o reporte de suas informações. O segmento bancário, por exemplo, está levando a adesão à risca, tanto que um grande banco multinacional, segundo relatou Alexandre Leal, decidiu abrir mão dos clientes que se recusaram a autorizar o envio de informações sobre suas transações financeiras. “Foi uma decisão estratégica do banco, que preferiu encerrar o relacionamento com uma parte de seus clientes a ter de fazer a retenção de 30%”, disse Leal.

Mas ele ressaltou que existe um entrave à adesão das seguradoras e de instituições ao Fatca. A questão é que sem a assinatura de um acordo intergovernamental (IGA, na sigla em inglês) entre o governo brasileiro e o norte-americano, o envio de informações sigilosas de segurados ou correntistas US persons pode infringir a legislação do país. “Este é um risco que as empresas não querem correr”, disse Leal. A assinatura do IGA, segundo ele, forneceria o arcabouço legal para que as empresas enviassem as informações sem ferir a legislação. Informações divulgadas pelo segmento bancário dão conta de que o Brasil já estaria negociando a assinatura do acordo intergovernamental no modelo 1 do Fatca, no qual o governo seria interlocutor e não as empresas diretamente.

Entretanto, como o primeiro prazo do cronograma de implantação do Fatca vence em 25 de abril de 2014, Leal teme que não haja tempo para as seguradoras adotarem os procedimentos necessários para a adesão. “Com ou sem o IGA, as seguradoras terão de cumprir uma série de requerimentos e o melhor é não esperar a assinatura do acordo. O Fatca esta aí e tem de ser cumprido”, disse. De acordo com Phelipe Linhares, da KPMG, o processo de adequação compreende diversas fases, começando pela classificação da empresa ou do seu produto no escopo do Fatca. Uma seguradora seria classificada como FFI se fizesse pagamentos à financial accounts. No caso, seriam somente seguradoras cuja principal linha de negócios (mais de 50%) seja a emissão de apólices de seguros ou contratos de anuidades ou resseguro de tais contratos.

Linhares explicou que a financial account inclui apólices com componente de investimento, isto é cash value ou annuities. O cash value representa o maior valor entre o montante que o titular teria direito a receber ao término do contrato e o montante que teria direito de tomar emprestado usando a apólice ou plano como garantia. “Tal conceito não encampa contratos que dão proteção puramente de seguro, como vida, acidentes, saúde, property & casualty”, disse. “O VGBL e PGBL estão no escopo do Fatca e se enquadram como cash value”, acrescentou.

Ele elencou os passos para adequação ao Fatca a partir da identificação dos clientes originários dos EUA, apuração dos impactos que serão assumidos, planejamento das ações necessárias, adaptação dos sistemas, envolvimento e treinamento do pessoal dedicado às novas tarefas, definição de processos, soluções e novas abordagens de governança e de exposição a riscos, além do gerenciamento do relacionamento e da comunicação com clientes, potenciais clientes e demais partes interessadas.

Linhares reconheceu que a identificação de clientes US persons é o primeiro grande desafio para as empresas brasileiras. “Hoje, os cadastros no Brasil não estão preparados para identificar US persons, com o complicador de os cadastros por produtos não serem unificados”, disse. “Mas o Brasil não está sozinho nesse processo, em todos os países as seguradoras estão atrás dos bancos na adequação”, disse.

Fonte: CNseg, em 06.12.2013.