Por Aparecido Mendes Rocha (*)
O contrato de seguro de transporte é um típico contrato de adesão, em virtude de que o segurado, na contratação do seguro deve aderir a todas as cláusulas definidas pela companhia de seguros, não sendo permitido discuti-las. A participação do segurado no contrato está restrita à aceitação dos dispositivos contratuais elaborados unilateralmente pela seguradoras.
Dentre as cláusulas inseridas nas apólices de seguros de transporte nacional e internacional e de responsabilidade civil dos transportadores, está a cláusula de revisão, por meio da qual a seguradora objetiva diminuir seus prejuízos por conta da ocorrência de sinistros. Nesta cláusula, as seguradoras indicam que podem rever, de imediato, as condições do seguro sempre que a sinistralidade (sinistros pagos e avisados sobre os prêmios líquidos pagos e emitidos) ultrapassar um determinado percentual, normalmente de 60%.
Na cláusula de revisão, são estabelecidas as regras aplicáveis, tais como: aumento de taxa, diminuição do limite de garantia, inclusão ou aumento de participação obrigatória, fixação de prêmio mínimo, alteração dos planos de gerenciamento de risco e até o cancelamento da apólice.
Ocorre que, a imposição de condições onerosas ao segurado e vantajosas para a seguradora, como a cláusula de revisão presente nas apólices de seguros de transportes, configura abuso de direito e ofende os princípios fundamentais do ordenamento jurídico e normas constitucionais. Qualquer cláusula contratual que permita a seguradora alterar unilateralmente o conteúdo do contrato de seguro é nula. A nulidade de cláusula abusiva não significa o cancelamento do contrato, mas apenas a exclusão do dispositivo, ficando as demais cláusulas mantidas.
O objetivo do seguro é garantir o segurado contra os riscos futuros e incertos. Assim, o segurado não pode responder pela ocorrência de mais sinistros que os esperados pelas seguradoras. O seguro é uma atividade econômica de riscos na qual a seguradora pode ganhar ou perder. Portanto, o aumento do índice de sinistralidade não outorga a seguradora, poderes para impor ao segurado novas condições.
O contrato de seguro estabelecido entre segurado (consumidor) e seguradora (fornecedor de serviços) constitui uma relação de consumo, e conseqüentemente rege-se pelas normas do Código de Defesa do Consumidor (CDC) e da Constituição Federal.
Considerando que o contrato de seguro tem caráter de adesão e consumo, as cláusulas abusivas eventualmente identificadas, como, por exemplo, a cláusula de revisão se submete ao regime de nulidade do artigo 54 do Código de Defesa do Consumidor. Esta lei ainda traz o artigo 51, que diz serem nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade; e, estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor.
De acordo com as normas da Superintendência de Seguros Privados – Susep, a cláusula de revisão só pode ser aplicada na renovação da apólice. Nessa possibilidade, caberá ao segurado aceitar as imposições ou procurar outra seguradora.
(*) Aparecido Mendes Rocha, especialista em seguros internacionais.
Fonte: Blog do Rocha, em 21.01.2015.