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Eduardo Giannetti avalia o valor do amanhã

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Como será o amanhã nas relações de trabalho? Eis um tema complexo e que dependerá, primordialmente, dos esforços de todos: governos, empresários e indivíduos. “Somente os três juntos poderão criar um ambiente onde há talentos desenvolvidos e oportunidades”, enfatiza o economista Eduardo Giannetti, na palestra de abertura do VIII Encontro de RH do Mercado Segurador, organizado pela Escola Nacional de Seguros, em São Paulo, nesta quinta-feira, 25.

Ele foi convidado pela Escola Nacional de Seguros há seis meses. “Nosso objetivo é discutir e compartilhar o papel cada vez mais relevante da função de Recursos Humanos nas organizações. Estamos aqui para refletirmos sobre o futuro do trabalho e analisarmos os aspectos da legislação trabalhista que ainda nos tiram o sono”, disse Maria Helena Monteiro, diretora da Funenseg, passando a palavra ao economista e autor do livro “O Valor do Amanhã”.

O economista explicou aos 120 profissionais de RH presentes ao evento a sua tese sobre bônus (ou dividendo) demográfico, com o intuito de frisar que é preciso correr contra o tempo para contribuir para um “amanhã” mais sustentável para a economia brasileira. “O Brasil fez conquistas muito importantes nos últimos 20 anos, como o controle da inflação e o movimento de inclusão social, com 40 milhões de brasileiros que ascenderam para a classe média, mas não à cidadania. A população quer respeito acima de tudo, bem como transporte, saúde, qualidade de vida e poupança previdenciária”. O desafio, aponta, é incorporar o brasileiro numa vida onde seus direitos e sua segurança têm de ser preservados.

Para ele, reduzir a informalidade nas relações de trabalho é essencial para começar a mudança. “São mais de 20 milhões de pessoas sem contrato de trabalho, vivendo sem garantias e direitos, uma vida precária e sem produtividade”, assinalou.

Outro dado interessante é que o Brasil tem mais de 2 milhões de ações trabalhistas por ano. Um recorde mundial. “Um banco privado de varejo me contou recentemente que tem mais ações trabalhistas do que o total divulgado em toda a economia americana”. Segundo ele, o que alimenta isso é ter uma legislação complexa e que não atende mais a realidade do país. “Quando a CLT foi criada, o trabalhador sequer tinha celular”. Gianetti deixou claro que não bastam apenas as reformas na legislação trabalhista consolidada na CLT ou o investimento das empresas em cursos e treinamentos.

A desigualdade nas oportunidades de autorrealização é a raiz dos males brasileiros. “Tudo começa na família. No caráter. Na oportunidade. Temos hoje um balcão de negócios. As faculdades fingem que ensinam e os alunos fingem que estudam”, disse ele, com base nos dados Pisa (Programme for International Student Assessment).

Ele reconhece que o Brasil fez avanços reais nos últimos 20 anos, graças à conquista da estabilidade econômica e das políticas de inclusão social. No entanto, é preciso qualidade e não apenas quantidade. Dados da pesquisa mostram que 36% das pessoas que cursam faculdade no Brasil não são plenamente alfabetizados. “Continuamos, porém, sendo um dos países mais desiguais do planeta. No ranking da distribuição de renda, somos a segunda nação mais desigual do G-20, a quarta da América Latina e a 12ª do mundo”, afirmou. No ranking Pisa, que mede o aprendizado de jovens de 15 anos em 59 países em matemática e leitura, “o Brasil fica na 54ª colocação, considerando-se alunos de escolas de elite com seus pares de outros países”. Ou seja, não é uma questão de escolas públicas sem investimentos. Ou seja, boa parte dos problemas está na desigualdade de oportunidades. “Observamos uma profunda falta de equidade nas condições iniciais de vida, com privação de direitos elementares, que chegam até mesmo a ter água encanada na casa. Em pleno século 21, metade dos domicílios não tem coleta de esgoto, o que pode, além de tudo, causar um distúrbio cognitivo”.

Para ele, a péssima distribuição de renda é fruto de uma grave anomalia: a brutal disparidade nas condições iniciais de vida e nas oportunidades das nossas crianças e jovens de desenvolverem adequadamente suas capacidades e talentos de modo a ampliar o seu leque de escolhas possíveis e eleger seus projetos, apostas e sonhos de vida. “A nova classe média ascendeu ao consumo, mas não ascendeu à cidadania. Essa parcela da população quer essas credenciais, e o poder público tem de atender essa demanda”, frisa.

E esse modelo precisa ser mudado rapidamente, em razão do bônus demográfico. O Brasil vive um momento único que não mais se repetirá. Com a queda da taxa de fecundidade nos últimos anos, a base da pirâmide populacional está se estreitando, o topo ainda está pequeno e a maior parte da população é composta pela População Economicamente Ativa (PEA), o que significa que há poucos idosos e jovens dependentes. “Nós teremos entre 15 anos a 20 anos neste cenário, até que a pirâmide se transforme em um cogumelo, com o aumento do número de idosos dependentes”.

E como tornar essa realidade melhor? Investindo na produtividade. Nos países desenvolvidos, cada cidadão é quatro ou cinco vezes mais produtivo que cada brasileiro, como é o caso da Alemanha e Canadá. A produtividade será melhor se as empresas conseguirem mudar o que o economista chama de “trabalho alienado”.

Se o trabalhador não se sente ele motivado em ser ele mesmo, não vai se engajar em tornar o trabalho mais produtivo e isso é fatal para uma empresa. Em números, eis o que isso significa. Se uma empresa melhorar a sua produtividade em 3,5% ao ano, ao longo de 20 anos ela dobrará o faturamento. Se melhorar 5% ao ano, dobrará em 14 anos. “Ou seja, ganhará seis anos apenas se conseguir aumentar em um ponto percentual e meio o ganho de produtividade se cada membro da organização fizer melhor o que faz diariamente. Se ela estiver alienada, vai repetir e fazer a mesma coisa, sem o ganho. Vendo algum sentido no que faz, o funcionário vai aprimorar a sua capacidade de aperfeiçoamento e esse despertar interno vai gerar riqueza”, explica.

Assim, para ele, o maior desafio dos profissionais de RH é implementar ações que desenvolvam o cérebro de cada trabalhador. “Isso não dá para ser decretado. As pessoas têm de ser “empoderadas” para fazer isso. Eles têm de se sentir participantes do processo e ser reconhecidas por fazer isso. Só que está fazendo a própria atividade sabe o que dá para fazer para melhorar o que vem fazendo”. Pesquisa - O evento também contou com a participação de Roberto Ciccone, líder da área de Seguros da IBM Global Business Services, que apresentou uma pesquisa global que aponta que entender o negócio ainda é um desafio para o RH. Na parte da tarde, estão sendo realizados debates promovidos pela equipe de advogados do escritório Mattos Filho, Veiga Filho, Morrey Jr. e Quiroga Advogados. As apresentações terão como tema “O futuro nas relações de trabalho”, abordando as questões “A remuneração variável dos executivos”, “O seguro D&O como parte do Pacote de Benefícios” e “Legislação e tendências trabalhistas”. Os aspectos da legislação trabalhista, que muito preocupam a comunidade de Recursos Humanos, também serão debatidos em detalhe durante toda a segunda parte do encontro.

Fonte: CNseg, em 25.09.2014.