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Vantagens do factor investing para os institucionais

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Rodrigo Maranhão1

Nos primórdios do mercado acionário, os investidores acreditavam que os retornos neste mercado estavam exclusivamente relacionados à sua habilidade de escolher as melhores ações. Esta visão começou a ser questionada em 1964, quando William Sharpe lançou o Capital Asset Pricing Model (ou CAPM), modelo no qual o retorno das ações seria determinado por três componentes: alfa, beta e retorno da taxa livre de risco. Com este novo paradigma, percebeu-se que o mercado como um todo é responsável por explicar grande parte dos retornos das ações, através do “beta”. Já em 1976, Stephen Ross propôs o Arbitrage Pricing Theory (ou APT), modelo com o qual identificava que poderiam existir múltiplos fatores capazes de explicar os retornos dos ativos. Finalmente, em 1993, Eugene Fama e Kenneth French publicaram seu famoso modelo de 3 fatores, adicionando ao CAPM os fatores de SMB (Small Minus Big) e HML (High book to price Minus Low book to price): o primeiro era um fator relacionado ao valor de mercado da empresa; e o segundo era um fator relacionado a uma métrica de valor (valor patrimonial dividido pelo valor de mercado). Desde então, milhares de fatores vêm sendo publicados, criando uma fauna de fatores (ou Factor Zoo). Citando alguns dos tipos de fatores mais citados: value, growth, quality, momentum, size e low-risk.

Mas o que de fato são esses fatores? Eles nada mais são do que características capazes de explicar (parcialmente) os retornos dos ativos. Exposição a estes fatores tipicamente embutem prêmios de risco: os investidores, em média, obtêm retornos extras por se exporem a estas características. Há evidências bastante documentadas em relação a alguns dos fatores, considerando diversas situações temporais e geográficas nos estudos. Um exemplo clássico neste sentido é o artigo Value and Momentum Everywhere (de Asness, Moskowitz e Pedersen), no qual os autores encontram prêmios de riscos dos fatores value e momentum em diversas classes de ativos ao redor do mundo.

Chegamos ao questionamento do porquê o investidor institucional deveria utilizar uma abordagem de fatores. O Nefin, da USP, publicou diversos estudos mostrando que a grande maioria dos fundos não consegue gerar resultados significativos que não sejam explicados por fatores. Dando a magnitude: no último relatório disponível, apenas 30 dos 384 fundos estudados por eles conseguiram este feito. Isso não significa que os gestores não gerem retornos interessantes, mas talvez os bons resultados sejam menos explicados pelo stock-picking em si e mais pela exposição aos prêmios de risco dos fatores. Desta forma, um fundo que se exponha sistematicamente a estes prêmios de risco pode ser uma forma interessante da EFPC obter bons retornos no mercado acionário, focando no que de fato interessa.

Um simples backtest que pode ser reproduzido em qualquer terminal do Bloomberg: todo fechamento de mês, ranqueia as 500 ações que compõem o S&P500 pelo seu P/L, montando dois portfólios, onde Q1 é o portfólio composto pelas 100 ações mais baratas e Q5 é o portfólio das 100 ações mais caras (considerando o critério de P/L). Vemos que nos 20 anos até julho/2021, o Q1 rendeu 706% enquanto o Q5 rendeu 440% (retorno anualizado de 11.00% contra 8.80%). Contudo, apesar deste resultado expressivo, há longos períodos em que o Q1 tem resultados inferiores ao Q5. Como já mencionamos, se trata de um prêmio de risco e, como tal, não há garantias de retornos superiores.

Há inclusive algumas teorias que tentam associar os períodos de excesso de retorno de cada fator aos ciclos econômicos, onde cada fator apresentaria melhor desempenho em diferentes etapas do ciclo. Desta forma, é esperado que cada fator “funcione” em um momento diferente. O investidor poderia então adotar duas abordagens distintas: tentar projetar um cenário e posicionar-se naqueles fatores que se beneficiariam do mesmo ou, construir um portfólio de fatores que no longo prazo consiga combinar retornos interessantes e riscos controlados. Nós da Kadima utilizamos esta segunda abordagem na gestão de nossos fundos de ações, algo que acreditamos ser, inclusive, bastante similar a uma visão de “alocação” já bastante difundida entre as entidades fechadas de previdência complementar.

Também vale destacar que os fundos focados em factor investing normalmente terão uma carteira bastante diversificada de ações, com liquidez razoável e quando bem geridos, podem entregar um retorno compatível com os objetivos dos investidores. A sistematização dos investimentos por estes fundos permite a análise do amplo universo de ações disponíveis, sendo este um diferencial em relação aos fundos que utilizam a análise discricionária, e que tenderá a ampliar-se cada vez mais na medida em que mais empresas abrem seu capital na bolsa.

Por fim, um outro apelo desta abordagem sistemática aplicada ao mercado de ações é o fato de que com ela conseguimos mitigar significativamente os impactos dos vieses comportamentais nos investimentos. Como é muito documentado, tais vieses afetam amplamente os investidores, atrapalhando sua tomada de decisões. Como no caso do factor investing as regras foram previamente definidas, os vieses e heurísticas deixam de afetar de forma significativa o processo de investimento.

Atualmente, já existem EFPCs utilizando a abordagem de factor investing diretamente (com modelos proprietários para comprar as ações) e indiretamente (investindo em fundos que utilizam-se desta abordagem). Além dos benefícios já citados, a transparência e existência de um processo bem definido torna a abordagem especialmente atraente aos investidores institucionais. Acreditamos que este movimento irá se acentuar nos próximos ciclos de investimentos das entidades. Finalizamos aqui o artigo provocando todos que leram a pesquisarem sobre este tema, vendo as boas alternativas existentes no mercado de fundos brasileiro.

Fonte: Abrapp em Foco, em 10.09.2021.



1 Rodrigo Maranhão é sócio e diretor de gestão da Kadima Asset Management. Ele é mestre em métodos matemáticos aplicados às finanças, pelo IMPA e, engenheiro mecânico e de armamentos pelo IME.