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RNS nº 413/2016 ANS - contratação eletrônica de planos privados de assistência à saúde

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Por Maria da Gloria Faria (*)

A Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS – neste mês de novembro regulamentou a contratação eletrônica de planos privados de assistência à saúde, por meio da RNS nº 413/16. No presente artigo comentaremos, brevemente, os artigos da referida resolução, os aspectos e possíveis impactos de seus comandos, mais especificamente no que diz respeito às observações de cautela para a oferta e contratação dos planos privados de saúde pela Internet.

1. Introdução

A utilização de meios remotos, principalmente Internet e aplicativos vem se multiplicando rapidamente entre nós, com o Brasil já contando com uma comunidade de internautas que abrange mais de 60% da população, (PNUD – IBGE), sendo que o marco civil da Internet foi fixado na Lei nº 12.965 de abril de 2014. Entretanto, só agora, em novembro, após um longo período de debates com todos os players dos setores público e privado, a ANS publicou Resolução Normativa que dispõe sobre os procedimentos para a contratação eletrônica de planos privados de assistência à saúde.

O reconhecimento dos meios remotos como instrumentos válidos e confiáveis de contratação trilhou caminhos longos em que a polêmica foi uma constante. A desconfiança por parte dos órgãos de defesa do consumidor teve seu foco, sobretudo, na segurança e nas vantagens reais que a adoção dessa tecnologia proporcionaria e como estas seriam garantidas. A adoção dessa nova tecnologia não se deu de forma homogênea tendo, alguns setores, introduzido-a com mais rapidez que outros. Não se deu de modo uniforme a resposta ao apelo das vantagens que a internet pode agregar à divulgação, prospecção e fidelização de clientes e à contratação de produtos e serviços.

2. RNS nº 413/2016 ANS - compra e venda de produtos e serviços pela internet

Com a publicação em 14 de novembro da RNS nº 413/2016 a ANS, finalmente, regulamentou a contratação de planos e seguros de assistência privada à saúde por meios eletrônicos que poderá, a partir de então, ser acessada e concluída pela Internet e seus aplicativos.

A primeira observação a ser feita é que a contratação por meios remotos recebeu caráter facultativo na norma, não tendo sido excluída ou vedada, a possibilidade de interveniência e intermediação do corretor na nova forma de contratação. Dito de outra forma, a regulamentação criou a possibilidade do consumidor ou empresa contratarem um plane privado de assistência médica por meio remoto, com ou sem a interveniência de um corretor, ficando, a critério do contratante como fazê-lo.

Portanto vejamos o texto da norma:

A RNS nº 413/2016 determina:

Art. 1º. A presente Resolução Normativa - RN dispõe sobre os procedimentos para a contratação eletrônica de planos privados de assistência à saúde.

Parágrafo único. As disposições constantes nesta RN aplicam-se também às operadoras classificadas como administradoras de benefícios.

Art. 2º. É facultativo o oferecimento de contratação eletrônica de planos privados de assistência à saúde.

Vale ressaltar que, hoje, o setor de seguros já conta com pelo menos uma seguradora 100% on line. É o caso da Youse cujo slogan simplicidade inteligente se direciona ao novo consumidor, imediatista, que deseja adquirir um seguro de forma rápida e onde quer que se encontre. Relativamente às corretoras, também este segmento já possui uma empresa 100% digital. Trata-se da corretora Minuto Seguros, criada em 2011, com o apoio da Redpoint e.ventures, e do fundo de investimento do Vale do silício na Califórnia.

No caso dos seguros e planos privados de assistência à saúde a contratação por meios remotos, não se fazia possível sem regulamentação especifica o que só veio a ocorrer com a entrada em vigor da RNS nº 413/2016 na data de sua publicação, em 14 de novembro.

Ainda sobre o assunto, tomemos o art. 9º das Disposições Transitórias RN que cria imposições conexas à oferta do mesmo produto em sua venda tradicional, com a contratação presencial.

Art. 9º. Os planos da operadora ofertados para contratação eletrônica deverão ser ofertados também presencialmente por pelo menos 12 (doze) meses, a partir da vigência desta Resolução.

§ 1º. Não se aplica a regra descrita no caput para os casos em que a operadora ofertar a contratação eletrônica para a totalidade dos planos de uma mesma segmentação assistencial prevista na Lei nº 9.656, de 1998.

§ 2º. Excetua-se a regra do caput aos planos da segmentação odontológica.

Assim, a oferta do mesmo produto por via tradicional, deverá ser mantida, de forma paralela, pelo período mínimo de 12 meses, contados do início da  vigência da RNS nº 413/2016, com exceção de duas situações excepcionais: (i) no caso da seguradora passar a ofertar todos os produtos de uma segmentação assistencial por meio eletrônico e (ii) na venda de planos odontológicos.

Relativamente à responsabilidade pela guarda das informações e dos dados pessoais fornecidos pelo contratante, a norma segue princípios e dispositivos legais anteriores a ela, como é o caso do Decreto nº 8.771/2016 que regulamenta a Lei nº 12.965/2014, marco civil da Internet, bem como o CDC.

Art. 3º. É de total responsabilidade das operadoras a guarda e segurança das informações relativas à contratação eletrônica, inclusive no que se refere aos dados pessoais dos interessados.

Quanto às informações essenciais que devem, obrigatoriamente, ser fornecidas quando da contratação, o artigo 4º dedica 9 incisos além dos §§ 1º e 2º para listá-las.

Art. 4º. Durante o processo de contratação, anteriormente à sua finalização, as operadoras devem apresentar as informações inerentes ao contrato do plano de saúde, dentre as quais, destacam-se:

I - nome comercial e nº de registro do plano na ANS;

II - tipo de contratação e suas peculiaridades;

III - segmentação assistencial do plano de saúde;

IV - área geográfica de abrangência do plano de saúde;

V - área de atuação do plano de saúde;

VI - padrão de acomodação em internação;

VII - formação do preço;

VIII - serviços e coberturas adicionais; e

IX – mecanismos de regulação da utilização dos serviços.

§ 1º. Além dessas informações, todos os Guias e Manuais que sejam obrigatórios na contratação presencial devem estar disponíveis para impressão ou download e assinatura pelo interessado.

§ 2º. O Guia de Orientação previsto no artigo 18 desta Resolução especificará outras informações que deverão ser destacadas.

O processo de contratação e a vigência dos contratos são tratados na seção III e se estende pelos artigos 5º, 6º e 7º. O artigo 5º trata no seu caput da obrigação do interessado em adquirir um plano de fornecer as informações necessárias e a documentação solicitada pela operadora e em seus § 1º e o § 2º e o § 3º das obrigações da operadora de gerar protocolo, fornecer todas as informações sobre o processo de contratação, cumprir o prazo de 25 dias corridos para conclusão do processo, prazo este que se inicia a partir da data, 1º dia, em que forem enviadas as informações necessárias pelo cliente.

No passado, as queixas de insatisfação de proponentes face a ausência de uma resposta imediata da operadora gerou multas, muitas vezes, em situações em que o lapso de tempo da arguida demora excessiva era bem inferior aos agora previstos 25 dias corridos estabelecido na RNS nº 413/2016.

Art. 5º. O interessado na contratação de um plano ofertado eletronicamente deverá preencher todas as informações necessárias e enviar toda a documentação solicitada.

Quanto às informações essenciais que devem, obrigatoriamente, ser fornecidas quando da contratação, a Operadora passa a ter direito a suspender a vigência do contrato caso o consumidor, devidamente notificado, não apresente a documentação que lhe for requisitada, inclusive podendo exigir informações médicas, submeter o cliente a perícia, sem que isso comprometa a segurança na contratação.

§ 1°. O sistema eletrônico deverá gerar automaticamente um número de protocolo de visualização imediata, que também será encaminhado por correio eletrônico para o endereço de e-mail cadastrado pelo interessado, esclarecendo todas as etapas da contratação eletrônica.

§ 2°. A operadora deverá, no prazo máximo de 25 (vinte e cinco) dias corridos, concluir o processo de contratação eletrônica e disponibilizar as opções de pagamento.

§ 3°. O prazo estabelecido no § 2º deste artigo se dará a partir da data do início da contratação eletrônica que corresponde ao primeiro dia de envio das informações necessárias.

A exigência da geração de número de protocolo e fixação de prazo para a conclusão do processo de contratação e a definição do início de sua contagem, sem dúvida trazem segurança jurídica para a contratação por meio eletrônico em benefício de ambas as partes. E para tanto a operadora deverá cuidar para que esse requisito seja observado em todos os acessos que visem a contratação por meio remoto.

§ 4°. Caso seja necessária realização de perícia ou de entrevista qualificada, a operadora deverá oferecer uma forma de escolha ao interessado, de ao menos três opções de data e horário dentro do prazo definido no § 2º deste artigo.

§ 5°. Caso o interessado não compareça à perícia ou à entrevista qualificada na data agendada, suspende-se a contagem do prazo estabelecido no § 2º deste artigo.

Os §§ 4º e 5º levam à consideração da importância, para a seguradora, de contar com aplicativo especialmente desenvolvido e apto para garantir na contratação eletrônica, sempre, para uso em caso necessário, a prova de que o proponente foi, efetivamente, comunicado da necessidade da entrevista qualificada ou da perícia, da oferta das datas e locais para a entrevista ou perícia, da resposta com a escolha da data e hora, e por fim que lhe foi comunicado o resultado da entrevista ou da perícia.

§ 7º. Quando a operadora solicitar ao interessado alguma documentação, a mesma deverá ser apresentada em até 5 (cinco) dias úteis. Caso o interessado não apresente a documentação neste prazo, fica suspenso o prazo máximo previsto no § 2º deste artigo.

O § 6º não traz nada de novo, pelo menos, para as seguradoras especializadas, apenas repetindo o que já existia em normas do setor segurador. Não custa destacar que configurar-se- á a contratação automática no caso de inobservância do prazo de 25 dias para que seja finalizado o processo de contratação.

Art. 6º. A data de início da vigência dos contratos celebrados por meio eletrônico será o dia do efetivo pagamento da primeira contraprestação pecuniária do plano de saúde.

§ 1º. A disponibilização do pagamento ocorrerá ao final do processo de contratação em que o contratante assinará, na forma do artigo 7º desta Resolução, declarando ciência e concordância de um resumo dos termos de seu contrato.

§ 2º. No caso dos planos da modalidade pós-pagamento, a vigência dos contratos inicia-se a partir da finalização do processo de contratação descrito no artigo 5º.

§ 3º. Nos contratos coletivos empresariais e por adesão, caso haja estipulação contratual entre as partes sobre o início da vigência contratual, não se aplica o disposto neste artigo.

§ 4º. Para o disposto no § 3º a data de vigência negociada entre as partes deve constar de forma clara no contrato.

Os §§ 2º, 3º e 4º tratam especificamente dos casos de planos da modalidade de pós-pagamento e planos coletivos, e guardam coerência com o disposto no caput. O §3º especifica a situação de exceção e o §4º a hipótese de negociação entre as partes da data vigência, que deve constar de forma clara no contrato.

Art. 7º. Na contratação eletrônica, os documentos poderão ser assinados das seguintes formas:

I – certificação digital;

II – login e senha após cadastro;

III – identificação biométrica; ou

IV – assinatura eletrônica certificada.

§ 1º. Serão admitidas outras formas de assinatura, desde que assegurem a sua autenticidade e sejam legalmente permitidas.

§ 2º. Antes de iniciar a contratação, o interessado deverá ser informado no sentido de que, toda vez em que for solicitada a sua assinatura em qualquer documento, conforme o § 1º do artigo 4º, nas formas previstas no caput deste artigo, significa que estará assinando o documento.

§ 3º As reproduções digitalizadas de documentos assinados e enviados pelo interessado fazem a mesma prova que os originais, ressalvada a alegação motivada e fundamentada de adulteração.

Quanto ao § 1º do art. 7º, as hipóteses constantes dos incisos do referido artigo, são apenas exemplificativas e, não vedam outras hipóteses, mantendo espaço para a atualização da tecnologia digital.

Art. 8º. O contratante poderá exercer seu direito de arrependimento e rescindir o contrato unilateralmente no prazo de 7 (sete) dias previsto para transações fora do ambiente de duração a partir da data de vigência do contrato.

§ 1º. O formulário de rescisão por arrependimento deverá conter declaração do consumidor, com destaque, de ciência de que a rescisão sem ônus está condicionada à não utilização do plano por ele ou seus dependentes, e que, em caso de uso, a operadora poderá cobrar o custeio dos procedimentos efetuados.

§ 2º. O custeio dos procedimentos efetuados será até o limite do valor da multa rescisória prevista contratualmente.

O artigo 49 caput, do Código de Defesa do Consumidor, é o texto inspirador das disposições do artigo 8º da resolução referente ao direito de arrependimento e da sua eficácia, adotado o mesmo prazo de 7 dias para transações fora do estabelecimento comercial, aí entendidos e compreendidos os meios remotos. O mesmo vale para as orientações e princípios do CDC adotados nos §§ 2º e 3º do art 7º.

3. Considerações Finais

A ampliação de acesso que a RN nº 413/16 traz ao permitir a contratação de planos privados de saúde por meio digital veio atender a anseios antigos do consumidor de seguros dos novos tempos, e das operadoras que investiram e se direcionam para essa forma de contratação. A definição de prazos, para as etapas e finalização do processo, vem em socorro de dúvidas que habitavam uma zona até então pouco clara no relacionamento entre operadoras e usuários e, daquelas com a ANS. Seus efeitos certamente serão positivos e eventuais dificuldades de percurso poderão ser corrigidas ao longo de sua aplicação, havendo espaço e necessidade de alguns aperfeiçoamentos.

Por fim, a evolução para a corretagem digital ganha força com a nova norma e, em conjunto com os sistemas adequados desenvolvidos pelas operadoras, contribuirá para a celeridade do processo de contratação e a satisfação dos muitos usuários fãs de carteirinha dos meios digitais - internet e aplicativos. Expande-se o espaço para a atuação das operadoras, fato de extrema importância nesse momento de crise pelo qual passa país e setor de saúde.

(*) Maria da Gloria Faria é Advogada, com mestrado ‘lato sensu’ em Direito Empresarial pela Universidade Cândido Mendes; Certificação em Didática de Ensino Superior, IAG Master em Seguro pela PUC-RJ e especialização em Previdência pela UERJ. Presidente do Conselho da Associação Internacional de Direito de Seguros – AIDA Brasil (período 2016/2018), onde atualmente preside o Grupo Nacional de Trabalho - Novas Tecnologias.

Fonte: Revista Jurídica de Seguros, Número 5, Novembro de 2016, págs. 244 a 251.