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Poranduba • Informativo 06.2025

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O corretor representa o segurado?

É muito comum ouvir que o corretor de seguro “representa” o segurado diante da seguradora, da formação até a execução do contrato: o corretor “representaria” o segurado ao preencher a proposta de seguro sob suas ordens e remetê-la à seguradora na subscrição; ao participar das correspondências a respeito de um sinistro; e ao receber a negativa de cobertura.

Na visão dos que defendem que o corretor é representante, o parágrafo único do art. 41 da nova Lei de Contrato de Seguro (Lei 15.040/2024, que entrará em vigor em 11.12.2025) teria consagrado esse entendimento, ao prever que: “o corretor de seguro poderá representar o proponente na formação do contrato, na forma da lei.”

Essa interpretação do dispositivo, no entanto, subverte a intenção da norma, porque se esquece o trecho final do parágrafo: “na forma da lei”. O dispositivo tem por fim, justamente, esclarecer que a representação se dá “na forma da lei”, de modo que o poder de representação não pode ser extraído da própria função de corretor.

“Na forma da lei” significa na forma do Código Civil, que regula a representação nos arts. 115 a 120. O art. 120, que prevê a representação voluntária, remete à Parte Especial do CC – notadamente, às regras do mandato, usualmente instrumentalizado por uma procuração (art. 654), que deve ser dada em instrumento particular e conter uma série de requisitos, listados no art. 654, §1º.

Na prática, os corretores normalmente recebem uma carta de nomeação. Para que tenham poderes de representação, é necessário que esse documento contenha os elementos de uma procuração, de maneira clara e com poderes delimitados, na forma do art. 654, § 1°, CC (e.g., o corretor será representante apenas para a formação ou para toda a vida do contrato? Poderá o corretor contratar qualquer seguro em nome e à conta do segurado ou só um tipo específico? Ou, ainda, apenas o que for previamente autorizado?).

A ausência de poderes de representação não significa que o corretor esteja proibido de remeter a proposta do segurado, como prevê o art. 18 da Lei do Corretor de Seguro (Lei 4.594/1964). No entanto, ao remeter a proposta, bem como ao receber a correspondência da seguradora, o corretor não atua como representante, mas como mero intermediário – como bem se nota, por exemplo, do próprio art. 18, ao dizer que a proposta será feita por “intermédio” do corretor. O nome técnico-jurídico para essa figura é “núncio”, um instrumento comunicativo de quem remete a mensagem. Quase todas as atividades do corretor se limitam a essa atuação de via de transmissão de um ato ou decisão do próprio segurado.

Os poderes de representação (na qualidade de mandatário) só seriam necessários para atividades excepcionais que raramente são conferidas a um corretor: por exemplo, para que o corretor pudesse preencher o questionário sozinho e ou negociar contratos diretamente com a seguradora, sem interagir ou validar as decisões com o segurado; ou transacionar e receber indenizações em nome do segurado. Nesses casos excepcionais, o Código Civil já exigiria a outorga de poderes de representação bem delimitados e a Lei do Contrato do Seguro apenas confirma a regra geral.

Jurisprudência

• REsp 2.186.942 – SC, 3ª Turma. O STJ decidiu, em maio, que as associações de proteção veicular não eram “regulamentadas pela SUSEP e, portanto, não são seguradoras, carecendo da empresarialidade necessária aos contratos de seguro”. Reconheceu, porém, que os contratos celebrados por elas são pactuados para proteger seus associados de determinados riscos, garantindo-lhes cobertura, de modo que, para o consumidor, são equiparadas ao contrato de seguro. O julgado é interessante por colocar em evidência essa questão, que gerava grande problema prático – já que, de fato, essas entidades são percebidas pelo consumidor como se seguradoras fossem – e atualmente está disciplinada pela Lei Complementar 213/25, que as inclui no âmbito de supervisão da SUSEP. A Lcp 213/2025 já foi objeto da Poranduba 01.2025, 03.2025, e 04.2025.

• Tema 1.203 STJ. No âmbito das execuções fiscais de créditos não tributários, pairava dúvida sobre a possibilidade de suspensão da exigibilidade mediante o oferecimento de fiança bancária ou seguro garantia. Essa possibilidade, prevista no Código de Processo Civil (art. 835, § 2°), não encontra correspondente exato no Código Tributário Nacional, que prevê a suspensão apenas mediante depósito em dinheiro (art. 151). Em sede de recurso repetitivo, o STJ decidiu que se aplica a opção dada pelo CPC nas execuções fiscais de créditos não tributários, nos seguintes termos: “O oferecimento de fiança bancária ou de seguro garantia, desde que corresponda ao valor atualizado do débito, acrescido de 30% (trinta por cento), tem o efeito de suspender a exigibilidade do crédito não tributário, não podendo o credor rejeitá-lo, salvo se demonstrar insuficiência, defeito formal ou inidoneidade da garantia oferecida.”

• AREsp 2.560.515 – SC, 3ª Turma, e AgInt no AREsp 2.869.323 – RS, 4ª Turma. Em junho, duas decisões do STJ versaram sobre o mesmo tema: nelas, ao julgar correta a aplicação, pelo tribunal a quo, de exclusões de cobertura em seguro de vida em grupo, o STJ adotou o entendimento, já esposado em outras decisões, de que é ao estipulante que incumbe o dever de informar ao segurado sobre as condições contratuais, inclusive cláusulas limitativas e restritivas de direito que constem do contrato de seguro. Os acórdãos exemplificam a aplicação de posição consolidada pelo STJ no Tema 1112, a propósito do seguro coletivo. A figura do estipulante no seguro coletivo é regulada pela Resolução CNSP 434/2021, que inclui entre suas obrigações a de prestar informações aos segurados (art. 8°, III).

Mercado

• Como divulgado no fim de 2024, o IRB(Re), por meio de sua subsidiária Andrina Sociedade Seguradora de Propósito Específico (SSPE), emitiu a primeira Letra de Risco de Seguro (LRS) do mercado brasileiro, no valor de R$ 33,7 milhões, que envolve a securitização de riscos de seguro garantia. A figura da LRS foi autorizada no Brasil em 2022. As LRS foram objeto de discussão no Risco em Prosa, T02 EP05, podcast do IBDS disponível no Spotify.

Fonte: Ernesto Tzirulnik Advocacia, em 30.06.2025