Valeria Schmitke |
Há muitos anos li uma reportagem sobre o Grupo Pão de Açúcar, na época em que o Sr. Abílio Diniz era o presidente do Grupo Empresarial. A reportagem dizia que todos os diretores eram convocados a participar de um programa de exercícios físicos, que começava às 6 horas manhã e incluía atividades aos finais de semana. É difícil exprimir o quanto fiquei chocada com esse fato e quanto desejei não ter de trabalhar em empresa com programa semelhante, eu que às seis horas da manhã não sou ninguém e não sou lá muito de exercícios físicos, embora me considere uma profissional acima da média.
Depois veio a moda do engajamento em obras sociais. Várias empresas “incentivavam fortemente” seus empregados a se engajarem em obras sociais e de caridade e a dedicarem parte de seu tempo a obras meritórias. Ainda hoje é assim. Mesmo os currículos, para os quais já não se exige mais a foto ou a indicação de estado civil, ainda trazem a indicação de atividades extras ou atividades sociais voluntárias.
Exercícios físicos e obras sociais não são ruins em si, pelo contrário. O problema está em vincular essas atividades ao exercício profissional. Todos os que já foram ou são empregados sabem que a mensagem implícita é de que sua avaliação e por consequência seu bônus e suas chances de promoção serão melhores se você se engajar e entrar na onda.
Ao mesmo tempo fala-se tanto em diversidade, em que as pessoas devem ser avaliadas somente por suas realizações profissionais, sem que se leve em conta sua origem étnica, orientação sexual, religião, idade e sexo.
Lanço aqui então uma campanha pelo Profissionalismo Radical. Segundo os princípios dessa campanha, cada um deverá ser avaliado no âmbito profissional única e exclusivamente por sua honestidade, formação, experiência, trabalho em equipe, inteligência emocional e entregas profissionais. Fatores externos não podem e não deverão ser levados em conta. Se o profissional não quiser fazer atividades voluntárias, se o máximo de exercício físico que ele fizer seja levantar do sofá nos finais de semana, se ao invés de participar de Happy Hours e churrascos ele quiser ficar em casa assistindo séries, nada disso será considerado desabonador, não haverá olhares atravessados. Cada um será avaliado pelo que faz no trabalho e somente por isso.
E fora do seu horário de trabalho você poderá fazer Ioga, Pilates, Musculação, Cross Fit, corrida, dança de salão ou não fazer nada disso. Poderá ser hétero, gay, drag queen, sair numa escola de samba ou cuidar de sua família. Poderá cozinhar comidas saudáveis ou comer lanche e batatas fritas todas as noites. Poderá auxiliar uma ONG que acolhe refugiados, fazer sopa para entregar a moradores de rua ou guardar todo seu tempo e dinheiro para si. Poderá fazer curso de Cabala, Semiótica, História da Arte, Cinema ou qualquer outra coisa que lhe dê na telha ou não fazer curso nenhum. Poderá dormir o final de semana todo ou encontrar seus amigos, sejam eles do escritório ou não, porque o que vai realmente importar é o que você faz durante o horário de trabalho, não o que faz fora dele.
Não seria ótimo se fosse assim?
Fonte: Revista Opinião.Seg nº 14 - Julho de 2017.