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Novo ano, novas regras: novos contornos nos processos autorização regulatória

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Mudanças impactam operações societárias em entidades reguladas pela Susep

Em 03 de janeiro de 2022, entrou em vigor a resolução do Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) nº 422/2021, substituindo a Resolução CNSP nº 330/2015 . A nova norma estabelece novas regras aplicáveis às autorizações regulatórias de diversas operações societárias envolvendo sociedades seguradoras, sociedades de capitalização, resseguradores locais e entidades de previdência complementar aberta (supervisionadas), resseguradores admitidos e eventuais (resseguradores estrangeiros) e corretoras de resseguro (corretoras de resseguro).

A publicação da Resolução CNSP nº 422/2021 vem na esteira da Consulta Pública nº 30/2021, publicada pelo Conselho Diretor da Superintendência de Seguros Privados (Susep) em 16 de setembro de 2021, com o fim de captar sugestões do mercado em relação às regras propostas pelo regulador.

Naturalmente, a nova norma também se insere em um contexto de revisão, modernização e flexibilização das regras do mercado de seguros, resseguros, previdência complementar aberta e capitalização. Além disso, a resolução traz importantes propostas para atualizar e simplificar o processo de obtenção das autorizações regulatórias necessárias ao pleno funcionamento de tal mercado, em linha com o disposto no Decreto n° 10.139/2019 e na Lei n° 13.874/2019, que dispõem, respectivamente, sobre a revisão de atos infralegais e a regulamentação dos direitos de liberdade econômica.

Confira as novidades presentes na Resolução CNSP nº 422/2021:

Instrução processual e autorizações regulatórias

• Apresentação técnica

Antes de se protocolar qualquer pedido de aprovação prévia para autorização de funcionamento ou transferência de controle societário, passará a ser necessário fazer uma apresentação técnica sobre a operação societária pretendida por determinada supervisionada (as sociedades seguradoras, as sociedades de capitalização, as entidades abertas de previdência complementar e os resseguradores locais), a ser conduzida por uma pessoa que deverá constar expressamente como tal na respectiva petição submetida à Susep.

• Redução do prazo para implementação de operação societária após a concessão da aprovação prévia

A Resolução CNSP nº 422/2021 ainda reduz o prazo (de 180 dias para 90 dias) para implementação do fechamento das operações societárias que obtenham aprovação prévia da Susep, introduzindo mais um desafio para as supervisionadas, dado que a não implementação do fechamento em tal prazo poderia obrigar a reapresentação de todo o pedido de aprovação prévia. Vale notar que a nova resolução permite expressamente que tal prazo seja prorrogado, a exclusivo critério da Susep, mediante solicitação da supervisionada nesse sentido (o que não era previsto pela minuta de resolução submetida à consulta pública). 

• Procedimento de comunicação

Ainda, atendendo a um antigo pleito do mercado supervisionado, a Resolução CNSP nº 422/2021 (replicando regra que já constava da Consulta Pública n° 30/2021) deixou claro que a transferência de controle societário de corretoras de resseguro só precisa ser comunicada à Susep. Tal procedimento simplificado de comunicação também será aplicável à alteração da designação de funções dos diretores estatutários de supervisionadas.

• Criação, encerramento e alteração de endereço de filiais

Na medida em que a Susep ainda não alterou as regras previstas nas Circulares Susep nº 526/2016nº 527/2016nº 528/2016 e nº 529/2016, há controvérsia acerca do rito a ser observado junto à Susep em relação a determinados assuntos. Criação, encerramento e alteração de endereço de filiais é um deles, pois a Resolução CNSP nº 422/2021 revoga a Resolução CNSP nº 19/1978 e Resolução CNSP nº 17/1992, que determinavam a obrigação de se homologar este tipo de deliberação por parte das supervisionadas. Contudo, a Circular Susep nº 529/2016, que continua em vigor, determina que esse tipo de deliberação ainda está sujeito ao rito de homologação por parte da Susep. Logo, é importante que essa divergência regulatória seja esclarecida com a brevidade que o tema merece, pois isto faz parte do dia a dia de toda supervisionada.

Regras de governança

A Resolução CNSP nº 422/2021 também introduz mudanças importantes no que se refere à estrutura de controle das supervisionadas, à definição de seu objeto social e à eleição de seus administradores.

• Estrutura de controle direto

Provavelmente a alteração mais relevante trazida pelo novo normativo diz respeito ao rol de pessoas que podem controlar diretamente as supervisionadas. A resolução deixa claro que qualquer pessoa jurídica ou fundo de investimento em participação (FIP) que tenha como parte de seu objeto social a participação em supervisionadas pode controlar ou integrar seu bloco de controle (quer tal Supervisionada tenha sido constituída antes ou após o início da vigência da nova norma, como bem esclarecido pelo normativo).

Logo, pela resolução, não haverá mais qualquer exigência de que o controlador direto seja uma holding brasileira com objeto social exclusivo, tampouco um fundo de investimento em participação que tenha por objeto social exclusivo a participação em sociedades autorizadas a funcionar pela Susep e cujas cotas sejam destinadas exclusivamente a Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC) e a sociedades autorizadas a funcionar pela Susep.

Contudo, as demais atividades que tais controladores exercerem e constarem de seu objeto social deverão ter alguma correlação com o mercado de seguros e resseguros.

• Constituição de corretoras de resseguro

A Resolução CNSP nº 422/2021 ainda traz uma limitação à constituição de corretoras de resseguro, as quais, para fins de obtenção de autorização para funcionamento, deverão necessariamente ser organizadas sob a forma de sociedade por ações ou de sociedade empresarial limitada. O novo normativo, no entanto, não esclarece se as corretoras de resseguro já existentes e constituídas como sociedades limitadas unipessoais ou empresas individuais de responsabilidade limitada (até então admitidas pela Resolução CNSP nº 330/2015) deverão se adaptar à nova regra. 

• Controle difuso x controlador definido

Ainda na seara de governança, a nova resolução estabelece uma redação mais clara acerca da possibilidade de que supervisionadas não tenham um controlador/grupo de controle definido. Um ponto importante trazido pela norma é que a Susep não poderá exigir a celebração de acordo de acionistas contemplando a expressa definição de grupo de controle de seguradoras, resseguradores, Entidades Abertas de Previdência Complementar (EAPCs) ou Corretoras de Resseguro cuja estrutura de controle seja pulverizada.

Um ponto de controvérsia parcialmente endereçado pela Resolução CNSP nº 422/2021 (e originalmente introduzido pela Consulta Pública nº 30/2021) diz respeito às supervisionadas com controle difuso que, a princípio, não poderão distribuir dividendos nos dois primeiros exercícios sociais "consecutivos ao início de sua operação" (ao invés dos 5 anos originalmente previstos na minuta submetida ao mercado), ressalvados os dividendos obrigatórios (equivalentes a 25% do lucro líquido de dada sociedade), cuja distribuição continuará a ser realizada nos termos da legislação societária aplicável.

A nova resolução ainda não deixa claro se esses dispositivos (que precisarão constar expressamente do estatuto social de tais supervisionadas) se aplicarão apenas para companhias que vierem a ser constituídas com essa estrutura de controle pulverizado ou a toda e qualquer companhia que passar a ter um controle difuso quando do advento dessa situação. A depender da aplicabilidade dessa regra, operações de supervisionadas no mercado de capitais podem ser menos atrativas.

Além disso, uma inovação introduzida pela resolução é a possibilidade de que o requisito de capacidade econômico-financeira compatível com o porte, natureza e objetivo da operação pretendida possa ser atendido pela própria supervisionada. Neste caso, o patrimônio líquido ajustado deverá ser igual ou superior ao apurado em seu plano de negócios nos primeiros 12 meses da projeção constante de tal plano, correspondendo a duas vezes o capital mínimo requerido para seguradoras, resseguradores e EAPCs (art. 17, parágrafo único, II).

• Objeto social exclusivo de supervisionadas

Com relação à flexibilização do objeto social das supervisionadas, a Resolução CNSP nº 422/2021 permite o exercício de atividades de suporte ao seu funcionamento e prestação de serviços técnicos associados a operações de resseguro e retrocessão. Entretanto, para que possam exercer tais atividades, as supervisionadas deverão tê-las expressamente descritas em seu objeto social, que precisa ser homologado pela Susep.

• Nomeação e eleição para cargos estatutários

Mais uma inovação trazida pela Resolução CNSP nº 422/2021 diz respeito à criação de uma restrição para que, no máximo, 35% dos cargos estatutários/contratuais de supervisionadas sejam ocupados por pessoas residentes no exterior. Isto impacta a composição de órgãos estatutários que contam com membros residentes no exterior, em especial, conselhos de administração, conforme facultado pela Lei nº 6.404/1976. Outra questão correlata relevante é que o novo normativo não esclarece se a composição dos órgãos estatutários/contratuais das supervisionadas que não estiverem aderentes a essa regra na data inicial de vigência da Resolução CNSP nº 422/2021 deverá ser adaptada.

Essa inovação está alinhada com a recente mudança da Lei nº 6.404/1976 (conforme alterada pela Lei nº 14.195/2021, que entrou em vigor em 26 de agosto de 2021), que permitiu que membros da diretoria de sociedades por ações possam ser residentes no exterior.

A nova resolução cria mais uma potencial controvérsia, ao estabelecer que a Susep poderá exigir certificações técnicas adicionais para o exercício de certos cargos estatutários e/ou contratuais em supervisionadas. A norma ainda não define quais cargos poderão estar sujeitos a tal regra, possivelmente porque isto será detalhado na circular que vier a regulamentar esse tema específico.

Resseguradores estrangeiros

• Identificação dos resseguradores estrangeiros e seus impactos

Em linha com a exposição de motivos da norma, para reduzir o custo regulatório e com objetivo de estimular a competitividade e o desenvolvimento do setor, a Resolução CNSP nº 422/2021 equiparou os requisitos exigidos dos resseguradores admitidos e eventuais, quando permitido pela Lei Complementar nº 126, de 15 de janeiro de 2007.

O novo normativo unificou alguns dos requisitos para cadastro dos resseguradores estrangeiros no Brasil, que passam a ser aqueles exigidos, atualmente, apenas dos resseguradores eventuais, por exemplo, o patrimônio líquido não inferior a US$ 150.000.000,00 (ao invés dos US$ 100.000.000,00 aplicados anteriormente apenas aos resseguradores admitidos) e adoção dos mesmos níveis mínimos de classificação de solvência, emitida por agência classificadora de risco.

Vale destacar que um ponto controverso da norma submetida à consulta pública acabou omitido da Resolução CNSP nº 422/2021: a proposta de estender aos resseguradores admitidos a vedação para que empresas sediadas em paraísos fiscais sejam cadastradas no Brasil, assim considerados países ou dependências que não tributam a renda ou que a tributam à alíquota inferior a 20% ou, ainda, cuja legislação interna oponha sigilo relativo à composição societária de pessoas jurídicas ou à sua titularidade. Pela redação adotada pela Resolução CNSP nº 422/2021, mantém-se a regra que existia na regulamentação anterior, de modo que a vedação acima indicada continuará a ser aplicável somente aos resseguradores eventuais.

• Terceirização de escritórios de representação e extinção do representante-adjunto

A nova resolução ainda simplifica as regras que regem o funcionamento dos escritórios de representação de resseguradores admitidos, excluindo a figura do representante-adjunto e autorizando que a representação dos resseguradores admitidos seja exercida por pessoas jurídicas terceiras contratadas para esse fim.

• Atualização do cadastro de resseguradores estrangeiros

Por fim, o texto da Resolução CNSP nº 422/2021 trouxe um importante esclarecimento em relação à atualização do cadastro de resseguradores estrangeiros, os quais (salvo pelas renovações periódicas exigidas pela legislação e regulamentação aplicáveis) só precisarão comunicar à Susep alterações de suas informações cadastrais caso tais alterações ensejem descumprimento dos requisitos mínimos para cadastramento de ressegurador estrangeiro. Pela redação constante da Consulta Pública nº 30/2021 e da Resolução CNSP nº 330/2015, tais atualizações poderiam ser exigidas pela Susep sempre que ocorridas quaisquer alterações cadastrais.

• Avanços e necessidade de atualizações

Em linha com o espírito já refletido na Consulta Pública nº 30/2021, as mudanças introduzidas pela Resolução CNSP nº 422/2021 introduzem importantes avanços às regras que regem os procedimentos de autorização regulatória e a governança corporativa de supervisionadas, eliminando entraves burocráticos e incentivando o ingresso de novos players no mercado de seguro, resseguro, previdência privada e capitalização, seja por meio da constituição de novas seguradoras ou via aquisições.

É importante que a atualização das Circulares SUSEP nº 526/2016, 527/2016, 528/2016 e 529/2016 seja feita com a devida brevidade, uma vez que tais normativos não dialogam com as regras novas introduzidas pela Resolução CNSP nº 422/2021, trazendo insegurança jurídica para o setor.

Fonte: Mattos Filho, em 26.01.2022