Trâmites legais e jurídicos na defesa das vítimas são debatidos
na mesa 3 do III Fórum do Ato Médico
Mesa de debates analisa os trâmites legais e jurídicos na defesa das vítimas
Dando sequência às atividades do primeiro dia do III Fórum do Ato Médico, realizado em 6 e 7 de maio, no auditório do CFM, a mesa três teve como título a frase “Do crime à justiça: trâmites legais e jurídicos na defesa das vítimas – caminhos possíveis”. O moderador dos debates foi o conselheiro federal do estado do Amapá, Eduardo Monteiro de Jesus, e a secretária de mesa da conselheira federal suplente do Paraná, Viviana de Mello Guzzo Lemke.
A primeira palestrante da mesa, a promotora do estado do Amapá Fábia Nilci Santana de Souza, abordou a atuação do Ministério Público no combate ao exercício ilegal da medicina. A explicação destacou a missão constitucional do Ministério Público e apresentou o direito à saúde como um direito individual indisponível e coletivo, que deve ser garantido por políticas sociais e econômicas. “O Ministério Público desempenha papel fundamental na defesa do direito à saúde, tanto sob a perspectiva de direito individual indisponível, quanto como direito social de natureza coletiva e fundamental”, explica.
De acordo com a promotora, o Ministério Público atua através da fiscalização dos serviços, da promoção e fiscalização de políticas públicas e da realização de ações preventivas e educativas, que se materializam em campanhas realizadas em parceria com os conselhos de classe. Entre os mecanismos de atuação do MP estão os extrajudiciais, a exemplo dos procedimentos administrativos, dos inquéritos civis, das recomendações e termos de ajuste e da promoção, privativamente, de ação penal pública (na forma da lei); e os mecanismos judiciais, como a ação civil pública por dano coletivo, a ação penal com base no Código Penal e os pedidos de interdição.
Segundo a promotora Fábia Nilci Santana, o exercício ilegal da medicina é um risco à saúde pública porque, além de colocar vidas em risco e causar danos à saúde física e mental dos pacientes (muitos deles, irreversíveis), sobrecarrega o SUS com o atendimento às complicações decorrentes e gera desinformação, com notícias falsas que geram uma desvalorização a medicina. De acordo com o servidor público, entre 2012 e 2023, o MP recebeu 9.566 denúncias ligadas ao exercício ilegal da medicina, a maioria delas relacionadas à realização de tratamentos invasivos por não-médicos, principalmente na área da dermatologia estética.
A segunda apresentação da mesa ficou a cargo do desembargador do TJDFT, Diaulas Ribeiro. Tratando do papel do judiciário na defesa da população e das vítimas do exercício ilegal da medicina, o jurista fez um apanhado histórico da antiga divisão entre as atividades de médico e de deslocamento (que remonta a concílios e confrarias da Igreja Católica, ainda na Idade Média) e defendeu a importância dos atos médicos, que constitui um passo importante para a promoção da saúde e da segurança dos pacientes. "As iniciativas de sepultar o ato médico são parte de uma política calculada. Nós voltamos à Idade Média ou, antes dela, ao charlatanismo. O charlatanismo na era digital, onde as barreiras do que é ciência e do que a superstição tornam-se fluidas à custa da credulidade pública viabilizada em práticas muito grandes pelas chamadas redes sociais", destaca.
Em sua fala, o desembargador pediu também que haja uma proteção às práticas de exercício ilegal da medicina. "É inarredável que o exercício ilegal da medicina por pessoas sem nenhum tratamento seja classificado como crime doloroso. Quem mata o exercício ilegal da medicina não pode ter uma pena simbólica", concluiu.
Centralidade da medicina na saúde é tema de conferência conduzida
pelo médico desembargador do TJ-PR
O médico e desembargador José Américo Carvalho proferiu uma palestra de abertura sobre as
agressões às prerrogativas médicas e à Lei do Ato Médico
Após um histórico de evolução da medicina, que se constituiu inicialmente como um ofício e depois como uma profissão regulamentada, o desembargador do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) José Américo Penteado de Carvalho, que também é médico, afirmou que a medicina “se tornou atividade central de saúde”. Ele, que fez a conferência de abertura do III Fórum do Ato Médico, realizado pelo CFM nos dias 6 e 7 de maio, ressaltou que por conta da sua centralidade, a medicina é fértil para “alguns abusos às prerrogativas do médico no seu exercício profissional”.
Para o magistrado, os avanços da medicina, somados às facilidades da modernidade e da tecnologia, abrem oportunidades para a invasão do ato médico, propiciando prejuízos individuais e coletivos, pois a falta de conhecimento e preparação de parte do prestador de serviço leva o paciente a procurar um médico habilitado para tratar as intercorrências negativas ou complicações, sobrecarregando o sistema de saúde. “Tal situação é um criador de problemas, que gera custos evitáveis e desgastes”, argumentou.
“O ato médico não é delegável, nem engenhoso e sua invasão por outras profissões deve ser combatida”, defendeu. O desembargador apontou dois caminhos que devem ser trilhados na defesa das prerrogativas médicas: o esclarecimento da sociedade “que atos de diagnóstico e tratamento (inclusive na área de medicina estética e plástica) são e devem ser praticados por médicos” e o esclarecimento do sistema de segurança pública e de Justiça sobre os perigos avisados de invasão do médico.
Em relação ao sistema jurídico, o desembargador explicou que hoje a invasão do ato médico é julgada, principalmente, a partir do que diz o artigo 282 do Código Penal, que tipifica o exercício ilegal da medicina. Essa tipificação, no entanto, não é suficiente para coibir o avanço sobre as prerrogativas médicas, pois as penas “são pouco significativas para a reprovação concreta”.
"A persistência de agir dos não-médicos, especialmente para aqueles que visam uma contraprestação financeira interessante pela invasão do ato médico, sugere que algumas cominações legais não são concretamente dissuasivas. Ou seja, não dão em nada", argumentou.
Diante da situação atual, o desembargador defendeu que os conselhos de medicina apoiados pelos setores sociais na tarefa de explicar à sociedade e ao judiciário que uma invasão do ato médico é um fator prejudicial à saúde individual e coletiva. Para José Américo Penteado, caso as prerrogativas médicas não sejam mantidas, “perderá à sociedade brasileira um valor essencial ao ser humano: a defesa da saúde como direito primordial de estabilidade social”, argumentou.
A conferência de abertura foi secretariada pela conselheiro federal suplente por Minas Gerais, Cibele Carvalho, e presidida pelo conselheiro federal pelo Paraná, Alcindo Cerci Neto.
Em discussão, o combate ao exercício ilegal da medicina
e a proteção à integridade física da população
Primeira mesa do fórum tratou do combate ao exercício ilegal da medicina e
à proteção à integridade física da população
O combate ao exercício ilegal da medicina e a proteção à integridade física da população foram o tema da primeira mesa do III Fórum do Ato Médico, realizado na manhã desta terça-feira (6) no auditório do Conselho Federal de Medicina. A mesa teve como moderadora a conselheira federal do Piauí, Yáscara Pinheiro Lages Pinto, e como secretário o conselheiro federal do estado de Sergipe, José Elêrton Secioso de Aboim. Os palestrantes foram a promotora de justiça Elaine Rita Auerbach, o delegado da polícia civil do Distrito Federal Thiago Frederico de Souza Costa, e a representante da vigilância sanitária do Distrito Federal, Márcia Cristina Olivé Roseno.
Durante as palestras, o avanço sobre as prerrogativas dos médicos foi abordado sob diferentes aspectos. A promotora de justiça, Elaine Rita Auerbach, falou sobre quando o exercício ilegal da medicina resulta em outros crimes, e como a violação da lei do médico costuma atingir, também, o direito do consumidor. Em sua explicação, um representante do Ministério Público destacou detalhes da Operação Venefica, deflagrada em agosto de 2023 em Joinville, contra clínicas de estética que, com base em propaganda enganosa em redes sociais, prometiam o corpo dos sonhos.
Segundo a promotora, foi investigada a prática de crimes contra a saúde pública e a organização criminosa. A operação contornou a atuação de mais de 200 policiais e investigados em prisões em flagrante e ações preventivas contra médicos, farmacêuticos, nutricionistas, além de pessoas que atuaram sem formação na área de saúde. Durante a palestra, Elaine Auerbach abordou a dificuldade do Ministério Público em obter denúncias de vítimas e destacou a necessidade de as diferentes instituições atuarem de forma integrada para inibir o exercício ilegal da medicina.
Complexidade – Tratando da responsabilidade na apuração de crimes contra a saúde, o delegado Thiago Costa também citou a dificuldade na obtenção de denúncias e na apuração de casos de negligência médica, muitas vezes marcados por grande complexidade. Representando a Secretaria de Estado de Segurança Pública do Distrito Federal, o delegado também ressaltou o aspecto social da saúde pública. "A saúde e a vida são valores constitucionalmente assegurados. O que estamos tratando hoje aqui não é uma questão de mercado. A saúde pública transcende a saúde individual. A gente tem que trabalhar a integralidade da segurança pública, o que significa que ela é responsabilidade de todos, transcende a polícia", destaca.
A terceira palestrante da mesa, representante da vigilância sanitária do Distrito Federal, a enfermeira Márcia Cristina Olivé Roseno, abordou as práticas da Vigilância Sanitária do Distrito Federal para a proteção à saúde. Além de apresentar o histórico e o marco regulatório do Programa Nacional de Segurança do Paciente (PNPS), criado em 2013 pela Portaria nº 529 do Ministério da Saúde, a explicação abordou o Plano Integrado para a Gestão Sanitária da Segurança do Paciente em Serviços de Saúde (2021-2025) e o Programa Nacional de Prevenção e Controle de Infecções Relacionadas à Assistência de Saúde (PNPCIRAS), 2021-2025, ambos da Anvisa.
“As pessoas geralmente se associam à Anvisa apenas à fiscalização, mas a função dela vai além”, explica. O Programa Distrital de Vigilância Sanitária em Segurança do Paciente e Controle de IRAS (2023-2025), por exemplo, além de atuar na fiscalização dos serviços de saúde, também realiza o monitoramento dos sistemas de notificação, promove ações de educação sanitária e estabelece normas e diretrizes complementares em segurança do paciente, entre outras.
Fonte: Portal CFM, em 07.05.2025.