Criminalização da Corrupção Privada deve ser acompanhada de sanções financeiras, opinam debatedores
A questão da corrupção privada precisa ser vista de forma sistêmica e considerar toda a cadeia de valor
O PL 221/2015: Criminalização da Corrupção Privada foi destaque do Seminário Diálogos Éticos, no dia 10 de dezembro, em Brasília. O diretor da Unidade Especializada em Saúde do Tribunal de Contas da União (TCU), Rafael Carneiro Di Bello, explicou que o PL tem como objetivo melhorar o ambiente de negócios e garantir a confiança do setor e do cidadão. “Seja na saúde pública ou privada, a corrupção não apenas mata, mas também rouba valor do paciente. Há ainda o desperdício de recursos e a má gestão, problemas que muitas vezes coexistem em ambientes de falta de ética”, complementou. Para Di Bello, “para que essas medidas sejam eficazes, é crucial que as sanções financeiras sejam proporcionais e desincentivem práticas ilícitas, sem inviabilizar a operação de empresas”.
Essa também é a opinião do presidente da Associação Brasileira de Auditores em Saúde (AUDIF). O agente causador do processo, que são as grandes corporações, não são tocados. Deveria ser obrigatório um contrato entre o médico e quem está pagando. E declarar nos respectivos impostos. Aí começaria a complicar, porque o grande, quando começa a perder, revê o processo”, defendeu Alexander Saliba.
O diretor executivo da Associação Brasileira de Importadores e Distribuidores de Produtos para Saúde (ABRAIDI), Davi Uemoto, ressaltou que a questão da corrupção privada precisa ser vista de forma sistêmica. “Não devemos focar apenas na interação entre o profissional de saúde e a indústria, mas também considerar toda a cadeia de valor, que envolve fornecedores de dispositivos médicos, hospitais, operadoras de planos de saúde e outros. O Instituto Ética Saúde, por exemplo, fez um mapeamento de riscos ao longo dessa cadeia e identificou regras comerciais totalmente inadequadas, que também devem ser abordadas”, concluiu.
Especialistas debatem os desafios e as adaptações do Sunshine Act no Brasil
Inspirado nos Estados Unidos, o Projeto de Lei propõe a divulgação obrigatória das relações financeiras entre profissionais de saúde, ONGs e empresas reguladas pelo setor
É unânime a opinião de que o Sunshine Act no Brasil é um passo essencial para fortalecer a confiança no sistema público de saúde e mitigar os impactos da corrupção, fraudes e conflitos de interesse no setor. O tema foi destaque do Seminário Diálogos Éticos, no dia 10 de dezembro, em Brasília.
A coordenadora da FGVEthics, Ligia Maura Costa, contextualizou o Sunshine Act nos EUA, destacou a importância de uma agência fiscalizadora e elencou os desafios: “Complexidade, resistências culturais e políticas, mudança comportamental e investimentos em tecnologia”. E alertou para a necessidade de fiscalização e punição. “Nos Estados Unidos, as penalidades são severas”.
A diretora de Gestão de Riscos, Auditoria e Compliance do Hospital Albert Einstein, Viviane Souza Miranda, que integra a diretoria do Instituto Ética Saúde, acredita em uma mudança cultural, a partir da experiência de 10 anos de um projeto similar implementado no hospital. “As pessoas estão cada vez mais preocupadas em refletir sobre a qualidade de suas decisões: ‘Estou tomando a melhor decisão? Minha escolha está embasada em critérios técnicos e isenta de influências externas?’. Esse questionamento é um avanço importante. Além disso, quando surgem dúvidas, é comum que as pessoas busquem orientação, o que representa uma oportunidade valiosa para reforçar a educação e promover práticas mais éticas e responsáveis”, relatou.
Quem será o órgão fiscalizador do Sunshine Act brasileiro é uma preocupação. O vice-presidente da Região Centro-Oeste da Associação Médica Brasileira (AMB), Etelvino Souza Trindade, lembrou que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, cotada para fazer esse papel, enfrenta limitações. “Para que a Anvisa assumisse esse papel, seria necessário criar um corpo específico para tratar de compliance e ética. No entanto, dado o atual contexto, essa tarefa poderia ser excessivamente pesada para a agência, que já enfrenta dificuldades estruturais e operacionais”.
O conselheiro do Conselho Federal de Medicina (CFM), Raphael Câmara, relator da Resolução 2386 – que normatiza procedimentos e regras em relação a vínculos de médico com indústrias farmacêuticas, de insumos da área da saúde e equipamentos médicos -, defendeu a lei. “Nossa resolução é o início. Agora, não há dúvida, do ponto de vista jurídico, de que não está nem perto do poder de uma lei. Portanto, defendemos, sim, que ela exista”.
O consultor Jurídico do Instituto Ética Saúde, Giovani Saavedra, destacou um aspecto jurídico delicado: a correlação entre transparência e corrupção no setor privado. “Obrigar a divulgação dessas informações enquanto tratamos tais relações como crime poderia ser interpretado como obrigar pessoas a produzirem prova contra si mesmas, o que é inconstitucional”. E questionou: “Precisamos refletir sobre o objetivo dessa regulamentação. Devemos seguir modelos internacionais, como o americano, focando na transparência e no uso dessas informações para tomar medidas administrativas e minimizar conflitos de interesse? Ou queremos introduzir no Brasil um novo conceito jurídico, o de corrupção privada, exigindo debates aprofundados para evitar conflitos com os direitos constitucionais?Avançar exige um equilíbrio cuidadoso entre promover transparência e respeitar as garantias legais, para que possamos construir um sistema robusto e alinhado às melhores práticas internacionais”, finalizou o advogado.
Projetos de Lei para coibir a corrupção na saúde são debatidos em Seminário promovido pelo IES e FPMS
Participaram representantes do legislativo, da Controladoria Geral da União (CGU), do Tribunal de Contas da União (TCU), da academia, de hospitais, da indústria e auditores
O Instituto Ética Saúde (IES) e pela Frente Parlamentar Mista da Saúde (FPMS) promoveram, no dia 10 de dezembro, no Auditório Interlegis, no Senado, em Brasília, o Seminário Diálogos Éticos. Três Projetos de Lei foram abordados: o PL nº 2899/2024 – Maio: Mês da Ética na Saúde (que teve apoio do IES); o PL nº 221/2025 – Criminalização da Corrupção Privada no Setor da Saúde; e o "Sunshine Act" Brasileiro – Transparência nas Relações Financeiras.
Na abertura, o diretor executivo do IES enfatizou que o Instituto trabalha para fortalecer a autorregulação privada e o diálogo técnico entre as partes, como base para uma regulação eficaz, alinhada às diretrizes da OCDE. “Nossa missão é clara: trabalhamos para o paciente, sendo todos nós — médicos, enfermeiros e demais profissionais — responsáveis por preservar e prolongar vidas. Discutir temas como sustentabilidade, ética e integridade é fundamental, pois a corrupção, as fraudes e as irregularidades têm impactos diretos, ceifando vidas”, disse Filipe Venturini Signorelli.
O deputado federal e presidente da Frente Parlamentar Mista da Saúde (FPMS), Dr. Zacharias Calil, destacou que a saúde, sendo um setor estratégico, é alvo frequente de corrupção. Movimentos anticorrupção, uma imprensa séria e grupos independentes desempenham um papel crucial ao fiscalizar, denunciar e pressionar por transparência e responsabilização. “Destaco o Projeto de Lei nº 2899/2024, apresentado na Câmara dos Deputados, com o apoio do Instituto Ética Saúde, que institui o mês de maio como um período anual de conscientização sobre práticas éticas no segmento. Essa iniciativa busca resultados progressivos e sustentáveis para melhorar o sistema de saúde”, disse o parlamentar.
Representando a Secretaria de Integridade Privada da CGU, Marcelo Pontes explicou que a Secretaria tem a missão de aplicação da Lei Anticorrupção, por determinação do Congresso Nacional. “Acredito que o Brasil caminhará muito bem na medida em que avance na regulamentação de estabelecer regras também de probidade nas relações privadas. A gente espera que profissionais da área de saúde ou gestores hospitalares tomem decisões que sejam unicamente voltadas para o bem-estar. E temos que ter regras de transparência. Quando conseguimos jogar luz sobre situações que podem gerar dúvidas, reduzimos a margem para práticas que não são adequadas”.
A importância de unir forças entre diferentes áreas para lidar com questões éticas foi evidenciada pelo secretário executivo da Frente Parlamentar Mista de Fiscalização, Integridade e Transparência (FIT), Renato Capanema. “A FIT e a Frente
Parlamentar Mista da Saúde trabalham juntas nos assuntos atinentes à transparência e à integridade na área da saúde. Nós iniciamos uma discussão com os integrantes sobre uma proposta de regulação. Existem outros projetos em trâmite”, disse.
O secretário-geral do Conselho Federal de Farmácia (CFF), Gustavo Pires, que também representou o Instituto Cuida Brasil, lembrou que as compras públicas no setor de saúde envolvem necessariamente o setor privado, que fornece os produtos e serviços por meio de licitações. “Para tornar esses processos mais eficientes e transparentes, é essencial que todos os envolvidos estejam alinhados, pois o principal beneficiário é a população”.
No final do painel, o diretor de Relações Institucionais do IES, Carlos Eduardo Gouvêa, entregou o novo Marco de Consenso para a Colaboração Ética Multissetorial na Área de Saúde – que acaba de ser atualizado com dois itens relacionados a Ética dos Algoritmos – para o deputado federal Dr. Zacharias Calil.
Instituto Ética Saúde recebe homenagem no Congresso Nacional, no Dia de Combate à Corrupção
“Para nós, o impossível não existe. Nossa missão é garantir acesso digno e ético aos pacientes”, afirmou Carlos Eduardo Gouvêa, no plenário da Câmara dos Deputados
A Frente Parlamentar Mista de Fiscalização, Integridade e Transparência (FIT) reconheceu e homenageou o Instituto Ética Saúde por ter contribuído de forma significativa para o combate a corrupção do Brasil. A sessão solene – convocada pelas deputadas federais Adriana Ventura (NOVO-SP), Bia Kicis (PL-DF), Chris Tonietto (PL-RJ) – foi em virtude do Dia de Combate a Corrupção, no dia 10 de dezembro, em Brasília.
O diretor de Relações Institucionais do IES, Carlos Eduardo Gouvêa, falou no plenário da Câmara dos Deputados e destacou que o Instituto reuniu todo o ecossistema da saúde em torno de um objetivo comum: promover a ética, a educação e uma transformação cultural profunda. “Talvez não consigamos corrigir todos os problemas de nossa geração, mas temos a responsabilidade de criar um futuro melhor para nossos filhos e netos”.
Gouvêa explicou que um consenso ético foi estabelecido e reúne representantes de indústrias, distribuidores, sociedades médicas, operadoras e pacientes, com um código mínimo de conduta que serve de referência para todos. “Este Marco de Consenso foi atualizado recentemente com a ética aplicada aos algoritmos da saúde. Um trabalho reconhecido pelo Papa Francisco, que recebeu o documento em novembro, reforçando a relevância global dessa pauta. Para nós, o impossível não existe. Nossa missão é garantir acesso digno e ético aos pacientes”, finalizou.
Fonte: Instituto Ética Saúde, em 13.12.2024.