ANBIMA Summit: diversidade pede gestão de pessoas, cultura pluralista e investimentos em formação
Especialistas debatem o que falta para aumentar a equidade no mercado financeiro
A diversidade requer uma adequada gestão de pessoas e uma cultura pluralista das companhias. Além disso, é necessário ter ações claras de aceleração da formação técnica e ter métricas para medir o quanto as empresas estão engajadas na causa. Essa foi a tônica do painel “Precisamos falar de diversidade no mercado financeiro”, nesta sexta-feira, 29, no ANBIMA Summit.
“Obter igualdade é complexo; e nada mais desigual que tratar todos de forma igual. É a partir do tratamento diferenciado, pela equidade, que atingimos a diversidade. Mas existe no mercado uma preferência pela homogeneidade”, disse Hélio Santos, um dos criadores do Pacto de Promoção da Equidade Racial.
Contudo, ao elaborar políticas para promover esta inclusão, as empresas não podem pasteurizar a diversidade. “Você atrai pessoas de diversas origens e, quando eles vêm, você pasteuriza todos, em vez de aproveitar esses talentos. A diversidade requer gestão e pede uma cultura pluralista”, ressaltou Santos, acrescentando a necessidade de igualdade de oportunidades para pessoas diferentes.
Em estágio inicial
Tida como o grande motor de geração de inovação e prosperidade das companhias, a diversidade ainda engatinha no mercado financeiro. “Quando olhamos as empresas listadas, muitas não têm mulheres na liderança; isso sem falar de negros”, apontou Carolina da Costa, sócia da Mauá Capital.
Estudos recentes mostram o quanto as empresas lucram mais com a diversidade. “É bom ter pessoas de realidades distintas, mas, apesar de termos argumentos a favor, ainda temos um longo caminho a percorrer”, disse Carolina. Além disso, diversidade não se trata apenas de atrair pessoas, mas retê-las e contribuir para a formação. Nesse sentido, ela defendeu que é necessário levar em consideração as lacunas educacionais do Brasil.
O mercado financeiro, em especial, requer formação específica para a maioria dos cargos. “Os executivos do mercado financeiro não poderiam oferecer o tempo deles para a formação, trazendo o jovem o quanto antes para ele ter o atraso de formação compensado com as novas capacidades técnicas?”, destacou a sócia da Mauá Capital.
Ter ações claras de aceleração das carreiras das pessoas que vêm de realidades muito diferentes e que precisam de formação técnica é crucial, na visão de Gilberto Costa, head de private bank do JP Morgan. Costa adiantou que a ANBIMA começou um estudo para fazer o diagnóstico da maturidade da indústria quanto à diversidade nos variados segmentos. “Cabe a nós, enquanto indústria, o papel de construir uma rede de articulação e de puxar esta agenda, de nos conectar com outras iniciativas em andamento”, disse.
Nesse sentido, Carolina defende que haja cobrança por métricas melhores para efetivamente medir o quanto as empresas estão se engajando em incluir a diversidade. Além disso, ela reforçou que cabe também à iniciativa privada o comprometimento para formação de mão de obra. “O investimento social privado no Brasil é muito pequeno, é papel do governo, sim, mas a iniciativa privada pode catalisar esforços”, disse.
Com relação ao espaço das mulheres no mercado financeiro, apesar de ter aumentado nos últimos anos, representa ainda entre 20% e 30%, segundo apontou Sandra Blanco, estrategista-chefe da Órama. “Tem muito ainda para fazer”, disse. “Mas as mulheres estão se ajudando, fazendo ações e medidas e sendo inspiração para outras mulheres. É isso que vai ajudar. As empresas precisam ter mulheres nas suas posições de lideranças”, acrescentou.
ANBIMA Summit: risco ambiental ganha força nas análises de portfólios
Na visão de Paul Bodner, da BlackRock, é de se esperar que carteiras ASG tenham um desempenho melhor que outros ativos, especialmente nas recessões
A importância dos fatores sociais, ambientais e de governança, reunidos na sigla ASG, embora não seja nova, foi elevada de patamar nos últimos dois anos e começou a fazer parte do universo dos investidores brasileiros. Tem sido exponencial o crescimento da oferta de produtos, como fundos de investimento, que se intitulam ASG. O que sustenta este movimento é a ideia de que empresas com boas práticas socioambientais e de governança projetem retornos maiores em médio e longo prazos.
A utilização dos critérios ASG, na visão de Paul Bodnar, chefe global de Investimentos Sustentáveis da gestora BlackRock, ajuda a entender melhor a empresa antes de inclui-la no portfólio. “O ASG foi criado como um caminho para reunir novas informações sobre as companhias que vão além das financeiras. Ao combiná-las, o investidor consegue escolher melhor quem fará parte de seu portfólio”, explicou ao participar do debate “Por que a ASG importa para os investimentos”, no ANBIMA Summit, nesta sexta-feira. “É de se esperar que, ao fazermos isso, as carteiras ASG tenham um desempenho melhor, especialmente nas recessões, porque usamos mais informações e dados para escolher empresas mais resilientes que serão mais fortes. É para isso que o ASG foi criado”.
No processo de análise de portfólios da BlackRock, a maior gestora de ativos do mundo com US$ 9,46 trilhões na carteira reportados no terceiro trimestre, o ASG tem um papel essencial, explicou Bodnar, chamando a atenção para os riscos climáticos que cada vez mais vão pesar na economia. “Estamos preocupados com os efeitos na economia das emissões descontroladas de gases de efeito estufa e com os impactos físicos que isso terá. Precisamos reduzir a emissão de gases e tem muita gente investindo em sustentabilidade porque querem que seu dinheiro em empresas que acelerem a transição para uma economia de emissões zero”.
Nosso vice-presidente e charmain da BlackRock no Brasil, Cacá Takahashi, lembrou que o ASG não é exatamente um tema novo, mas que nos últimos anos ganhou espaço e relevância no Brasil. “Na verdade, o Brasil está no começo, no primeiro estágio do ASG, mas aumentando exponencialmente a oferta de produtos e o interesse dos investidores”, disse. Paul Bodnar, que atua com finanças sustentáveis há 20 anos, destacou que ao longo do tempo o principal avanço foi que se os riscos ligados ao meio ambiente não forem bem conduzidos, com ações efetivas, a economia caminhará em uma direção muito ruim. “Nós não devemos cuidar dos riscos climáticos porque amamos os ursos polares, mas porque amamos a estabilidade financeira. Acho que é o mais importante que vejo mudando”.
Sobre a participação dos países emergentes na construção de uma economia descarbonizada, o executivo afirmou ser essencial que não sejam esquecidos nesta história de zerar as emissões. “Se não nos concentrarmos em como os mercados emergentes continuarão crescendo e desvinculando esse avanço de novas emissões, a realidade é que seguiremos globalmente com emissões de gases de efeito estufa que vão levar a um nível incontrolável de riscos climáticos”, afirmou. A BlackRock, em um artigo publicado há algumas semanas, estimou que será preciso investir US$ 1 trilhão em tecnologias climáticas em mercados emergentes todo ano, sem incluir a China, entre 2021 e 2030, para manter a descarbonização. No momento, este investimento é de apenas US$ 150 bilhões, segundo a gestora.
Dados da BlackRock sobre o crescimento dos ativos sustentáveis sob gestão na América Latina comprovam o interesse exponencial no tema. Cresceram de quase US$ 500 milhões no início de 2020 para mais de US$ 6 bilhões em agosto de 2021. Takahashi, ao reforçar que no Brasil o interesse também avança a passos largos, acrescentou que há mudanças na autorregulação para ajudar o mercado a se desenvolver de forma sustentável. “A ANBIMA tem algumas iniciativas para ajudar os investidores a identificar os projetos que temos no setor. No momento, temos um processo de audiência para nossa estrutura de identificação dos fundos de investimento ASG”, explicou, indicando que também está sendo feita uma pesquisa para compreender como os gestores de ativos andam alocando os produtos ASG nas empresas. “Além disso, uma das responsabilidades da ANBIMA é a formação. Estamos incluindo o ASG em todas as nossas certificações.”
ANBIMA SUMMIT: é preciso acelerar o “S” da agenda ASG, afirmam especialistas
Redução das desigualdades sociais e inclusão de minorias são algumas das pautas prioritárias citadas em painel desta sexta
Em um momento em que lideranças globais se reúnem na COP26, em Glasgow, para tratar de temas urgentes relacionados ao meio ambiente, o Brasil também precisa voltar as atenções para outro pilar fundamental da agenda ASG: o social. Monitoramento do trabalho escravo e infantil nos processos produtivos das empresas, implementação de programas de equidade étnico-racial e de gênero, ações de inclusão LGBTQI+ e combate à desigualdade social, potencializada durante a pandemia: essas e outras questões que demandam respostas urgentes, entretanto, ainda não foram completamente assimiladas por empresas, gestoras e investidores e é preciso acelerar as propostas, segundo os participantes do painel “Uma agenda ASG made in Brazil”, que aconteceu nesta sexta-feira, 29, no ANBIMA Summit.
“A agenda social, aos poucos, começa a ser assimilada, mas não da forma como precisamos ou gostaríamos”, resumiu Fernanda Camargo, sócia e cofundadora da Wright Capital Wealth Management. A explicação é simples: a maioria das agências de rating que desenvolvem os frameworks para reportes ASG é de países desenvolvidos, dos EUA ou da Europa, que não enfrentam os mesmos problemas de desigualdade do Brasil. “Por isso, o olhar para as questões ambientais por parte das empresas brasileiras tem um peso muito maior do que as questões sociais, principalmente quando falamos de alguns setores extrativistas”, disse.
Para Fabio Alperowitch, sócio-fundador da Fama Investimentos, havia, até alguns anos atrás, uma “repulsa” da alta liderança de empresas e do mercado de capitais em discutir temas relacionados a direitos humanos. “O debate não ocorreu por muitas décadas. Essa era uma questão vista como ideológica, como se quem propusesse (o debate sobre) esses temas pertencesse a uma determinada ideologia contrária à ideologia predominante no mercado”, disse. Em anos recentes, entretanto, a agenda ganhou relevância e “caiu como um meteoro”, com a necessidade do mercado em fornecer respostas imediatas sobre questões sociais relevantes. “Mas as questões de direitos humanos são complexas, densas e profundas e é impossível que o mercado dê respostas imediatas. Estamos em um nível superficial de conscientização”, disse.
Racismo climático
Em um debate moderado pela jornalista Rosana Jatobá, o gestor defendeu que as ações voltadas à resolução de problemas sociais têm que andar lado a lado com a agenda ambiental. “O S e o A são indissociáveis. Um exemplo é o que chamo de racismo ambiental. A população mais vulnerável às mudanças climáticas é a negra, que não participa das discussões para a busca de soluções. Há predominância branca e falta inclusão no debate sobre esses temas”, opinou.
Negócios de impacto não são filantropia
Marco Gorini, cofundador do Grupo Dyn4mo, que investe em startups de impacto, lembrou que esses negócios não podem ser confundidos pelos investidores e o mercado com filantropia. As empresas de impacto, explicou, têm em seu core business a intenção de gerar impacto social e ambiental positivos, com indicadores que mensuram esses impactos e, não menos importante, buscam gerar retorno aos acionistas. “São negócios viáveis que trazem retorno e transformam a sociedade. Ainda estamos no processo inicial de entendimento de que impacto positivo gera valor e impacto negativo destrói valor e aumenta riscos. São pontos de entendimento necessários para empurrar a transformação mental no mercado financeiro nesse momento”, disse.
ANBIMA Summit: ASG vai do institucional para o estratégico
Gestores devem estar atentos a riscos e oportunidades do novo ambiente de negócios
Os aspectos ASG (ambientais, sociais e de governança) saíram do segundo plano e passaram a integrar as agendas de investidores e empresas. O título do painel desta manhã do ANBIMA Summit, “Sustentabilidade: do anexo para as páginas principais”, reflete bem essa evolução.
Maria Eugênia Buosi, sócia da consultoria Resultante, contou que, quando atuava para o fundo Ethical, o primeiro do tipo ASG a surgir no Brasil (há cerca de 20 anos), comemorava quando entrava no site de uma companhia e este trazia informações sobre sustentabilidade. Ela disse que antes as companhias costumavam relatar apenas ações como o plantio de árvores na praça em frente às suas sedes, o trabalho voluntário e a filantropia. “Agora, se discute estratégia de sustentabilidade no conselho de administração e a agenda foi do institucional para o estratégico”, afirmou.
Maria Eugênia citou estimativa de que atualmente há cerca de R$ 950 bilhões de ativos sob gestão no Brasil que utilizam algum critério ASG no seu processo de investimento. Nos mercados desenvolvidos, avalia-se que US$ 35 trilhões foram alocados com base em ASG, volume que corresponde a 36% do valor sob gestão desses mercados. Nos Estados Unidos, a utilização desses critérios avançou de 17% para 33% do valor sob gestão (de 2014 para hoje).
Apesar da evolução, ainda há muito o que avançar na agenda ASG. Pesquisa recente da ANBIMA com 265 instituições do mercado financeiro mostrou que 85% delas consideram a sustentabilidade um tema importante. Os aspectos ASG vêm ampliando espaço: mais da metade das instituições informou que o tema ganhou relevância nos últimos 12 meses - e essa tendência deve continuar, já que 52% relataram planos para adotar práticas ASG também nos próximos 12 meses.
No entanto, apesar de o tema ter ganhado importância, as instituições que apresentam algum grau de maturidade com relação ao assunto ainda são minoria: cerca de 30% (6,8% são consideradas “engajadas” e 21,5% caracterizadas como “emergentes”). Aquelas com algum grau de entendimento e envolvimento com a temática, e que estão começando a se estruturar, são 32,1% (consideradas “iniciadas”). Mas 35,5% são consideradas “distantes” da pauta ASG, e 4,2% “desconfiadas”.
Sonia Consiglio Favaretto, SDG Pionner da ONU (Organizações das Nações Unidas), considera que é necessário atentar essas empresas à importância do tema. A pandemia ajudou nesse processo de conscientização: “pela dor, a gente percebeu que o mundo é interconectado e que não dá mais para separar as caixinhas. A gente precisa ir para novo modelo de mundo”, disse. Para ela, não se trata apenas do avanço da agenda ASG, mas de juntar as peças de um quebra-cabeças complicado.
Além do setor privado, Sonia ressalta a importância de outros agentes andarem na mesma direção: a autorregulação, o poder de pressão dos investidores, as políticas públicas e o questionamento da mídia. Processos que não são simples e que podem ocorrer em ritmos diferentes. Mas ela considera que, se todos estiverem na mesma direção, já há motivos para comemorar. “A transição é a regra do jogo. Você pode não estar fazendo tudo o que deve fazer agora, mas o que está fazendo para chegar lá?”, perguntou.
Desafios e oportunidades
Renato Eid, diretor da Itaú Asset Management, considera que um dos desafios atuais da análise ASG por parte dos gestores de recursos diz respeito aos dados que servirão para a tomada de decisões, uma vez que não há padronização na apresentação das informações não-financeiras. Ele contou que uma das formas que a Itaú Asset encontrou para trabalhar com os aspectos ASG foi o pragmatismo, o que significa que o foco recai sobre os aspectos materiais (relevantes para as empresas). Tanto é que a casa, que já trabalhou com um modelo que levava em conta 32 dimensões ASG, reduziu-as para as atuais oito.
Além do pragmatismo, ele ressaltou a importância do diálogo entre gestores, empresas e investidores, por meio de retornos (feedbacks) sobre as questões relevantes, já que “não há verdade absoluta nesse campo”. Para ele, o engajamento é necessário para que as informações circulem e a pauta avance, sem esquecer de que nesse campo deve haver humildade para o aprendizado e para que a evolução ocorra.
Na JGP, o olhar para as questões ASG começou após o acidente com a Vale, em Brumadinho. As ações da mineradora representavam, à época, parcela relevante das posições (cerca de 10% do patrimônio de alguns fundos). Com o acidente, o alerta foi aceso e tomou-se a decisão de estudar a fundo a questão, começando pela função social das empresas.
A conclusão foi a de que há atualmente várias forças econômicas e sociais impelindo as companhias a não apenas buscar a maximização dos lucros para os acionistas, contou o sócio Marcio Correia. Para ele, é inexorável que a função social do negócio se torne mais relevante, e que isso vai ter impacto no resultado das empresas. Dentre os fatores que impulsionam para um papel ampliado das empresas, ele citou a globalização, a criação de oligopólios e monopólios, as mídias sociais, o crescimento da importância de aspectos intangíveis para o valor das companhias, e, por fim, a própria questão ambiental.
Todos esses fatores vêm trazendo à tona riscos que antes não eram levados em conta, e que agora entram no radar por meio dos critérios ASG. Mas os debatedores consideram que também há oportunidades. Eid, da Itaú Asset, citou que as oportunidades estão nas tecnologias que podem contribuir para a resolução da questão climática, como as energias renováveis, mas também nas empresas atentas às mudanças de comportamento por parte dos consumidores. Correia, da JGP, lembrou que o mundo deve crescer menos daqui para a frente, e que as empresas terão desempenhos desiguais. Ele considera que as oportunidades devem estar nas empresas bem-posicionadas, que contam com propósito para atrair e reter as pessoas - já que empresas que tratarem mal consumidores e funcionários verão seus negócios definharem.
ANBIMA Summit: Brasil está em bom caminho no ASG e conta com pilares relevantes, afirma Tavares, do Granito Group
ANBIMA é uma das entidades liderando as discussões sobre o tema no mercado global de capitais
Consumidores de todo o mundo vêm pressionando empresas a adotarem práticas ASG (sigla para responsabilidade ambiental, social e governança) e investidores vêm demandando cada vez mais ativos e fundos com estas características. Em meio às discussões globais para regularização e padronização destas políticas e produtos, o Brasil se destaca, afirma Rodrigo Tavares, fundador e presidente do Granito Group, que participou de painel dedicado ao tema no último dia do ANBIMA Summit.
“O Brasil está em um bom caminho e tem alicerces que precisam ser destacados”, disse Tavares, que também é professor de finanças sustentável na Nova School of Business de Portugal. “O país tem história, o ASG não chegou agora. Brasileiros são reconhecidos players internacionais no campo da sustentabilidade”.
Um dos aspectos mais avançados, no país, é o legal e normativo. Tavares lembra que há pelo menos cinco resoluções do Conselho Monetário Nacional, duas instruções da Previc, três instruções e resoluções do BC e três instruções da CVM abordando o assunto. Há, também diversas organizações envolvidas nestas discussões. “ANBIMA, B3, CVM, BC e diversas associações setoriais”, recordou. “Essa densidade não existe em muitos países, com certeza não é uma realidade nos EUA, por exemplo”.
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A ANBIMA é uma das entidades liderando as discussões sobre o tema no mundo, disse Tavares. A Associação lançou em 2020 o Guia ASG - Incorporação dos aspectos ASG nas análises de investimentos e, em outubro deste ano, colocou em consulta pública propostas de critérios para identificar fundos focados em investimentos sustentáveis, que complementaria a classificação existente atualmente.
O interesse da imprensa na cobertura do tema e a grande quantidade de eventos públicos que debatem o assunto dão ainda mais capilaridade e tração ao ASG no Brasil. “Falta informação, educação, mais dinâmica dos mercados. Há poucos gestores que verdadeiramente sabem integrar dados, práticas e políticas ASG, mas acho que estamos num bom caminho”, comentou.
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Normas e leis estão sendo criadas em nível acelerado para organizar o mercado, afirma Tavares, do Granito Group
O crescimento da demanda global por investimentos com aspectos de responsabilidade social e sustentabilidade ambiental tem impulsionado o mercado de fundos ASG (sigla para ambiental, social e governança), o que vem sendo acompanhado por reguladores de todo o mundo que buscam nivelar as informações e parâmetros adotados pelos agentes de mercado, segundo Rodrigo Tavares, fundador e presidente do Granito Group, que participou hoje de painel no último dia do ANBIMA Summit.
O tema está em transição no mundo todo, da formalidade para a normalidade, do nicho para o convencional. “Processos e práticas estão em amadurecimento, e ainda levaremos alguns anos para termos uma verdadeira arquitetura global de ASG, com previsibilidade, uniformidade de ações por parte dos agentes do mercado financeira”, disse Rodrigo, que também é professor de finanças sustentável na Nova School of Business de Portugal.
Reguladores do mundo todo têm se debruçado sobre o tema para aprimorar padrões de transparência e padronização dos investimentos ASG. Em março a Europa colocou em vigor o Sustainable Finance Disclosure Regulation, que determina que gestores de ativos adotem um padrão uniforme de comunicação e prestação de contas dos impactos que seus portfolios têm na sociedade e no meio ambiente. No Reino Unido, o British Standards Institute (BSI) publicou em junho um guia com as recomendações para os capitais naturais.
No quesito regulatório, o Brasil tem posição de destaque, afirma Tavares. Ele reconhece pelo menos cinco resoluções do Conselho Monetário Nacional, duas instruções da Previc, três instruções e resoluções do BC e três instruções da CVM abordando o assunto. “Olhando para o futuro, claramente este componente de regulamentação, normas e leis em ASG vai continuar a crescer em ordem galopante”, afirmou.
No passado, houve tentativa de alguns países em criar selos de qualidade ASG, mas foram iniciativas de nicho muitas vezes lideradas por ONGs. Em um segundo momento, várias instituições internacionais lançaram guias de boas práticas para tentar organizar o mercado. O professor prevê o lançamento, em breve, de modelos regulatórios que definirão requisitos, standards, verificação e monitoramento de produtos com características ASG.
Regulação incide sobre várias camadas
As leis e regulamentações sendo anunciadas no mundo todo e que tentam organizar as práticas ASG de empresas e dos mercados incidem sobre as diversas camadas de atuação. A primeira são os proprietários de ativos, principalmente fundos de pensão, comenta o executivo. O Pension Schemes Act, publicado neste ano pelo regulador dos fundos de pensão britânico, já traz políticas revisadas e apresenta um guia de boas práticas, com o intuito também de proteger o cliente.
A segunda camada são os gestores de ativos. A Sustainable Finance Disclosurre Regulation (SFDR), na Europa, impôs obrigações a instituições financeiras, intermediários, gestores, estruturadores e outros participantes. O SFDR distingue os fundos em três categorias, explica Tavares: os do artigo 6, sem conexão com ASG; os do artigo 8, que promovem características de ASG; e os do artigo 9, que tem objetivos em sustentabilidade. “Essa divisão tripartite não é muito clara, mas é um primeiro passo para organizar o mercado”, comenta.
Há ainda uma terceira camada de regulação, focada das empresas. O executivo cita o exemplo da Europa. Na região, a Non-Financial Reporting Directive (NFRD) e, em breve, a Corporate Sustainability Reporting Directive (CSRD), que está em fase de discussão, vão determinar que as empresas divulguem e estimem o impacto de suas atividades nas pessoas e no meio ambiente.
“Isso está em ebulição, com um dinamismo sem precedentes. Daqui cinco, dez ou vinte anos, vamos olhar retrospectivamente e dizer que acompanhamos e contribuímos para estes avanços”, afirmou.
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Regulação, padronização de informações, correlação de dados e classificação de fundos devem evoluir
O ASG, sigla para responsabilidade ambiental, social e governança, é um dos principais pilares nas discussões de empresas e nos mercados de capitais do momento. Governos, setor privado e o terceiro setor têm se debruçado para organizar as práticas de forma a aumentar a transparência, facilitar a compreensão e criar parâmetros para empresas e fundos.
Rodrigo Tavares, fundador e presidente do Granito Group, lista quatro principais pontos a serem equacionados neste momento e que considera cruciais para que o ASG deslanche. “Essa fase de amadurecimento de ASG gera frustrações, mas é também grande oportunidade”, comentou durante painel dedicado ao tema no último dia do ANBIMA Summit.
1) Regulação: autoridades de diversos países estão trabalhando para criar um arcabouço legal e infralegal que incidirá sobre os diversos agentes: proprietários de ativos, principalmente os fundos de pensão, gestores de fundos e outros agentes do mercado como estruturadores, e as empresas.
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2) Padronizacão de relatórios e prestação de contas: enquanto as empresas usam dois modelos de relatórios financeiros, há mais de trinta modelos de prestação de contas ASG. A falta de padronização dificulta as análises comparativas entre as empresas, o que fica ainda mais complexo à medida que o um número cada vez maior de instituições apresenta este tipo de relatório. Entre os integrantes do índice S&P 500, o número de empresas com relatórios ASG subiu de 20% em 2011 para mais e 90% atualmente, comenta o professor.
“A boa notícia é que isso vai ser corrigido nos próximos anos com a fusão de empresas e a criação de plataformas colaborativas”, disse Tavares. Além disso, organizações internacionais têm olhado para essa questão e anunciado propostas. O World Economic Forum editou o Stakeholder Capitalism Metrics, que visa definir métricas comuns para este tipo de investimento. Na Europa, o European Union Sustainability Reporting Standards é previsto para o ano que vem. Mas o mais aguardado são os padrões de relatório de sustentabilidade a serem anunciados pelo IFRS. “Nos próximos dois ou três anos, passaremos de trinta para um ou dois modelos, e o IFRS será o epicentro deste trabalho”, aposta.
3) Dados ASG: são outro desafio que pode ser superado com a padronização. “Todos os dias vemos notícias e estudos sobre as dificuldades iminentes no exercício de capitar matematicamente o perfil ASG das empresas”, diz o professor. “Há quase cinquenta agências de rating ASG no mundo”, complementou.
A diversidade de instituições gera também um grande número de metodologias, com baixa correlação entre os dados de cada agência. As bases de dados também não são amplas, e incluem poucas empresas de baixa capitalização, de países emergentes ou de capital fechado. Há ainda um conflito de interesse: as mesmas agências que concedem o rating para as empresas prestam consultoria para seus clientes.
“As três maiores agências de classificação de risco de crédito no mundo levaram muito tempo para apurar suas metodologias. O mesmo vai acontecer com as de ASG”, disse Tavares, que acredita que tecnologia e consolidação devem contribuir para esta padronização.
4) Padronização de fundos: o mercado de fundos com requisitos ASG vem crescendo a ritmo acelerado e isso não deve parar tão cedo. A consultoria PwC prevê que os ativos ASG sob gestão na Europa representem 50% do total do mercado de fundos em 2025, o que equivale a quase 8 trilhões de euros. “Mas o que é um fundo ASG? Não há consenso no mercado, na academia, na mídia, nem entre diferentes geografias ou dentro de cada país”, afirmou Tavares.
Para ele, o que determina que um fundo é sustentável não é a composição das carteiras, mas sim a organização, processos e conjunto de ações continuadas e compromissos do gestor para garantir que práticas, dados e políticas são integrados com qualidade. “Olharemos mais para o curso do rio do que para o estuário”, afirmou.
ANBIMA Summit: CBIO coloca o Brasil na liderança de créditos de descarbonização
Foco está em ampliar a liquidez desse mercado e incorporar novos players, tanto emissores como compradores, além de atrair fundos e empresas com compromisso de zerar as emissões
O mercado de CBIOs está em alta. As perspectivas são positivas, principalmente, devido à segurança sobre a origem do crédito de descarbonização, tendo a certeza de que, na ponta, há a efetiva redução de CO2 — uma tonelada de dióxido de carbono por cada CBIO. "Ao garantir o lastro do processo na operação e, depois, com a estruturação do ativo, conseguimos garantir e dar segurança da lisura das transações. O Brasil passa a ser uma das principais praças de redução de emissões e, portanto, da geração de créditos de descarbonização para o mundo”, destacou Evandro Gussi, presidente da UNICA - União da Indústria de Cana-de-Açúcar, ao participar de painel no ANBIMA Summit, nesta sexta, 29.
Grande parte do sucesso vem da transformação do crédito de carbono em um ativo financeiro, efetivamente negociado, registrado e com todos os controles que o mercado já desenvolveu para os instrumentos negociados.“O Brasil vai ser o Oriente Médio do mercado de crédito de carbono; temos potencial natural, seja no mundo de créditos voluntários de preservação e reflorestação, seja na parte de substituição de combustíveis, que já fomos líderes e temos o programa de etanol há décadas, ou em energia renovável”, ressaltou Luiz Masagão, presidente do Fórum de Negociação da ANBIMA e diretor de Tesouraria do Santander
Nesse sentido, o foco da ANBIMA está em ampliar a liquidez desse mercado e incorporar novos players, tanto emissores como compradores, além de atrair fundos de investimentos e empresas com compromisso de zerar a emissão de carbono. “O produto já nasceu, é robusto e tem boa infraestrutura de mercado. Temos muito a crescer e a desenvolver”, assinalou Masagão.
CBIOs em contexto — O crédito de descarbonização é um instrumento financeiro do RenovaBio, que começou a partir da observação da redução de emissões de carbono que o etanol ou qualquer biocombustível permite ao substituir um combustível fóssil. Conforme explicou Evandro Gussi, da associação dos produtores de açúcar e etanol, é feita a aferição da cadeia de produção para saber o volume de emissão e quanto há de redução em comparação se tivesse sido usado um combustível fóssil. Ou seja, quanto de emissão de gases o etanol emite em todo o seu ciclo de produção, desde a plantação da cana, comparado a quanto seria essa mesma emissão na cadeia de combustível fóssil.
“Nesta diferença, a cada tonelada de carbono que eu deixo de emitir, eu posso gerar um CBIO, um crédito de descarbonização. Esse CBIO passa a ser negociado pelo sistema financeiro organizado, podendo abater e resolver as metas de descarbonização que as distribuidoras de combustível têm, porque elas precisam ficar mais limpas, e também outras empresas e outros players de mercado que queiram reduzir suas emissões”, detalhou Gussi.
A ANBIMA trabalhou desde a confecção da lei que criou o RenovaBio e teve a participação na formatação da infraestrutura legal em volta do normativo para garantir que os agentes do mercado estivessem confortáveis para negociar o ativo e que ele tivesse liquidez, segundo explicou Masagão. Uma das garantias, por exemplo, é ter todas as notas fiscais da venda do etanol registradas na ANP - Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis para registrar o CBIO. “Temos um agente centralizado para garantir a lisura do processo e é com base no registro na ANP que o ativo é convertido em um ativo financeiro, que é registrado e escriturado na B3 para custódia e negociação”, detalhou Luiz Masagão, que coordenou o painel.
Desafios e oportunidades — O primeiro passo, de garantir a lisura para o sistema financeiro brasileiro ter segurança, foi dado, apontou Evandro Gussi. Agora, o momento é de adaptação a esse mercado — e não só no Brasil, mas também no exterior, em um processo que inclui empresas lançando metas voluntárias ou aderindo às metas compulsórias dos países que apresentaram NDC (Contribuição Nacionalmente Determinada).
“Agora temos que melhorar, por um lado, a nossa adaptabilidade às exigências dos mercados internacionais de crédito de carbono e melhorar o processo no trabalho com ANBIMA da racionalidade do fluxo econômico e financeiro do CBIO”, apontou Gussi.
Dentro do processo do mercado financeiro, o presidente da UNICA avalia que foi atingido o nível de sofisticação, segurança e liquidez. “Nossa grande ambição é que o CBIO esteja, cada vez mais, adaptado para o mercado financeiro trabalhar. Não adianta querer adaptar o mercado financeiro ao CBIO, mas é o CBIO que tem de se tornar mais adaptado a esse ambiente e ser um dos principais suppliers de crédito de carbono nas próximas décadas”, completou Gussi.
ANBIMA Summit: mudanças climáticas exigem adaptação nos modelos de risco
Mercado financeiro e de capitais tem avançado na busca por metodologias que avaliem práticas sustentáveis, mas o caminho ainda é longo, segundo especialistas
As mudanças climáticas causadas pela destruição da camada de ozônio fazem parte daqueles eventos que afetam a todos indistintamente. Incêndios em uma região, chuvas devastadoras em outra e alterações no clima que afetam a agricultura são só algumas das consequências do aquecimento global sentidas por empresas e cidadãos. O mercado financeiro e de capitais também é impactado e precisa rever modelos de risco, para incluir cada vez mais a questão ambiental. O setor é considerado essencial como estimulador de boas práticas pelas empresas que financia, de acordo com os especialistas que participaram do painel “O mercado está preparado para as mudanças climáticas?”, realizado nesta sexta-feira, 29, no ANBIMA Summit.
Para Ronaldo Seroa, professor da UERJ, houve avanços nas últimas décadas, após 197 países assinarem o Acordo de Paris (2015) e definirem metas de redução da emissão de gases do efeito estufa, mas o caminho ainda é longo e exige que todos ‘apertem o passo’. “A ideia do Acordo era limitar o aquecimento a no máximo dois graus Celsius, preferencialmente 1,5 grau, e promover a economia de carbono zero até 2050, mas hoje isso parece inviável. Na COP26, em Glasgow, serão necessários avanços para que todos acelerem iniciativas neste sentido”, comentou.
Também devem ser relevantes na COP26 debates sobre soluções baseadas na natureza, a transição energética, e como o setor financeiro e os investimentos poderão colaborar para estes compromissos. “É preciso regulamentar o artigo 6 do Acordo de Paris, que cria instrumentos de mercado para viabilizar um comércio de emissões entre dois países ou um país e uma empresa”, comentou o professor, acrescentando que o mercado voluntário já existe, mas com a regulamentação será muito maior a participação dos países.
Os reflexos diretos das mudanças climáticas no mercado financeiro foram lembrados por Denise Pavarina, vice-presidente da TCFD (Força-Tarefa de Divulgação Financeira Relacionada ao Clima), criada pelo Conselho de Estabilidade Financeira para ajudar as empresas a fornecerem melhores informações sobre os riscos e oportunidades do clima. “O mercado financeiro faz a alocação de capital baseado em risco e oportunidade. São riscos advindos do clima que podem ser muito relevantes em alguns setores e as empresas precisam se preparar”, comentou.
“Teremos um período de transição importante. Só a substituição de energia fóssil por energia limpa exigirá algo entre US$ 5 trilhões a US$ 7 trilhões até 2050. Estamos falando de muitas oportunidades de produtos, serviços e o mercado de capitais pode e deve financiar não só os investimentos, mas também a criação de produtos que vão aparecer por conta desta mudança que vivemos”, disse. A TCFD, que Denise participa, publicou um guia de orientações para o sistema financeiro e as empresas sobre os riscos do clima. No relatório anual divulgado neste mês, a avaliação foi positiva. “Houve evolução da implementação das recomendações por bancos, assets e empresas com avanço de nove pontos percentuais sobre ano anterior. Temos que correr, acelerar e acho o Brasil ainda muito tímido com poucas empresas publicando as informações de forma correta”.
A representante do BID - Banco Interamericano de Desenvolvimento, Maria Netto, lembrou que o aquecimento já causa problemas climáticos sérios, com impactos negativos em muitos setores da economia, como agricultura, infraestrutura. “Incêndios registrados na Amazônia já refletem o aquecimento. Não é uma realidade futura, já chegou. Para o mercado de capitais e investidores isso significa que seu passivo, sua carteira de projetos, seus investimentos, passados e futuros, estão expostos a estes riscos físicos”, comentou, acrescentando que os bancos precisam estar atentos em como financiar a atividade produtiva dentro deste cenário.
Maria Netto destacou o trabalho intenso feito no Brasil, pelo Banco Central, CVM, B3 e outros atores, para promover as boas práticas e fazer com que bancos e investidores comecem a integrar estes riscos dentro da análise da carteira de investimento. “Sou um pouco mais otimista do que a Denise Pavarina e vejo o Brasil melhor do que outros países. Claro que tem muito a fazer, mas os bancos estão tentando alinhar-se a isso e tanto BC quanto CVM são mais atuantes do que outros reguladores”. No Brasil, o BID trabalha em um laboratório de inovação financeira com CVM, ANBIMA, Febraban e vários outros atores, para desenvolver metodologias práticas e concretas para gestão de risco ESG, avaliação de títulos verdes entre outros.
ANBIMA Summit: precificação das emissões de gases do efeito estufa é ferramenta para combater aquecimento global
Empresas e pessoas físicas podem compensar suas emissões de forma voluntária, sem obrigação legal
Com a crise climática e o aquecimento global, cada vez mais se fala no mercado de carbono. No entanto, poucos sabem do que se trata - até mesmo porque no Brasil a matéria ainda não está regulamentada. Durante o ANBIMA Summit, o painel “Carbono: o papel do mercado voluntário de negociação”, trouxe explicações de especialistas sobre os principais tipos de cada mercado.
O mercado de carbono ganhou força com Protocolo de Kyoto (2005) e, com o Acordo de Paris (2015), se tornou uma ferramenta para combater o aquecimento global. O mercado se propõe a precificar as emissões de gases do efeito estufa (GEE), para incentivar a redução da poluição e mitigar o aquecimento global.
Há dois tipos de mercado de carbono: o regulado e o voluntário. No primeiro, os governos contam com dois instrumentos para tentar reduzir a poluição: tributar as emissões de GEE ou determinar um teto para as emissões de cada setor econômico (mecanismo chamado de “cap and trade”). Por este último, o governo concede para as empresas uma espécie de licença para poluir, e os agentes do mercado podem negociar entre si.
“A empresa que emitiu menos do que poderia tem um saldo de emissões que pode comercializar com outra empresa que passou daquela quantidade ela poderia emitir”, explicou Júlio Natalense, gerente de iniciativas de carbono da Suzano.
O mercado regulado cobre, atualmente, cerca de 25% das emissões do mundo e recentemente ganhou o reforço da China, que anunciou a criação de seu próprio mercado. “É uma tendência no mundo. Há mais de 60 jurisdições que têm instrumentos de preço. Em algumas situações, vai poder ter um mix, para uns setores têm mercado e para outros pode ter tributo”, considera Guarany Osório, pesquisador do centro de estudos em sustentabilidade da FGV - Fundação Getulio Vargas.
As empresas (e as pessoas físicas) também compensar suas emissões de GEE de forma voluntária, sem obrigação legal. A motivação pode estar ligada à responsabilidade socioambiental, por exemplo. Este é o chamado mercado voluntário, que transaciona os créditos de carbono (um crédito corresponde a uma tonelada de CO2 que deixou de ser lançada na atmosfera). A sistemática é parecida: empresas que geram o crédito o vendem para quem quer comprá-lo, e isso pode ser feito por meio de certificadoras de crédito, consultorias ou pelos próprios agentes que estão gerando esse crédito (como outras empresas). Mais recentemente, surgiram plataformas como a Moss Earth, que usam a tecnologia blockchain para validar os créditos.
O fato é que a demanda no mercado voluntário vem subindo. Fábio Guido, gerente de sustentabilidade do Itaú Unibanco, disse que o preço do crédito de carbono aumentou cerca de 100% neste ano por conta da alta procura.
No Brasil, tramita um projeto de lei no Congresso Nacional que propõe a regulamentação do mercado de carbono. Osório ressalta que o país conta com muita capacidade para tratar do tema, embora não tenha experiência em termos de política pública desse instrumento.
A expectativa é que a COP26, que começa agora em novembro em Glasgow, também trate do tema por meio da regulação do artigo 6º do Acordo de Paris, que criaria o mercado global de carbono e permitiria a transação entre países. “Se regularem, o Brasil ganhou na loteria”, afirmou Luis Adaime, CEO da Moss Earth. Isso porque a regulamentação poderia contemplar e aceitar os créditos de carbono de origem florestal, que são o forte do Brasil.
Fonte: Anbima, em 29.10.2021.