Por Martha E. Corazza
As altas taxas de juros pagas pelos títulos públicos federais atrelados à inflação e o elevado risco embutido nos ativos ligados à economia real fazem com que esses papéis continuem a liderar as estratégias de investimento sem concorrência no mercado brasileiro. Os gestores das Entidades Fechadas de Previdência Complementar mantêm as carteiras de seus planos concentradas nessa classe de ativos em 2016, em particular nas NTN-Bs. O primeiro quadrimestre do ano, portanto, reafirmou as diretrizes definidas no último trimestre de 2015, que apontavam para um crescente nível de conservadorismo na movimentação dos recursos.
A nebulosidade no ambiente político e a estagnação da atividade econômica reforçam o apetite pelos papéis públicos, que oferecem melhor retorno e contrapõem menor nível de risco frente às alternativas da renda variável, produtos estruturados, imóveis e outros segmentos. A concentração dos recursos dos fundos de pensão em renda fixa, que chegou a uma média de 69% dos ativos totais no final de 2015, segue como a tônica principal das estratégias.
ETTJ - O quadrimestre foi marcado por dois fatores que podem ter reflexos positivos sobre os resultados das carteiras dos fundos de pensão este ano: eventuais picos de valorização na Bolsa, que tem oscilado ao sabor do noticiário político e chegaram a produzir valorização de 24% no Ibovespa; e a perspectiva de redução dos passivos atuariais das entidades, por conta da nova Estrutura a Termo da Taxa de Juros (ETTJ), que definirá a taxa de desconto a ser utilizada pelas EFPCs este ano. “O anúncio da ETTJ deverá trazer algum alívio e a perspectiva é de que o primeiro semestre termine com resultados melhores no que diz respeito aos déficits dos planos”, avalia o diretor de Investimentos e Controle da Forluz, Rodrigo Eustáquio Barbosa Barata (foto).
De acordo com as regras definidas pela Resolução CNPC nº 15/ 2014 e pela Instrução Previc nº 19/ 2015, a ETTJ média corresponde à média de três anos das ETTJ diárias, baseadas nos títulos públicos federais indexados ao IPCA. Cada ponto da ETTJ média, definido de acordo com a duração do passivo, corresponde à Taxa de Juros Parâmetro (TJP) que determina os limites inferior e superior para fins de definição da taxa real de juros a ser utilizada na avaliação atuarial.
Renda variável - A alocação em renda variável, bastante baixa hoje em relação aos seus níveis históricos, reforça a opção pelo conservadorismo feita nos últimos dois a três anos. O avanço das incertezas no cenário doméstico e a necessidade de compatibilizar ativos às obrigações com o pagamento futuro de benefícios motivaram as EFPC. “O primeiro quadrimestre do ano, embora tenha registrado uma performance positiva da renda variável entre fevereiro e abril, não pode ser compreendido como um sinal firme de mudanças, porque esse movimento não teve base nos fundamentos das empresas ou da economia, mas apenas em questões do momento político”, explica o consultor André Aloi, da PPS Portfolio Performance. “Se olharmos os períodos acumulados de 12, 24 ou 36 meses, a estratégia em renda variável ainda tem que se provar”, observa Aloi.
Em relação ao comportamento errático da Bolsa, Rodrigo Barata lembra que os eventuais ganhos nesse período não são suficientes para devolver a atratividade à aplicação em renda variável: “Os investimentos dos fundos de pensão são orientados pelo horizonte de longo prazo, mas a Bolsa hoje é para os especuladores, para operadores de fundos multimercado e não para quem pensa a longo prazo, pois os fundamentos das empresas continuam desfavoráveis”. Enquanto não surgirem sinais positivos na macroeconomia, será muito difícil imaginar que as EFPC voltem a investir de maneira expressiva em classes de ativos diferentes dos títulos públicos federais a não ser que haja prêmios adequados, analisa o diretor. Na Forluz, a carteira de renda fixa concentra hoje 75% dos ativos totais, e apenas 9% estão alocados em renda variável.
Concentração e exterior - Os primeiros meses do ano não trouxeram mudança de tendência para as 361 carteiras de investimento de fundos de pensão acompanhadas pela consultoria Mercer no Brasil, segundo explica o consultor Ricardo Ventrilho, líder da área de Investimentos da empresa na América Latina. “Na comparação com setembro de 2015, o período manteve as mesmas características de maior alocação na renda fixa num plano estratégico que se mantém até hoje”. Na média, a fatia aplicada em renda fixa dessas carteiras subiu de 50,8% para 52% dos ativos totais entre setembro e o final de março passado. A média de renda variável, no mesmo período, caiu de 30% para 27%, enquanto os investimentos no exterior atingiram 2%, um índice mais alto do que a média do sistema de EFPC, que está em 1%, informa Ventrilho. “Tudo indica que os investimentos no exterior são uma opção que veio para ficar”.
A recomendação da Mercer a seus clientes tem sido a de diversificar seguindo as características de cada plano, incluindo aí estratégias diferenciadas em renda fixa, para não concentrar excessivamente em um único título e, desse modo, minimizar o risco de reinvestimento estudando os fluxos de caixa. Ventrilho aponta um erro comum, que é o de concentrar demais recursos em um único papel e em um único vencimento. “Não há uma regra geral porque é preciso respeitar a individualidade de cada plano, mas diversificar nunca foi tão importante” e não dá para buscar só o “papel da vez”, alerta o consultor.
Na Fibra, cuja alocação em renda fixa atingiu este ano 86% dos ativos totais, essa é a carteira mais conservadora dos últimos anos, informa o gerente Financeiro Marcos Aurélio Litz. “Promovemos uma forte redução na renda variável de 2015 para cá e essa alocação caiu de 15% para 4,5% dos ativos; há 2,6% em FIPs e houve um salto positivo na carteira de investimentos no exterior, que saiu de 1% para 2% do total”, explica Litz. Atualmente esse percentual de alocação no exterior recuou para 1,7%, por conta da variação cambial. O cenário macroeconômico, pontua Litz, continua motivando uma gestão muito conservadora e voltada à preservação de capital porque não há fundamento econômico que aponte melhorias. “Temos um caixa bastante expressivo para permitir movimentos de compras de títulos federais sem deixar a carteira travada”.
Parcimônia e diversificação - Ainda que a alta da Bolsa, motivada pela possibilidade de que o cenário econômico melhore lá na frente, não possa ser considerada 100% especulativa, diz Ventrilho, o momento exige muita cautela.
Para diversificar e ter uma carteira “ótima” hoje, o exterior é a melhor alternativa, defende o consultor da Mercer.
E, na avaliação de André Aloi, permanece a parcimônia no apetite ao risco, mas os remédios necessários para que os fundos de pensão enfrentem esse ambiente político e econômico desafiador passam por uma dose de conservadorismo, mas também pela diversificação, de modo a garantir retornos adequados. “É possível combinar estratégias conservadoras com diversificação; Na renda fixa, uma opção importante das EFPC tem sido a de diversificar os benchmarks”.
Fonte: Diário dos Fundos de Pensão, em 16.05.2016.