O que muda com a aprovação do acordo de acionistas
Vinte anos depois da sua privatização, a Assembleia Geral Extraordinária da Vale aprovou, na terça-feira (27/06), uma proposta de reestruturação societária com apoio expressivo de seus acionistas.
A decisão faz parte de uma estratégia, anunciada em fevereiro, para fortalecer a governança da companhia e alterar seu estatuto a fim de permitir a migração da Vale para o Novo Mercado da B3, antiga Bovespa, até 2020. Para isso, será necessário transformar a mineradora em uma empresa sem controlador definido, com ações pulverizadas no mercado – quem detiver mais de 25% da Vale terá de fazer oferta para comprar a fatia de todos os demais acionistas.
Desde 1997, quando foi privatizada, a Vale é controlada pela holding Valepar, formada atualmente pelos fundos BNDESPar e Bradespar, a mineradora japonesa Mitsui, FUNCEF, Previ, Petros e Funcesp (reunidas na Litel).
Como se sabe, a Vale é hoje o principal ativo na carteira dos planos da FUNCEF. O investimento revelou-se um ótimo negócio ao longo das últimas duas décadas. A mineradora tornou-se um gigante global presente em 21 países, maior produtor de minério de ferro e o segundo maior de níquel, além de operar um enorme sistema logístico que inclui em ferrovias, terminais marítimos e um porto e investir em energia e siderurgia.
Adoção de melhores práticas
Por que então mexer numa fórmula que se provou vencedora? Em primeiro lugar, porque os acionistas consideram que há espaço para avançar na adoção de melhores práticas de governança e mais transparência nas decisões estratégicas.
Para fazer parte do Novo Mercado, a Vale terá de adotar voluntariamente padrões mais elevados de governança do que os exigidos das empresas de capital aberto. Isso, obviamente, traz um ônus (fim do controle), mas também um bônus significativo: migrar para o Novo Mercado é como receber uma espécie de selo de qualidade de boa gestão.
Boa gestão gera confiança e isso se traduz em maior acesso ao mercado de capitais e perspectiva de valorização no médio e longo prazos. Investidores sempre estarão dispostos a pagar mais por ativos mais seguros.
Resumindo: se é bom para a companhia, é bom para os acionistas. Empresas brasileiras que seguiram por este caminho registraram valorização média de 12,6% em suas ações depois da migração para o Mercado Novo.
Ganhos de liquidez
Da mesma maneira, abrir mão do controle via Valepar também traz como bônus a chamada liquidez, ou seja, a capacidade de transformar em dinheiro um ativo financeiro.
A partir de agora, a Litel passará a ter participação direta na Vale. Hoje, a grosso modo, a FUNCEF tem ações da Litel (12,8%), que detém a maior fatia da Valepar (58%), que controla a Vale.
Aqui cabe uma explicação detalhada: a Litel foi um veículo de investimento criado à época da privatização, que reuniu todas as ações nas mãos dos fundos de pensão. Hoje, tem participação na Litel a FUNCEF, Previ, Petros e Funcesp. Com o novo acordo aprovado na terça-feira, a Litel passará a ter 21% das ações ordinárias (ON) da Vale.
E por que isso importa aos participantes da FUNCEF? Porque hoje, como têm participação indireta na Vale, os fundos de pensão teriam dificuldade para vender suas participações no momento em que desejassem.
Não significa, é claro, que a FUNCEF vá vender sua participação na Vale, mas ter esta opção de liquidez é fundamental para uma gestão equilibrada de ativos e passivos dos planos mais maduros, quando o fluxo de recursos de participantes diminui e aumenta o volume de benefícios pagos.
Ações negociáveis
Com o novo acordo de acionistas permitirá à Litel negociar aproximadamente metade de suas ações ordinárias a partir de fevereiro de 2018 e o restante em 2020. Mais uma vez, isso não é obrigatório, mas abre o leque de opções na estratégia de investimentos num cenário em que a renda fixa perde atratividade por conta da atual trajetória da taxa básica de juros (Selic).
Ao trocar um eventual poder de governança pela busca de aumento da rentabilização e liquidez do ativo, a FUNCEF, por meio da Litel, e demais controladores receberão uma compensação, que é chamada de prêmio de controle. A discussão sobre o valor exato desse prêmio foi um ponto importante do acordo: era preciso chegar a um valor que estimulasse os controlares e os acionistas minoritários.
Com o novo acordo, as ações preferenciais (com direito a prioridade no pagamento de dividendos) deixarão de existir, sendo convertidas em ordinárias (com direito a voto). Na incorporação da Valepar, a Litel receberá um prêmio de 10% no volume de ações, estimado em R$ 4,5 bilhões. Para se chegar a este valor, o parâmetro foi a análise de três operações similares realizadas no mercado brasileiro de capitais.
Na Assembleia de terça-feira, a proposta foi aprovada por 78% dos acionistas presentes, bem como a incorporação da Valepar pela Vale.
Próxima etapa
O processo de reestruturação da Vale agora tem agora uma última etapa. A mineradora abriu uma janela para conversão voluntária, até 11 de agosto, de ações preferenciais (PN), na qual trocarão cada papel por 0,9342 ação ordinária. Para que o acordo aprovado seja válido é necessária adesão de ao menos 54,09% dos preferencialistas – na votação de terça-feira, 68% das ações PN foram favoráveis.
O mercado recebeu bem as mudanças aprovadas. Na terça-feira, as ações da Vale chegaram a subir 5% e fecharam o pregão com altas de 3,07% (ações PN) e 1,83% (ON), num dia em que a Bolsa fechou em queda de 0,82%.
Outra questão importante são as perspectivas de futuro da Vale, pelo ponto de vista de investimento. Além do novo patamar de governança projetado com a migração para o Novo Mercado, as perspectivas positivas para a Vale são ancoradas em dois fatores principais. Antes de assumir a presidência da mineradora, em maio, Fabio Schvartsman conduziu a Klabin, fabricante de papel e celulose, a um nível mais avançado de governança na B3.
Desde que os preços de minério de ferro recuaram no mercado global, a mineradora fez o dever de casa, enxugou a operação e tirou do papel o maior projeto de sua história e a maior mina de minério de ferro do mundo, a S11D, em Carajás (PA), um projeto de US$ 14,3 bilhões inaugurado em dezembro de 2016. Terminada a fase de investimentos, a projeção dos analistas de mercado é que a S11D tenha forte impacto no lucro e no fluxo de caixa da mineradora.
Fonte: FUNCEF, em 30.06.2017.