Por Albert Bayer (*) e Camila Chizzotti (**)
Desvendando riscos ocultos e ferramentas que ajudam a tomar melhores decisões na contratação de terceiros
A reputação de todos está cada vez mais devassada na internet com a disseminação de notícias online, jornalismo investigativo, bancos de dados públicos e privados, o que torna a decisão de contratação de terceiros cada vez mais complexa. Neste cenário, o conhecimento dessas ferramentas com a adequada gestão desses riscos é um diferencial que pode livrar sua empresa de negócios mal-sucedidos e guiá-los para negócios mais sustentáveis, protegendo a reputação da sua marca.
O histórico ruim de um parceiro é algo que deve ser descoberto antecipadamente e o relacionamento evitado, muito antes de confiar os negócios de sua empresa nas mãos de alguém que pode não ter sido tão transparente desde o início. Com ferramentas sofisticadas e expertise colocada antes da tomada de decisão de contratação, aqueles riscos que antes eram ocultos, passam a ser descobertos. Desta forma, a negociação tem mais elementos para discussão ou, preferencialmente, resultam na procura por outro parceiro com uma boa reputação.
Negócios que envolvem terceiros que interagem com funcionários públicos, inclusive em licitações públicas ou cujas atividades estejam relacionadas à atuação em geral da área comercial devem ter atenção redobrada. As decisões tomadas por esses agentes, especialmente aquelas que você desconhece, podem gerar passivos custosos para sua empresa, como: multas altas, proibição de contratar com órgãos públicos, vedação de receber subsídios públicos, empréstimos do BNDES e até suspensão das atividades da empresa. Além do grave prejuízo reputacionaly6 por estar envolvido em alguma notícia ruim ou investigação, mesmo que causado apenas por um mal-entendido, falhas nas explicações ou formalizações incorretas.
Tendo em vista os riscos apresentados na relação com parceiros comerciais e fornecedores, temos como exigência da Lei anticorrupção (12.846/2013) a avaliação prévia desses terceiros e de seu monitoramento em um processo chamado de “due diligence”. Tal processo resume-se em uma série de pesquisas, levantamentos e cruzamento de informações com foco em riscos de Compliance e em questões reputacionais. Uma abordagem assertiva na gestão de terceiros é a aplicação de recursos e tempo aqueles que representam maiores riscos na cadeia de valor de negócios.
Comumente vemos que, na prática, a gestão de riscos de terceiros é vista como burocrática e que trava negócios, o que deve ser evitado. O primeiro passo é a separação dos terceiros de alto risco dos de riscos moderado ou baixo. Em sequência, deve ser elaborado um plano de ação proporcional aos riscos identificados e recursos disponíveis. Os que representam maiores riscos devem passar por uma análise mais cuidadosa.
Sendo assim, devem ser estabelecidos critérios para a realização de uma classificação, baseada nos fatores de risco considerados. Alguns exemplos de fatores a serem considerados são: (i) setor de atuação e/ou natureza do serviço (ex. serviços de assessoria, consultoria, despachantes, setor de construção civil, setor imobiliário, etc.); (ii) grau de interação com o poder público; (iii) valor do contrato; (iv) país em que o serviço será prestado; (v) grau de dependência de terceiros, principalmente daqueles que prestam serviço “in loco”; (vi) trabalho com parceiros de negócio ou em consórcio. O resultado da análise de riscos apontará se a due diligence é requerida e, em sendo necessária, se demanda uma análise mais simplificada ou aprofundada.
A due diligence de compliance inicia-se com pesquisas independentes na internet com o emprego de palavras chaves (ex. “corrupção”, “fraude”, “cartel”, “lavagem de dinheiro”, “improbidade administrativa”), além de buscas em sites de órgãos judiciais e/ou regulatórios, bancos de dados públicos e listas restritivas internacionais. Dentre os sites imprescindíveis para consulta, temos o Portal da Transparência no qual é possível encontrar o Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas e Suspensas e o Cadastro Nacional de Empresas Punidas.
Atualmente, há softwares que visam otimizar as buscas na internet e, com as informações obtidas, é necessária uma análise crítica sob a ótica de compliance dos resultados antes da tomada de decisões. Outro método para identificação de riscos é o envio de questionário ao terceiro, o qual apontará se este possui iniciativas de compliance, além de declarações que apontem pela eventual participação em irregularidades ou em investigações.
Para o caso de terceiros que demandem uma análise especializada ou que apresentem algum resultado de alto risco nas pesquisas, essa due diligence poderá incluir entrevistas, visitas in loco, pesquisa detalhada acerca dos processos judiciais relevantes, e reuniões com o terceiro para esclarecimento de eventuais processos ou resultados das pesquisas.
Outra etapa importante é a formalização da relação com o terceiro, seja ela representada por contrato, procuração, parceria ou mesmo consórcio. O escopo deve ser bem definido e alinhado com as limitações práticas da atividade, bem como vinculado unicamente à atuação do terceiro. Não devem ser firmados contratos com escopos padronizados ou genéricos, sobretudo nas relações de alto risco. Os contratos devem conter cláusulas que vedem condutas irregulares pelo terceiro, disponham sobre direito de auditoria e rescisão de contrato, caso uma irregularidade seja identificada. É recomendado que os pagamentos realizados sejam monitorados e que os valores estejam de acordo com as práticas de mercado.
Em complementação a todas essas medidas de diligência, vale ressaltar a importância de outros mecanismos, como a realização de treinamentos para os terceiros de maior risco, canais de denúncia disponíveis para pessoas de fora da companhia, Códigos de Ética aplicáveis aos terceiros, proibição de oferta de qualquer vantagem indevida em nome da empresa contratante, a obrigatoriedade de informar eventuais conflitos de interesse, e a proteção à livre concorrência. Internamente também é necessária a elaboração de uma Política de Contratação e de due diligence de Terceiros, além de treinamentos específicos para os colaboradores responsáveis pela interação com os terceiros e identificação de riscos.
Por fim, vale ressaltar que, além da exigência ao terceiro pela aderência do programa de compliance por terceiros, também é necessário que este comprove a existência ou ao menos se comprometa a implementar o próprio programa de Compliance. A demanda pelo programa de compliance na cadeia produtiva já era uma prática observada em empresas multinacionais, mas hoje também já é uma realidade de empresas nacionais e de médio porte, fazendo com que o compliance seja disseminado e cada vez mais não apenas um diferencial de competitividade, mas uma exigência de mercado.
(*) Advogado no WFaria Advogados especializado em Compliance e investigações internas. Possui experiência em diagnóstico, implementação e revisão de programas de Compliance anticorrupção e financeiro. Atua ainda com investigações de corrupção e fraudes internas
(**) Advogada no WFaria Advogados especializado em Compliance e investigações internas. Possui experiência em diagnóstico, implementação e revisão de programas de Compliance anticorrupção e financeiro. Membro do Grupo de Trabalho Contra a Corrupção e pela Integridade do Instituto Ethos
Fonte: O Estado de S. Paulo, em 02.08.2017.