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Artigo: A atuação da Abrapp e das EFPC para afastarem a aplicação das regras da MP 1.292/2025 – por Marlene de Fátima Ribeiro Silva*

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Entrou em vigor no dia 24 de julho de 2025, a Lei nº 15.179, resultante da conversão da Medida Provisória nº 1.292, de 12 de março de 2025 (MP 1292/2025), alterando a Lei nº 10.820, de 17 de dezembro de 2023 (Lei 10.820/2023) e regulando, definitivamente, a operacionalização das operações de crédito consignado por meio de sistemas ou de plataformas digitais.

Durante a tramitação da MP 1292/2025 perante o Congresso Nacional, ampliou-se o rol dos trabalhadores do setor privado beneficiados pelo Programa Crédito Consignado, não mais se restringindo aos empregados com vínculo de emprego, profissionais autônomos, diretores sem vínculo inscrito no FGTS, domésticos, cooperativa de crédito pela inserção dos motoristas e entregadores por aplicativos.

A utilização de sistemas ou de plataformas digitais, apresenta diversas implicações para o empregador, empregado e instituições consignatárias, cabendo o alerta maior para a necessidade de se obter do empregado a autorização para os descontos dos valores das prestações contratadas em operação de crédito, e o consentimento para compartilhar dados pessoais com os agentes operadores públicos credenciados e com as instituições consignatárias habilitadas, sem prejuízo de cada um dos envolvidos na relação negocial se aterem aos demais impactos, inclusive o da retenção de parcelas e de outras disposições igualmente representativas e estabelecidas pelo Programa.

Quando da edição da MP 1292/2025, as entidades fechadas de previdência complementar (EFPC) foram incluídas nas regras do consignado para atuação conjunta com as instituições financeiras. Tal previsão, gerou inúmeras controvérsias e discussões entre os profissionais das EFPC diante das particularidades havidas entre as modalidades de operações: do consignado com aquela efetuada com o participante inscrito em um fundo de pensão, levando a Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp) a intermediar junto à Secretaria do Ministério do Trabalho (MTE).

Nas reuniões realizadas com o MTE, a Abrapp identificou que a MP 1292/2025 não teria considerado os pontos característicos e a natureza da operação com o participante, pautada na Resolução 5.202, de 27 de março de 2025, que alterou a Resolução CMN 4.994, de 24 de março de 2022 (Resolução 4.994/2022), resultando o desprezo das diretrizes emanadas do Conselho Monetário Nacional para a aplicação dos recursos canalizados pelos participantes, assistidos e patrocinadores às EFPC e a inexistência de qualquer controvérsia de que o montante outorgado ao plano seria parte integrante da reserva garantidora do concedente, cuja rentabilidade auferida segue a regra do compartilhamento com a correspondente coletividade.

Não bastasse as percepções acima, a Abrapp sopesou os eventuais retrocessos que poderiam advir no campo judicial e legal de questões já superadas no ambiente privado, uma vez que poderia ser questionada a efetiva ausência da relação de consumo entre a EFPC e seus participantes (matéria pacificada pela Súmula 563 do Superior Tribunal de Justiça), o afastamento das EFPC do rol das instituições financeiras (por não integrarem o sistema financeiro nacional e pela previsão precípua do seu papel de proteção previdenciária distinto do sistema oficial) e a não tributação dos investimentos (isentos, desde que atendidos os requisitos estabelecidos no Código Tributário Nacional), todos com riscos sistêmicos.

A MP 1292/2025 também não teria se atentado para as disposições insertas nas Resoluções do Conselho Monetário Nacional em que consta a expressa obrigatoriedade da cobrança dos encargos financeiros incidentes sobre as operações com participantes que, em qualquer hipótese, devem ser superiores à taxa mínima atuarial (métrica intrínseca às EFPC), além das taxas de administração das operações e do adicional de risco, transferindo, supostamente, a cobertura dos custos de gestão, administração e avaliação de riscos dos investimentos para a própria entidade concedente.

Em uma das reuniões ocorridas, o MTE convidou a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc) para expor suas percepções em torno da MP 1292/2025. De início, a Previc objetou a permissibilidade para a ocorrência da portabilidade do crédito contratado pelo participante para outras instituições financeiras, realçando a existência de impedimento formal para o procedimento e os riscos de comprometimento do equilíbrio, como também da violação de normatização/legislação de caráter especial. Além disso, o órgão federal de fiscalização reforçou as ponderações antes vertidas pela Abrapp, à luz da finalidade da operação e da delegação atribuída à EFPC de rentabilização das reservas para o pagamento de benefícios previdenciários.

A partir das especificidades regentes da operação com participante, a Abrapp diligenciou na expedição de correspondência ao MTE para expor as diversas incompatibilidades contempladas no programa em confronto com a normatização do Conselho Monetário Nacional, todas de natureza impedientes, para a manutenção das EFPC no contexto da MP 1292/2025, alertando ainda sobre a especificidade de uma lei complementar em face de uma lei ordinária, dos riscos que poderiam advir para os planos de benefícios, assim como para os administradores pelo descumprimento passivo das suas políticas de investimentos e das diretrizes/regras contidas na regulamentação autorizada pelo Banco Central.

Em que pese a posição para a exclusão das EFPC do âmago da MP 1292/2025, defendeu a Abrapp sobre a imperiosidade da colaboração das suas associadas nos registros e informações acerca das operações realizadas com os participantes e assistidos, eis que a contenção do endividamento dependeria da completude dos dados de todos envolvidos nesta relação jurídica.

Em ato paralelo, a Abrapp e outras EFPC passaram a atuar conjuntamente no âmbito do Congresso Nacional, propondo uma emenda para o afastamento das entidades fechadas do campo de aplicação da MP 1292/2025, com suporte no art. 9º, § 1º, da Lei Complementar nº 109, de 29 de maio de 2001 (LC 109/2001) e da própria regulamentação do Conselho Monetário Nacional.

Com tais medidas, ocorreu a inclusão do art. 1º-B à Lei 15.179/2025, assegurando-se, desta forma, que os recursos das reservas garantidoras se constituem patrimônio exclusivo dos planos de benefícios administrados pelas EFPC, sendo a destinação exclusiva à cobertura das obrigações contratadas pelos participantes, assistidos, de um lado, e do patrocinador, de outro, preservando-se, portanto, a finalidade precípua das Entidades na administração de recursos de terceiros para o pagamento de aposentadorias e pensões, corroborando com as peculiaridades da LC 109/2001, de ordem especial, e, por consequência, à sustentabilidade do plano previdenciário.

Na versão legal sancionada, previu-se ainda no parágrafo único do art. 1º-B que as EFPC “deverão integrar as informações das operações realizadas com seus participantes e assistidos com os sistemas ou as plataformas de que trata o art. 2º-A desta Lei, de forma a evidenciar a assistência concedida e a garantir adequada avaliação das condições de endividamento do trabalhador“, disposição que beneficiará diretamente todos os envolvidos pela previsibilidade de somente se autorizar o crédito para quem disponha de margem compatível, mecanismo que minimizará o impacto do inadimplemento.

Diante do que restou exposto no presente texto, dúvida não remanesce de que a atuação tempestiva, análise de impactos e de sustentabilidade efetuados pelos abarcados em quaisquer medidas, de ordens legais, judiciais ou normativas, como foi o caso das EFPC e da Abrapp acerca da MP 1292/2025, são fundamentais para a higidez do plano e para a continuidade dos compromissos pactuados entre os participantes/assistidos, o Patrocinador e a EFCP, além de se constituírem os verdadeiros respaldos para a demonstração cabal de eventuais equívocos e riscos de edição de medidas afrontadoras ao ordenamento jurídico previdenciário privado.

Aos envolvidos, o reconhecimento pela legítima atuação para a proteção do patrimônio do plano e participantes, como também por colaborarem nos dados e informações que tendem a mitigar os riscos de crédito e outros da gestão previdenciária.

Agora, e como a pauta da Abrapp e das EFPC não foram exauridas, caminhamos para a superação de desafios preexistentes e de outros que advirão, lembrando sempre que “a força do coletivo é que faz a diferença”.

*Coordenadora da Comissão Técnica Centro Norte de Assuntos Jurídicos da Abrapp e Consultora Especial da Presidência da Funcef

Fonte: Abrapp em Foco, em 28.07.2025.