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Artigo – A Volatilidade Implícita como Instrumento de Previsão: Uma Análise no Contexto dos Derivativos – Por João Uchoa Borges Filho*

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abrapp 100625 2A volatilidade sempre foi um conceito central no estudo dos mercados financeiros, tradicionalmente associada à mensuração do risco dos ativos. Trata-se da medida estatística da dispersão dos retornos de um ativo, indicando o grau de incerteza em relação ao seu comportamento futuro. No entanto, com a sofisticação dos mercados e a evolução dos instrumentos financeiros derivados, a volatilidade passou a ser vista não apenas como uma variável de risco, mas como um ativo negociável e com valor intrínseco, cuja precificação passou a atrair tanto investidores institucionais quanto operadores de curto prazo.

A primeira negociação conhecida de um derivativo baseado em volatilidade ocorreu em 1993, no mercado de balcão, com um swap de variância sobre o índice FTSE 100. A partir de então, o interesse por instrumentos relacionados à volatilidade cresceu de forma substancial, levando à criação de swaps de variância sobre ações individuais e ao aumento das operações sobre índices. Essa tendência foi impulsionada principalmente pela atuação de hedge funds, que viam nesses instrumentos uma oportunidade de alpha e diversificação de estratégia.

Em paralelo, o Chicago Board Options Exchange (CBOE) introduziu, também em 1993, o VIX (Volatility Index), calculado com base nas opções do índice S&P 500. O VIX rapidamente se consolidou como o principal termômetro de percepção de risco do mercado, ganhando o apelido de “índice do medo” por sua correlação negativa com o desempenho dos mercados acionários. Durante crises e períodos de incerteza, como a crise financeira global de 2008, o VIX atinge níveis extremamente elevados — naquele ano, chegou a ultrapassar os 80 pontos, refletindo o pânico generalizado dos investidores.

A importância da volatilidade implícita não se restringe a sua função como indicador de sentimento de mercado. Ela é um componente essencial na precificação de opções, onde atua como uma variável não observável, inserida nos modelos por meio de sua inferência a partir dos preços das opções no mercado. Diferente da volatilidade histórica, que é baseada em dados passados, a volatilidade implícita é prospectiva: ela reflete a expectativa dos agentes quanto à variabilidade futura dos preços do ativo subjacente. Assim, se o mercado for eficiente, a volatilidade implícita tenderá a ser um previsor consistente da volatilidade realizada durante o período de vigência do contrato de opção.

Entretanto, prever a volatilidade é uma tarefa altamente complexa. Envolve antecipar o comportamento futuro dos preços a partir de informações disponíveis hoje, em um ambiente onde eventos inesperados podem alterar radicalmente os fundamentos. Muitos estudos acadêmicos buscaram avaliar a exatidão da volatilidade implícita como previsor, comparando-a com outros métodos, como a média de volatilidades históricas, modelos GARCH e volatilidades estimadas com base em dados intradiários. Os resultados, no entanto, são frequentemente inconclusivos e sensíveis ao modelo de opção utilizado, à metodologia estatística empregada e às características específicas de cada mercado analisado.

Um estudo recente, focado no mercado brasileiro — especificamente nas opções do Índice Bovespa (Ibovespa) —, contribui para esse debate ao investigar a eficiência da volatilidade implícita como instrumento de previsão. A análise incluiu diferentes níveis de moneyness (ou seja, diferentes deltas), permitindo observar como a capacidade preditiva varia entre opções dentro, fora e no dinheiro. Além disso, o estudo fez um recorte específico do período da crise de 2008, permitindo avaliar como a volatilidade implícita se comporta em momentos de estresse extremo.

Os resultados revelaram que, de forma geral, a volatilidade implícita é um indicador estatisticamente significativo da volatilidade futura, mesmo após o controle por variáveis adicionais que poderiam interferir nos resultados. Verificou-se que opções fora do dinheiro apresentaram coeficientes estimados de maior magnitude, sugerindo uma maior sensibilidade dessas opções à percepção de risco do mercado. Essa característica está relacionada ao fato de que essas opções embutem expectativas mais extremas sobre os movimentos futuros do ativo subjacente.

Outro ponto relevante do estudo foi a observação de que, durante a crise de 2008, houve uma reação tardia da volatilidade implícita em relação ao aumento da volatilidade realizada. Isso indica que, em situações de crise sistêmica, a volatilidade implícita pode não capturar de forma imediata as mudanças de regime no mercado, limitando temporariamente sua capacidade preditiva. 

Um achado importante foi o viés de alta da volatilidade implícita. Em outras palavras, os agentes de mercado tendem a superestimar a volatilidade futura, o que pode ser interpretado como um prêmio de risco exigido para se proteger contra incertezas. Esse viés é particularmente acentuado em economias emergentes, como o Brasil, onde os riscos políticos e econômicos são mais pronunciados e imprevisíveis. Tal comportamento impacta diretamente os preços das opções e deve ser levado em consideração por investidores que utilizam modelos baseados em volatilidade implícita para precificação ou tomada de decisão.

Conclui-se, portanto, que a volatilidade implícita é uma ferramenta valiosa para antecipar o comportamento futuro da volatilidade dos ativos, embora não esteja isenta de limitações. Seu uso exige uma compreensão cuidadosa do contexto econômico, da estrutura de mercado e dos modelos utilizados para extraí-la. Em mercados emergentes, sua eficiência como previsor tende a ser menor do que em mercados desenvolvidos, mas, ainda assim, superior a muitas outras métricas tradicionais. Assim, a volatilidade implícita deve ser considerada um insumo fundamental nas decisões de hedge, arbitragem e precificação de derivativos.

*João Uchoa Borges Filhoé Head de Fundo de Fundos da BNP Paribas Asset Management

Fonte: Abrapp em Foco, em 10.06.2025