Por Voltaire Marenzi. Advogado e Professor.
A Lei Complementar 213/2025, sancionada em 15 de janeiro de 2025, constituída por 13 artigos, com relativa extensão, representa um marco estatutário ao disciplinar formalmente tanto as cooperativas de seguros quanto as associações de proteção patrimonial mutualista, segmento no qual se inserem as tradicionais associações de proteção veicular.
Enfatizo que já discorri alhures sobre o tema.
Porém, agora, vou fazer sob um outro enfoque.
Pois bem. Até então, essas associações operavam à margem da regulação, oferecendo divisão de riscos sem supervisão estatal.
O mencionado diploma legal, instituiu os Grupos de Proteção Patrimonial Mutualista, organizados por associações, que dividem entre os participantes os prejuízos apurados em conformidade com contratos de pactuados entre as partes.
A associação passaram, deste modo, a ser mera articuladora dos grupos, necessitando de regularização e registro junto à Susep.
A gestão operacional se deu à cargo de administradoras, sociedades por ações a serem previamente autorizadas e pelo órgão fiscalizador de seguros, com a função de processar adesões, rateios, indenizações e regulação de eventos ocorridos no decurso destas atividades.
Deveras. As associações que atuavam até 15 de janeiro de 2025 tiveram 180 dias para adequação e cadastramento na Susep, com prazo final encerrado em 15 de julho de 2025.
O cadastramento previu a remessa do estatuto social reorganizado, os dados de dirigentes e a assinatura de termo de adequação.
De sorte, que as entidades que não se cadastraram dentro deste prazo foram obrigadas a cessar suas atividades, estando sujeitas à retomada de processos administrativos e ações civis públicas anteriormente suspensas.
Até o presente momento, segundo tenho ciência, não há administradoras autorizadas operando – portanto, mesmo as associações cadastradas que ainda não estão com status definitivo de regulares.
Em verdade, elas são constituídas como sociedades por ações, cuja função central focaliza à execução operacional típica das operações mutualistas.
Sujeitas a requisitos rigorosos de capital, solvência, prestação de contas, auditorias periódicas e taxa regulatória calculada com base nos eventos pagos nos últimos 36 meses.
De outro giro, as associações têm papel secundário e limitado: articulam grupos e firmam contratos com administradoras, mas com responsabilidade solidária por eventuais ilícitos e descumprimentos legais.
Os grupos operam separadamente e têm independência patrimonial, pois são os titulares dos direitos dos associados através de contrato de participação individualizado.
De outra banda, os corretores de seguros passaram a ter papel central na intermediação de operações de proteção patrimonial mutualista, com prerrogativa exclusiva conferida pela lei, ampliando sua atuação tradicional no seguro privado. Bom sinal.
A Susep, por meio de resoluções e poderes regulamentares conferidos pelo CNSP, ganhou competência para suspender, reprovar ou cancelar cadastramentos, além de impor multas e extinguir atividades ilegais.
As multas para entidades não autorizadas podem alcançar até R$ 35 milhões, conforme previsões da lei e regulamentação futura.
A Susep poderá fechar associações que foram descadastradas e atuar contra quem continue operando fora do marco legal.
O segmento de proteção veicular informal entrou em nova ordem jurídica, com mais rigor, transparência e segurança para o consumidor.
A transferência da operação para administradoras regulamentadas reduz a autonomia das associações, transformando-as em entidades intermediárias.
Destarte, governança corporativa serão exigidas para administradoras vale dizer, capital mínimo, auditoria, solvência, e prestação de contas periódica.
As associações devem avaliar seriamente a constituição de sua própria administradora, evitando subordinação a terceiros e preservando certa autonomia operacional.
O modelo cooperativo de seguros pode ser alternativa viável para entidades que não querem migrar ao arranjo primário da proteção mutualista.
É de bom alvitre salientar que as associações já cadastradas devem acompanhar a regulamentação do CNSP para formalização do contrato com a respectiva administradora.
Novas associações só poderão operar após surgimento de administradoras autorizadas pela Susep e celebração de contrato conforme normativas futuras.
É fundamental revisar estatutos e contratos sociais para adequação à LC 213/2025 e às futuras resoluções do CNSP.
Avaliar, do ponto de vista jurídico e econômico, a constituição de administradora própria, viabilizando posições estratégicas, proteção jurídica e maior controle operacional é fundamental para viabilizar e otimizar sua permanência no mercado.
A Lei Complementar nº 213/2025 trouxe um novo arcabouço legal às associações de proteção veicular, convertendo-as formalmente em entidades reguladas, gizando suas operações por meio de administradoras supervisionadas pela Susep, e sujeitando-as a regras de capital, solvência e prestação de contas. A obrigatoriedade de cadastramento até 15 de julho de 2025 marcou o fim da informalidade no setor. O futuro depende, porém, de regulamentação complementar do CNSP – especialmente em relação à autorização de administradoras, regras de atuação e responsabilização – e da capacidade das associações de se ajustarem ao novo modelo regulatório com eficiência e transparência jurídica.
Tudo isto, sem olvidar que o projeto de nosso Código Civil, ainda em trâmite no Congresso Nacional, prevê a criação destas entidades à luz de um diploma legal que a tenha regulamentado.
Confesso que não sei como está “andando” este projeto. Porém, se assim aprovado, irá robustecer melhor essas entidades que operarão também sob o pálio de uma nova codificação.
Porto Alegre, 31 de julho de 2025.