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15 julgados mais relevantes do STJ envolvendo seguros privados em 2024

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Por Thiago Junqueira[1]

thiago 27012025

I. Introdução

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) exerce uma função essencial na interpretação das normas aplicáveis ao Direito dos Seguros no Brasil. Em 2024, a Corte analisou temas de grande relevância – que, ainda que de forma não uniforme, acabam por impactar o setor segurador ao estabelecer parâmetros sobre deveres contratuais, interpretação de cláusulas e limites de cobertura.

Este artigo reúne, sem a pretensão de realizar um exame crítico e de adotar uma metodologia de pesquisa rigorosa,[2] os 15 julgados mais relevantes do STJ sobre seguros privados ao longo do último ano, destacando os principais trechos de cada decisão.

II. Os julgados selecionados

A seguir, em ordem cronológica inversa – dos mais recentes aos mais antigos –, apresenta-se a lista dos julgados selecionados:

1. Afastamento excepcional da necessidade de comunicação prévia ao segurado sobre o atraso no pagamento do prêmio para suspensão ou resolução do contrato:

A dispensa da exigência de comunicação prévia ao segurado deve ser analisada casuisticamente, sendo necessário que o inadimplemento seja substancial e relevante a ponto de justificar a inaplicabilidade da Súmula 616/STJ”.[3]

2. Inadimplemento do dever de informação pré-contratual – perda do direito ao capital segurado – qualificação da má-fé do segurado:

“(...) constitui má-fé do segurado omitir sua profissão (agente penitenciário) e sua condição de saúde (visão monocular) quando da assinatura de contrato de seguro de vida”.[4]

3. Seguro agrícola – possibilidade de aplicação do CDC:

No âmbito da contratação securitária, a segurada será destinatária final do seguro e, consequentemente, consumidora, quando o seguro for contratado para a proteção do seu próprio patrimônio, mesmo que vise resguardar insumos utilizados em sua atividade produtiva”.[5]

4. Seguro D&O – atos dolosos – perda de direitos – segurados:

Sendo a empresa quem firmou o contrato de seguro D&O e estando devidamente comprovado o cometimento doloso de atos criminosos que não podem ser abrangidos pela cobertura securitária, o referido contrato de seguro é nulo, não podendo ser aproveitado em favor de quaisquer dos segurados”.[6]

5. Seguro de vida – comoriência entre o segurado e uma das beneficiárias:

“(...) mesmo em caso de comoriência, não há como excluir o direito de representação de menores de idade para fins de identificação dos beneficiários de seguro de vida, quando o contrato é omisso e os beneficiários são definidos pela ordem de vocação sucessória”.[7]

6. Interpretação do contrato de seguro – distribuição estática do ônus da prova:

A elaboração e interpretação do conteúdo das cláusulas do contrato de seguro deve ser realizada de acordo com a boa-fé, não podendo, ao mesmo tempo, exceder os riscos predeterminados e tampouco frustrar a legítima expectativa do contrato ou desnaturalizar a sua garantia”. O mesmo julgado sustenta a aplicação da “regra geral de distribuição estática do ônus da prova” em demandas securitárias que não haja partes vulneráveis ou hipossuficientes.[8]

7. Seguro garantia – prescrição quinquenal quando a administração pública for segurada:

“(...) correto o posicionamento do Tribunal de origem que aplicou o prazo quinquenal, previsto no art. 1º do Dec. 20.910/1932. Tal entendimento justifica-se por considerar a existência do interesse público nas contratações entabuladas pela Administração Pública, mesmo quando o pacto for de essência privada, tudo consoante o art. 62, § 3º, I, da Lei 8.666/1993 c/c o art. 1º do Decreto 20.910/1932”.[9]

8. Acordo firmado pelo segurado sem anuência da seguradora:

Não gera efeitos o acordo firmado entre o segurado e terceiro que importe na diminuição ou extinção do direito do segurador ao ressarcimento das despesas do sinistro, pois do ajuste não participou. 2. Constitui exceção à regra somente a hipótese em que o causador do dano reembolsa integralmente o valor do sinistro ao segurado, tendo em vista a vedação de enriquecimento ilícito”.[10]

9. Sub-rogação – cláusula compromissória – ciência prévia – vinculação da seguradora:

“(...) a despeito de a sub-rogação legal em favor da seguradora não importar transmissão automática de cláusula compromissória, a ciência prévia da seguradora a respeito de sua existência no contrato objeto de seguro-garantia resulta na submissão à jurisdição arbitral”.[11]

10. Seguro D&O – perda de direito:

“(...) o seguro de RC D&O somente possui cobertura para (i) atos culposos de diretores, administradores e conselheiros (ii) praticados no exercício de suas funções (atos de gestão). Em outras palavras, atos criminosos, fraudulentos e desonestos de favorecimento pessoal e práticas dolosas lesivas à companhia, ao mercado, ao Estado e à sociedade civil não estão abrangidos na garantia securitária”.[12]

11. Seguro de automóvel – cobertura específica – interpretação restritiva:

A contratação de seguro de automóvel prevendo a cobertura de Acidentes Pessoais de Passageiros (APP) não inclui a indenização por lesão sofrida a terceiro, objeto de cobertura específica (RCF-V), uma vez que o contrato de seguro deve ser interpretado de modo estrito, a fim de assegurar a devida correlação entre o custo do prêmio e o valor da indenização securitária”.[13]

12. Dano moral em virtude de recusa indevida de indenização pela seguradora:

A jurisprudência desta Corte consolidou-se no sentido de que a recusa indevida ou injustificada do pagamento de indenização securitária enseja reparação a título de dano moral, por agravar a situação de aflição psicológica e de angústia no espírito do segurado”.[14]

13. Homicídio causado pela tomadora do seguro de vida – perda de direito:

“(...) a contratante do seguro ajustou seguro sobre a vida de seu esposo e colocou fim à vida do segurado com a intenção de receber a indenização securitária. Apesar de os recorrentes também figurarem como beneficiários do seguro, a nulidade do contrato obsta que eles recebam a indenização convencionada no contrato”.[15]

14. Seguro de vida – inaplicabilidade do agravamento do risco pelo segurado:

“Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a embriaguez do segurado não afasta o dever da seguradora pagar indenização prevista em contrato de seguro de vida. 2. Ademais, não é válida a negativa de vigência de contrato de seguro de vida em razão da condução de veículo sem habilitação”.[16]

15. Execução fiscal – ausência de liquidação antecipada do seguro garantia:

“1. A exegese do art. 32, § 2º, da LEF revela carecer de finalidade o ato judicial que intima a seguradora a realizar o pagamento da indenização do seguro garantia judicial antes da ocorrência do trânsito em julgado da sentença desfavorável ao devedor”. [17]

III. Notas finais

Com a entrada em vigor da Lei do Contrato de Seguro (Lei nº 15.040/2024), o ordenamento jurídico brasileiro passará por mudanças profundas. Sem embargo, os julgados aqui mencionados – que tiveram como pano de fundo, especialmente, o Código Civil – continuarão a ter alguma influência na interpretação unitária do Direito dos Seguros no País.

_________________

[1] Thiago Junqueira é Doutor em Direito Civil pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro e Mestre em Ciências Jurídico-Civilísticas pela Universidade de Coimbra. Sócio-fundador do escritório Junqueira & Gelbecke Advogados, é Professor de Direito do Seguro e Resseguro na FGV e Professor convidado da FGV Conhecimento e da Escola de Negócios e Seguros. Atualmente, exerce as funções de Diretor da AIDA Brasil e de Diretor de Relações Internacionais da Academia Brasileira de Direito Civil.

[2] A seleção dos julgados considerou a relevância dos temas abordados e o potencial de cada julgamento para formar jurisprudência e influenciar o comportamento das partes envolvidas.

[3] Conforme: STJ, REsp 2157009/RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 12/11/2024, onde se lê: “Para concluir pelo inadimplemento substancial em contrato de seguro, imperioso verificar não apenas há quanto tempo a parte está inadimplente, mas o percentual da obrigação que foi adimplido, quando o contrato teve início, a condição pessoal do segurado, se existiram razões que justifiquem o inadimplemento e outras peculiaridades eventualmente existentes na situação sob julgamento”.

[4] STJ, AgInt no REsp 2097220/SP, Rel. Ministro Humberto Martins, 3ª Turma, j. 14/10/2024.

[5] STJ, REsp 2165529/PR, Rel. Ministra Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 08/10/2024. Confira-se, ainda, este trecho do referido julgado: “Trata-se de seguro contratado para a proteção do patrimônio (lavoura) do próprio agricultor. Não integra, portanto, a cadeia de produção agrícola, sendo o segurado caracterizado como destinatário final. (...) Desse modo, seja diante da hipossuficiência do consumidor, seja diante da verossimilhança de suas alegações, deve ser invertido o ônus da prova, na linha do acórdão recorrido”.

[6] STJ, REsp 2149053/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 24/09/2024.

[7] STJ, REsp 2095584/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 10/09/2024.

[8] “7. Nas demandas de indenização securitária em que não há partes vulneráveis ou hipossuficientes e que não incidem peculiaridades relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário (§§ 1º ou 3º do art. 373 do CPC) deve-se aplicar a regra geral de distribuição estática do ônus da prova. 8. A partir da regra de distribuição estática, o art. 373 do CPC estabelece que o ônus probatório incumbe: ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito; e ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor”. STJ, REsp 2150776/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 03/09/2024.

[9] STJ, AgInt no REsp 2105293/SC, Rel. Ministro Herman Benjamin, 2ª Turma, j. 24/06/2024.

[10] STJ, AgInt no REsp 1792197/MG, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, 4ª Turma, j. 03/06/2024.

[11] STJ, AgInt no AREsp 2273766/RJ, Rel. Ministro Humberto Martins, 3ª Turma, j. 03/06/2024.

[12] STJ, AgInt no AREsp 1402146/RJ, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, j. 13/05/2024.

[13] STJ, AgInt no REsp 2094740/RO, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, 4ª Turma, j. 22/04/2024.

[14] STJ, AgInt no REsp 2112291/MG, Rel. Ministra Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 08/04/2024.

[15] STJ, REsp 2106786/PR, Rel. Ministra Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 02/04/2024.

[16] STJ, AgInt nos EDcl nos EDcl no AgInt no REsp 1827230/PR, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, j. 11/03/2024.

[17] STJ, AgInt no AREsp 2310912/MG, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Rel. p/ Acórdão Ministro Gurgel de Faria, 1ª Turma, j. 20/02/2024.

(27.01.2025)