Plano de saúde é obrigado a fornecer tratamento para criança autista (TJMT)

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Plano de saúde deve fornecer todos os tratamentos prescritos por médico a uma menina portadora do autismo em Cuiabá. A decisão é da Primeira Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, nos autos de um recurso de agravo de instrumento interposto por uma cooperativa de trabalho médico contra decisão da 8ª Vara Cível de Cuiabá. Em Primeira Instância, o Juízo deferiu pedido de tutela provisória de urgência para determinar que a ré “no prazo de 24 horas forneça tratamento multidisciplinar, psicoterapia comportamental com método de análise de comportamento aplicada e método ocupacional ABA, fixando multa diária no valor de R$ 500 para caso de descumprimento”.

O plano de saúde sustentou que os requisitos autorizadores à concessão dos efeitos da tutela não estariam presentes, pois o tratamento pretendido não possui cobertura contratual e não se encontra no rol de procedimentos estabelecidos pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). A mãe da menina autista combateu os fundamentos recursais e pediu o desprovimento do recurso.

O Juízo de Primeira Instância verificou que, nos documentos constantes nos autos, há um laudo médico atestando o quadro de transtorno do espectro autista, e que aponta que o tratamento tem evidências de melhora do desenvolvimento e do comportamento em crianças com a síndrome e ainda aponta a necessidade da realização do tratamento com brevidade, uma vez que possíveis atrasos podem prejudicar o desenvolvimento da criança.

“Em que pese à requerida em suas negativas mencionar que o tratamento pelo método ocupacional ABA não está previsto no rol da ANS, é cediço que o rol não é taxativo. Destarte, a recusa baseada em tal argumento se mostra indevida”, diz trecho da decisão de Primeiro Grau. “Deste modo, havendo prescrição médica para realização dos tratamentos que são necessários para melhora da saúde e qualidade de vida da parte autora, deve o plano de saúde realizar o custeio”, diz outro trecho.

Inconformada com a sentença, a cooperativa de médico recorreu ao Tribunal de Justiça e o relator da ação na Primeira Câmara de Direito Privado, desembargador João Ferreira Filho, citou trecho de um relatório de 2016 do ministro João Otávio de Noronha, do Superior Tribunal de Justiça (STJ): “O fato de eventual tratamento médico não constar do rol de procedimentos da ANS não significa que a sua prestação não possa ser exigida pelo segurado, pois, tratando-se de rol exemplificativo, a negativa de cobertura do procedimento médico cuja doença é prevista no contrato firmado implicaria a adoção de interpretação menos favorável ao consumidor”.

O desembargador disse que a alegação de ausência de cobertura contratual já tem respaldo na jurisprudência do STJ, que é firme no sentido de ser abusiva a negativa de cobertura pelo plano de saúde de procedimento, tratamento, medicamento ou material considerado essencial para preservar a saúde e a vida do paciente, mesmo porque a opção da técnica a ser utilizada cabe ao médico especialista.

O relator ainda destacou que os relatórios médicos, elaborados por médica psiquiatra, juntados ao processo atestam que a agravada apresenta quadro de atraso do desenvolvimento da linguagem, da interação social e do aprendizado para a idade, com dificuldade na linguagem expressiva e linguagem compreensiva, compatível com as do Transtorno do Espectro Autista. “Portanto, tratando-se de medida destinada à preservação da saúde da agravada, é certo que o plano de saúde deve prover os meios necessários para o efetivo tratamento da segurada, arcando com os custos do tratamento de forma a possibilitar melhor qualidade de vida à paciente”, considerou.

“Presentes os requisitos legais autorizadores da tutela de urgência, impõe-se a manutenção do deferimento do direito suscitado pela parte de obter do plano de saúde o tratamento que lhe fora prescrito. Pelo exposto, desprovejo o recurso”, concluiu. O voto foi acompanhado pelos demais integrantes da turma julgadora, os desembargadores Sebastião Barbosa Farias e Nilza Maria Pôssas de Carvalho.

Leia o acórdão AQUI.

Fonte: TJMT, em 11.05.2019.