Decisão do STJ reforça segurança jurídica na tributação da previdência complementar

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A recente decisão da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, proferida no Agravo em Recurso Especial nº 1.851.180/RS e relatada pelo Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, representa um importante precedente para o sistema de previdência complementar aberta, especialmente sob o ponto de vista tributário. O julgamento reafirma que a definição do regime de tributação aplicável aos planos de previdência e, em particular, a escolha entre as tabelas progressiva e regressiva do imposto de renda, é matéria regida por lei, e não por manifestação de vontade das partes, sendo, portanto, insuscetível de modificação por ato contratual ou decisão judicial que contrarie o regime legal. O caso, patrocinado pelo Escritório Santos Bevilaqua Advogados, sob a liderança de Keila Manangão e Juliana Moura, teve origem em ação declaratória cumulada com pedido de indenização por perdas e danos, ajuizada por participante de plano de previdência privada que buscava a declaração de validade de um termo de opção pelo regime tributário regressivo e pretendia o recebimento de diferenças decorrentes da aplicação dessa alíquota. O STJ, ao julgar o recurso, entendeu que a pretensão era juridicamente inadequada e carecia de interesse processual, extinguindo o processo sem resolução de mérito.

A decisão reconheceu que a entidade de previdência, ao ofertar ao participante a opção pelo regime regressivo, não atuou de má-fé, mas com base em uma interpretação então razoável da Lei nº 11.053, de 2004, posteriormente revista pela Superintendência de Seguros Privados (SUSEP) por meio do Parecer nº 13.833/2005. Essa manifestação técnica esclareceu que o regime regressivo do imposto de renda não se aplicava aos planos de benefício definido, como o envolvido no caso. O equívoco, portanto, decorreu de dúvida legítima quanto à interpretação normativa, e não de conduta dolosa ou omissiva da entidade de previdência complementar. Com base nesses fundamentos, a Terceira Turma do STJ enfatizou que o pedido de declaração de validade da opção tributária é inócuo, porque o regime fiscal incidente sobre os benefícios de previdência privada é determinado exclusivamente pela lei, e não por manifestação de vontade das partes, pois não há ato negocial capaz de alterar a sujeição ao regime tributário legalmente estabelecido. Por essa razão, a Corte concluiu que qualquer pedido de reconhecimento judicial de validade de uma opção tributária que não possa, por si só, gerar efeitos jurídicos concretos, revela-se destituído de interesse processual e deve ser extinto sem análise de mérito.

Sob o aspecto tributário, a decisão assume especial relevância por reafirmar que a tributação incidente sobre benefícios e resgates de planos de previdência é matéria de ordem pública e legal, imune às convenções privadas. O entendimento prestigia a imperativa observância do sistema tributário, evitando que discussões contratuais desvirtuem a competência normativa do Estado e comprometam a uniformidade na aplicação das alíquotas do imposto de renda. Além disso, ao reconhecer que não há direito adquirido a regime fiscal indevidamente oferecido ou mal interpretado, o STJ contribui para evitar a multiplicação de demandas infundadas, que poderiam gerar insegurança e impactos financeiros indevidos no setor. A decisão também destaca que o equívoco interpretativo, quando fundado em dúvida jurídica plausível e corrigido após orientação da autoridade supervisora, não pode gerar responsabilização civil ou obrigação indenizatória. Tal compreensão protege a estabilidade do sistema, reconhecendo que o risco jurídico inerente a mudanças de interpretação normativa não deve ser transferido automaticamente às entidades fiscalizadas.

Ao extinguir o processo sem resolução de mérito, o Superior Tribunal de Justiça valorizou a efetividade da jurisdição e a coerência das relações jurídicas tributárias, ao aplicar o binômio necessidade-adequação como parâmetro do interesse processual, na medida em que o Poder Judiciário não deve ser acionado para convalidar atos sem utilidade prática. Mais do que solucionar um caso isolado, o precedente jurisprudencial projeta efeitos relevantes para o mercado de previdência complementar e para o sistema tributário em geral, pois traça com precisão os limites entre a autonomia contratual das partes e o poder normativo do Estado, assegurando previsibilidade, coerência e equilíbrio nas relações jurídicas. Em um setor que se sustenta na confiança e na estabilidade regulatória, decisões dessa natureza fortalecem a credibilidade institucional e consolidam um ambiente jurídico mais seguro e racional.

Confira aqui o acórdão do Agravo em Recurso Especial nº 1.851.180/RS:  

Fonte: Santos Bevilaqua Advogados, em 11.11.2025