O Comércio Marítimo e o Mercado de Seguros

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Por Darcio José da Mota (*)

Em função do fenômeno da globalização, é inegável a importância do Comércio Marítimo no desenvolvimento econômico e social do Brasil

E assim o é não somente pelo aumento da demanda interna, mas principalmente porque o Brasil conta com uma costa de 8,5 mil quilômetros navegáveis e o transporte marítimo responde por quase 95% do comércio exterior brasileiro, de sorte que o Poder Público, a iniciativa privada e a sociedade devem se preparar para atender às necessidades de uma nova realidade econômica vivida pelo País (http://www.portosdobrasil.gov.br/sistema-portuario-nacional).

Nas últimas semanas testemunhamos vigoroso debate político em torno da votação, nas duas Casas Legislativas, da Medida Provisória 595/2012, que implantará um novo modelo portuário, cujo objetivo é atrair investimentos privados e aumentar a competitividade do setor, através da redução de custos e a melhoria da eficiência na operação logística[1].

No entanto, a difusão de novas regras em torno do comércio marítimo não para por aí.

Em 14/06/2011 foi apresentado pelo Deputado Vicente Candido (PT-SP) no Plenário da Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 1572/2011, que institui o novo Código Comercial Brasileiro, cuja relatoria está a cargo do Deputado Paes Landim (PTB-PI).

O texto do PL, elaborado a partir de obra acadêmica do Prof. Fábio Ulhôa Coelho, possui 670 artigos e está divido em cinco Livros. O Livro I trata da empresa, o Livro II disciplina as sociedades empresárias, o Livro III dispõe sobre as obrigações dos empresários, o Livro IV cuida da crise da empresa e o Livro V traz as disposições finais e transitórias.

Sem entrar na análise da necessidade e conveniência de se criar um novo Código Comercial, o fato é que além das regras relacionadas ao direito de empresa, aos contratos bancários e títulos de crédito, o PL traz outros temas que terão reflexos diretos na indústria de seguros, por exemplo, o Capítulo III, cujas Seções I, II e III tratam, respectivamente, dos contratos de armazém geral, transportes de cargas e fretamento.

Releva, ainda, o fato de que o PL revogará a Lei nº 556/1850, ou seja, a Parte Segunda do atual Código Comercial, que dispõe sobre temas complexos como o Comércio Marítimo e o Seguro Marítimo, sem, no entanto, contemplar novo regramento para essas relevantes matérias, a despeito da crescente internacionalização da economia através do tráfico marítimo.

Com o objetivo de suprir essa lacuna legislativa, foi nomeada uma comissão de juristas para redigir uma proposta de emenda ao PL sobre o Direito Comercial Marítimo, cuja coordenação esteve a cargo do i. Juiz do Tribunal Marítimo, Dr. Nelson Cavalcante Silva Filho.

Em 18/12/2012 foi apresentada na Comissão Especial da Casa Legislativa a emenda nº 56/2012, que pretende incluir ao PL 1572/2011 um novo Livro, denominado Direito Comercial Marítimo, contendo 10 Títulos e 262 artigos.

No Capítulo I – “Da Regência do Direito Comercial Marítimo”, ficou estabelecido que as disposições do novo Código Comercial disciplinam a relação mercantil entre proprietários, armadores, afretadores, transportadores efetivos e contratuais, embarcadores, consignatários de carga, seguradores e todos os demais empresários envolvidos no transporte de mercadorias e nos serviços prestados por embarcações.

Além de estipular os princípios que regerão o Comércio Marítimo, a emenda define os personagens que atuam no setor e regulamenta a atividade do NVOCC – Non Vessel Operating Common Carrier, equiparando-o, para efeito de responsabilização, ao transportador de carga; trata dos contratos de afretamento e regula sobrestadia de containers (demurrage); conceitua e classifica as avarias marítimas e define as regras para o direito processual marítimo, etc. e, no que mais interessa ao mercado de seguros, dispõe, no Título VI, em 16 artigos, sobre o Seguro Marítimo (notem que o atual Código Comercial conta com 65 artigos sobre este tema)[2].

Percebe-se, portanto, que tal como ocorre no atual Código Comercial de 1850, as relações securitárias em torno do navio, do contrato de transporte, do afretamento e da responsabilidade civil serão reguladas pela nova lei.

Não há notícia, todavia, de que as seguradoras, os resseguradores locais e os profissionais que atuam nessa área tão especializada tenham tido a oportunidade de conhecer e analisar essas novas regras do Seguro Marítimo.

Esse novo e complexo quadro, que tem como pano de fundo uma intensa alteração nas relações em torno do comércio e do transporte marítimo e, consequentemente, do seguro marítimo, recomenda que as entidades representativas de um mercado segurador como o nosso, que alcançou a suficiente maturidade, credibilidade e integridade, realize um efetivo exercício de percepção institucional e aja, enquanto há tempo, de modo proativo, no sentido de promover estudos e debates sobre essas novas regras, especialmente sobre a emenda que introduzirá alterações ao Direito Comercial Marítimo, a fim de que nossos profissionais possam apreciar e julgar com ponderação e inteligência os pontos da emenda que merecem ser prestigiados, aperfeiçoados ou combatidos.

Afinal, como dizia Sócrates, o homem é responsável por suas próprias atitudes e por suas omissões e deve buscar em seu interior, a verdade, o bem, a virtude e a justiça.


Darcio José da Mota é Sócio fundador da Pellon & Associados Advocacia em São Paulo e responsável pelo Escritório local. Tem experiência em Direito Civil e Comercial, tanto no contencioso como em contratos de consultoria, em especial no tocante a aspectos jurídicos do Contrato de Seguro e Responsabilidade Civil em geral, em todos os ramos. Exerceu cargo de gerência e diretoria em departamento jurídico e de sinistros de seguradora, tendo experiência nos aspectos relativos à administração e ao gerenciamento legal de empresas. Atuou, também, como Assessor Jurídico do Sindicato das Empresas de Seguros Privados e Capitalização do Estado de São Paulo.

É Mestre em Contratos de Consumo e Direito das Relações de Consumo, pós-graduado, lato sensu, em Processo Civil, ambos pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e pós-graduando em Direito Marítimo e Portuário na Universidade Católica de Santos - UNISANTOS.

É membro da Seção Brasileira da AIDA (Associação Internacional de Direito de Seguros) e atual Presidente do Grupo Nacional de Trabalho de Transportes.



[1] O Brasil tem 34 portos públicos, sendo que 16 deles são administrados por governos estaduais e municipais e 18 por sete Companhias Docas Federais, sociedades de economia mista cujo acionista majoritário é o Governo Federal.

[2] O prazo para a apresentação de novas emendas na Câmara dos Deputados havia encerrado em 06/03/2013, todavia, foi reaberto por 20 sessões a partir de 23/05/2013. Novas emendas também poderão ser apresentadas quando o PL chegar ao Senado Federal.