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Quebra abusiva de privacidade das relações

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Por Ernesto Tzirulnik (*)

Uma das formas mais violentas de quebrar a ordem jurídica democrática é o desvio de finalidade das invasões à privacidade.

No campo tão pequeno das relações de seguro isso acontece – e tem sido cada dia mais frequente – com as chamadas “regulações delatoras premiadas”.

Essas regulações, que temos denunciado, acontecem quando reguladores de sinistros, peritos e outros profissionais a serviço de seguradoras e resseguradoras, até mesmo advogados, abusam da intimidade com que penetram na vida dos segurados vitimados pelos acidentes para selecionar materiais que, mal representados às autoridades, nem sempre atentas, em geral ansiosas por exercer o Poder de Polícia, acabam por produzir resultados que ajudam a recusar o pagamento das devidas indenizações.

A invasão à privacidade é naturalmente truculenta. Quando feita sem razão jurídica, essa incivil coerção, suficiente para abalar as estruturas de governança das sociedades e a psíquica das pessoas em geral, caracteriza um dos mais calamitosos instrumentos de repressão.

Ela é também um instrumento sensacionalista a desviar a atenção do público. Assim, seus promotores avançam ilicitamente e soltando fogos de artifício.

Entre as fumaças, é sublimado o fato de que às vítimas de catástrofes, como a de Brumadinho, é recusado o direito de conhecer as apólices de seguro de responsabilidade civil que as protegem, porque isso significaria “invasão à privacidade das relações contratuais entre segurados e seguradoras”.

Esse fenômeno tão pernicioso para o convívio social toma proporções devastadoras para as democracias à medida que, entre outras relações de confiança e confidencialidade, são arbitrariamente devassadas pelas autoridades governamentais as relações entre os advogados e seus clientes, os psicanalistas e seus pacientes.

Essa doença do relacionamento entre o Estado e a sociedade é típica dos regimes ditatoriais que todos os brasileiros repelem, sejam ditaduras de esquerda ou de direita, nuas ou travestidas.

Dessa ominosa prática valem-se os que, para obter o lucro fácil da vitória injusta, mesmo sem ter fato específico e razoável a investigar, querem abalar o ânimo dos seus opositores e daqueles que os defendem.

A invasão à privacidade da Advocacia Mariz de Oliveira, decretada por magistrado da 10ª Vara Federal de Brasília, é um desses odiosos capítulos que acreditávamos banidos da nossa experiência social, mas que, despercebida e desmedidamente, vem tomando corpo por todas as searas.

O Instituto Brasileiro de Direito do Seguro – IBDS une-se à comunidade jurídica brasileira e suas mais valiosas instituições, como a Ordem dos Advogados do Brasil, para reclamar a prevenção dos abusos e, ocorridos, sejam cumpridamente apurados os fatos e punidos todos aqueles que atentam por esse meio sórdido contra o Estado de Direito.

(*) Ernesto Tzirulnik é Presidente do Instituto Brasileiro de Direito do Seguro.

Fonte: IBDS, em 18.02.2019.