Buscar:

Prêmio IESS: envelhecimento acende alerta na saúde

Imprimir PDF
Voltar

Tema latente hoje em dia, o envelhecimento populacional é, sem dúvida, um grande avanço das novas gerações e enorme mérito da medicina. O fato é que o Brasil e o mundo têm passado por uma mudança demográfica, conhecido os impactos dessa questão nos diferentes setores e ampliado a discussão sobre suas repercussões nos sistemas de saúde

Para se ter uma ideia, dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) estimam que, em 2030, o Brasil contará com mais de 223 milhões de brasileiros, sendo 18,62% com 60 anos ou mais. No mesmo ano, as operadoras de planos de saúde devem gastar R$ 383,5 bilhões com assistência de seus beneficiários. O montante representa um avanço de 157,3% em relação ao registrado em 2017 e acende uma luz de alerta para o setor, segundo a “Projeção das despesas assistenciais da saúde suplementar”, que divulgamos recentemente.

Devido à importância do tema e a necessidade de criar e debater ferramentas para o setor, o trabalho “Envelhecimento populacional e gastos com saúde: uma análise das transferências intergeracionais e intrageracionais na saúde suplementar brasileira” foi o 2º colocado no VII Prêmio IESS na categoria Economia.

Resultado da pesquisa de Mestrado de Samara Lauar Santos na Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o trabalho analisou as transferências intergeracionais (entre indivíduos de diferentes grupos de idade) e intrageracionais (entre indivíduos de um mesmo grupo de idade) na saúde suplementar brasileira. A análise compreendeu uma amostra de 11 operadoras de planos de saúde com aproximadamente 780 mil beneficiários no ano de 2015.

Confira, a seguir, nossa conversa com Samara Lauar sobre o trabalho e a importância da premiação. Não deixe de se inscrever gratuitamente, até 15 de outubro.

A premiação é voltada para trabalhos de conclusão de curso de pós-graduação (especialização, MBA, mestrado ou doutorado) com foco em saúde suplementar nas áreas de Economia, Direito e Promoção de Saúde, Qualidade de Vida e Gestão em Saúde. Veja o regulamento completo. Os dois melhores de cada categoria receberão prêmios de R$ 10 mil e R$ 5 mil, respectivamente, além de certificados, que serão entregues em cerimônia de premiação em dezembro deste ano.

A edição desse ano conta com uma novidade. A cerimônia de entrega também terá espaço para exibição de pôsteres de trabalhos a nível de graduação e pós-graduação. Se o estudo – não necessariamente acadêmico – gerou um artigo, ele pode ser inscrito nessa categoria. No entanto, os pôsteres não concorrem aos prêmios.

Blog do IESS - Como surgiu o interesse pela premiação?

Samara Lauar - Atuo no mercado de saúde suplementar já há alguns anos, e considerando a relevância do prêmio no setor, surgiu o interesse em participar. Vejo que o prêmio é de suma importância para o mercado, primeiro porque a saúde suplementar carece de pesquisas acadêmicas, e também por se tratar de um "link" entre mercado e academia.

A recepção foi muito produtiva e recebida de uma boa forma pelos "players" de mercado. Vários colegas da área se interessaram pelo meu trabalho, buscaram conversar sobre o tema e sugerir ideias para continuação da pesquisa.

Blog - Quais suas motivações para pesquisar o tema do envelhecimento populacional e dos gastos com saúde?

Samara - Como atuária, tive oportunidade de prestar serviço para várias operadoras, especialmente em relação aos processos de subscrição (cálculos de precificações, reajustes, dentre outros), e por diversas vezes perguntei-me como, de fato, ocorrem os processos de transferências intergeracionais, e como o envelhecimento populacional (aumento da proporção de idosos) poderia impactar na sustentabilidade das operadoras. Neste contexto, optei por aprofundar ainda mais minhas pesquisas em prol de algumas respostas que, no meu ponto de vista, embora simples, poderiam contribuir para o nosso mercado ainda tão carente de produções científicas.

Blog - E quais os resultados da pesquisa ao analisar as transferências intergeracionais e intrageracionais?

Samara - Em suma, a pesquisa demonstra que o saldo das transferências de recursos ainda é positivo, ou seja, na amostra analisada ainda há um equilíbrio entre as receitas e as despesas. Destaca-se que, no entanto, ao analisar a evolução da sinistralidade (relação entre as despesas assistenciais e mensalidades), considerando apenas o efeito das transformações etárias, há um constante aumento, sobretudo nos planos individuais, que possuem uma massa mais envelhecida e regulamentações mais restritivas no que tange às políticas de cancelamento e reajuste.

Blog - Em sua opinião, quais os fatores que mais impactam no aumento das despesas? Por quê?

Samara - Há diversos fatores que impactam no aumento das despesas assistenciais, entretanto penso que há dois muito relevantes e que devem ser estudados e acompanhados pelo setor: os avanços tecnológicos e o envelhecimento populacional.

Os avanços tecnológicos tendem a substituir técnicas mais baratas por procedimentos de maior custo, bem como trazem soluções para situações nas quais ainda não haviam procedimentos especializados. Embora também haja possibilidade de redução de custos em alguns casos

Em relação ao envelhecimento populacional penso que, em função do modelo de financiamento atual do mercado de saúde suplementar (repartição simples), poderá haver impactos relevantes ao longo do tempo. Isso porque a maior proporção de idosos tende a gerar cada vez mais seleção adversa, aumentando cada vez mais a probabilidade de insolvência da operação de planos

Blog - Com uma baixa margem de diferença entre as despesas e as receitas, acredita que o setor está ameaçado no médio prazo? Por quê? Como o segmento pode mudar para equilibrar estas contas?

Samara - Penso que não é apenas o envelhecimento populacional o fator agravante deste contexto, sendo este apenas um dos elementos que merecem atenção dos “players” do mercado. Acredito que as ações iniciais devem ser focadas no aprimoramento da gestão das despesas (redução dos desperdícios e risco moral), além de repensar o modelo de remuneração entre operadoras e prestadores (aplicação de modelos baseados em qualidade, ao invés de fee-for-service).

Blog - Como a regulação do setor pode aperfeiçoar para garantir a sustentabilidade nos próximos anos?

Samara - Hoje, a regulamentação imposta aos planos de saúde pode fazer com que os beneficiários com menor risco (mais jovens) arquem com as despesas excedentes das pessoas em idades mais avançadas, pagando valores superiores à sua utilização esperada.

Esse tipo de arranjo pode tornar o plano de saúde uma opção desinteressante financeiramente, caso reduza o incentivo à entrada de pessoas jovens aos planos, ocasionando seleção adversa.

É importante salientar, que antes de pensarmos em alterações regulamentares, é de extrema importância a atenção do mercado em relação à “gestão das despesas assistenciais”. Acredito que grande parte da insolvência observada hoje poderia ser contida por melhorias neste aspecto.

Ainda permanecendo um contexto de insolvência, penso que alguns aspectos poderiam ser repensados, tais como o modelo de financiamento atual dos planos de saúde, e os limites de variação por faixa etária. Hoje o sistema é financiado por um modelo de repartição simples (pay as you go), no qual não há constituição de reservas individuais.

Por fim, saliento que o processo de transição demográfica, e o consequente envelhecimento da população, é um fato consumado, uma verdade vivenciada em todo mundo. No Brasil, bem como em demais países da América Latina, este processo tem ocorrido de forma mais rápida do que o observado na Europa. Neste contexto, independente das ações que serão tomadas, é importante agirmos rápido, e nos adaptar da melhor forma para o contexto que está por vir.

Fonte: IESS, em 19.09.2018.