Novas demandas agitam mercado de consultorias

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Por Martha E. Corazza

A necessidade de crescer e o aumento das demandas dos fundos de pensão diante de um mercado cada vez mais sofisticado em termos de gestão de riscos, adequações regulatórias e desafios de investimentos tem produzido uma série de reestruturações entre as consultorias prestadoras de serviços especializados, conforme mostra o Diário em suas edições de hoje (18) e de amanhã (19), quando será publicada a segunda matéria a respeito do tema.

As consultorias que atuam junto ao sistema, sejam elas nacionais ou integrantes de grupos internacionais, avançam no sentido de maximizar sua abrangência nesse mercado. A aquisição da brasileira Gama Consultores Associados pela americana Mercer, consultoria de recursos humanos que é líder global em gestão de riscos, foi anunciada em novembro de 2015 depois de um período de dois anos de cuidadosas negociações. Ainda no ano passado, uma fusão global no valor de US$ 18 bilhões entre a Towers Watson e o Willis Group também foi concretizada, resultando na criação da  Willis Towers Watson.

A divisão do mercado entre os grandes e os pequenos escritórios é uma realidade no Brasil já há algum tempo, lembra o atuário especializado em previdência e diretor da Conde Consultoria Atuarial, Newton Conde.

Ganho de escala e especialização - As exigências de crescimento rápido e ganho de escala são uma realidade, o que justifica essas operações do ponto de vista financeiro,  mas elas envolvem também a busca de especialização e a complementação de expertise nos diversos nichos de interesse das Entidades Fechadas de Previdência Complementar. “A Mercer teve como objetivo ganhar escala, é claro, porque apenas o crescimento orgânico não era suficiente, mas notamos, além disso, que havia uma grande similaridade de princípios com a Gama, que dispõe de uma equipe técnica composta por excelentes profissionais e tem especialização em um nicho de mercado em que a Mercer não tinha tanta força”, explica Geraldo Magela, diretor da Mercer. Havia interesse em uma empresa que também fosse focada em previdência complementar mas cujas operações fossem diferenciadas em relação às da Mercer.

Sob o ponto de vista da Gama, havia a intenção de ampliar a presença no mercado com novos produtos e maior abrangência geográfica, graças à integração com a Mercer. “Nós já tínhamos uma grande admiração pela qualidade dos profissionais da Mercer, mas as negociações foram bastante cuidadosas porque era preciso explorar o potencial das duas empresas da melhor forma”, observa o fundador da Gama, Antonio Fernando Gazzoni.

Do lado da Mercer, havia uma penetração forte no nicho de fundos de pensão patrocinados por empresas multinacionais e na prestação de serviços voltados às modalidades de planos CD e CV, enquanto a Gama, além de atuar junto a fundos patrocinados por empresas privadas já estava presente também no segmento de fundos de empresas estatais e no atendimento a planos da modalidade BD. “Estamos juntando as vantagens de uma janela aberta para o mundo, que a Mercer oferece, aos mais de 90 clientes da Gama no Brasil”, diz Gazzoni. Com a operação, passam a ser oferecidos de maneira conjunta os serviços de reestruturação de estratégias e metodologias de atendimento diferenciado para os planos que precisam disso. “Do ponto de vista do cliente, a mudança vem para melhorar porque será possível formar preços cada vez mais competitivos, manter o atendimento com qualidade e tempestividade, assim como a busca de maior eficácia e inovação”, afirma Gazzoni.

Convergência e profissionalização - A busca de soluções contemporâneas para os fundos de pensão tende a ser agilizada pela integração das duas empresas, com produtos e serviços disponíveis para os clientes de ambas, pondera Magela. Ele lembra que o mercado de consultorias especializadas em previdência complementar é ainda muito fragmentado, com um número pequeno de empresas que oferecem serviços de qualidade e têm porte razoável para assegurar sua sustentabilidade. “Isso pode causar algum desconforto para os clientes e a tendência natural será a de que em algum momento o mercado caminhe para uma convergência”, avalia Magela.

Essa convergência tenderá a ser mais rápida no que diz respeito às áreas que compõem o back office, de modo a otimizar a gestão do fundo feita pelas consultorias, um serviço que exige sistemas e profissionais qualificados. “As EFPCs buscam maior profissionalização de sua gestão e não é possível conseguir isso olhando apenas para os custos mas é indispensável contar também com requisitos de governança, já que estamos vivendo um novo patamar de exigências de governança nesse mercado”, concorda Gazzoni.  Diante desse desafio, ele acredita que o mercado passará indiscutivelmente por uma reformulação na oferta qualificada de serviços voltados à gestão de investimentos e à administração de passivos. “Outras empresas caminharão nesse sentido, hoje há mais de 60 consultorias atuariais no mercado brasileiro mas as exigências de ferramental para a gestão de risco são cada vez maiores e isso levará a uma depuração”, acredita Gazzoni.

Carência e modelagem - Na avaliação de Newton Conde, o mercado de consultorias atuariais no Brasil ainda é muito carente, não apenas na área atuarial e de previdência mas nas áreas jurídica e de investimentos, entre outras. “Se houver um crescimento acelerado do sistema fechado não sei se as consultorias existentes darão conta do recado”. O que falta para evoluir e ampliar a oferta de produtos qualificados? “A modelagem dos planos nas EFPCs está mudando, não basta mais oferecer apenas um plano CD e esquecer o assunto, será preciso oferecer maior flexibilidade de produtos aos participantes para enfrentar a concorrência com o segmento aberto”, defende Conde. Ele observa, porém, que a maioria das consultorias ainda conhece pouco sobre modelagem, até por uma questão de formação profissional dos atuários, que é mais voltada para o cálculo.

O consultor, que já passou pela experiência de uma parceria com grande escritório internacional no passado, preferiu voltar ao modelo original de seu escritório. “Temos tido diversas ofertas recentemente mas não nos interessamos porque ainda temos mercado para trabalhar e porque o nosso crescimento se dá num segmento em que as grandes consultorias muitas vezes não têm interesse em penetrar”.

Além disso, Conde acredita que haja espaço para grandes e pequenos num mercado em evolução. Ele explica que os fundos de pensão sentem falta de um serviço mais constante e individualizado de consultoria, enquanto os maiores escritórios seguem padrões multinacionais a que estão habituados lá fora, vendem os contratos para as empresas patrocinadoras e fazem um pacote de prestação de serviços do tipo “guarda-chuva”, que abrange diversas áreas além de previdência. “Nesse modelo, os serviços de avaliação atuarial, por exemplo, são feitos anualmente e não há um acompanhamento constante de modo regular, personalizado, o que nem sempre é o melhor para atender às necessidades das EFPCs”.

Fonte: Diário dos Fundos de Pensão, em 18.02.2016.