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Despindo um Santo para vestir Outro

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Por Gloria Faria (*)

gloria faria 2019Alegam alguns que os ditos populares trazem uma aparência redutora da realidade, mas, na maioria das vezes sintetizam perfeitamente suas nuances e circunstâncias.

Foi exatamente o dizer “despir um santo para vestir outro” que me veio à mente, esta manhã, lendo matéria sobre a proposta em estudo pelo governo da possibilidade de extinguir conselhos, que têm função de julgar, em última instância administrativa, recursos contra sanções aplicadas por órgãos públicos, dentre eles o CRSNSP (Conselho de Recursos do Sistema Nacional de Seguros Privados).

Aparentemente, a medida que se encontra em fase inicial de análise, não possui até o momento estudos ou avaliações do custo benefício a ser alcançado. Ainda assim, não me contenho, diante da possibilidade aventada de extinção dos referidos Conselhos, de adiantar que acredito, firmemente, que a ideia não resiste a um aprofundamento na análise de suas consequências.

No caso, o argumento da diminuição da burocracia e dos gastos dos órgãos reguladores e fiscalizadores não se sustenta diante do aumento exponencial da judicialização que ocorrerá com a extinção dessa instância administrativa recursal. Teremos uma enorme quantidade de ações e processos que inundarão os tribunais de primeira e segunda instância e muitos que chegarão, até mesmo, aos tribunais superiores.

E mais, à diminuição dos gastos públicos, se oporá uma (maior) diminuição da entrada de recursos, já que, no caso do setor de seguros, deixarão de existir os valores correspondentes às multas condenatórias (que não é pequeno) e que hoje revertem para o Estado e o próprio órgão fiscalizador, respondendo por boa parte das despesas deste.

O levantamento das ações judiciais derivadas de insatisfação do recorrente face à decisão do órgão recursal administrativo mostra números pouco representativos, dando conta de que o CRSNSP tem sido eficiente e efetivo em seus julgamentos. Também o argumento da dificuldade em se ocupar os assentos nos conselhos esta pode ser facilmente compreendida e saneada pelo próprio governo visto que decorre do aumento das exigências e requisitos burocráticos que fazem com que três dos sete assentos vagos da área pública – um representante da SUSEP e dois do Ministério da Economia – permaneçam vagos.

Quanto aos representantes da área privada (o conselho é paritário) as quatro indicações de candidatos ao CRSNSP, há muito já encaminhadas pelas entidades privadas do setor segurador ao Ministério da Economia, permanecem também aguardando uma decisão de quem de direito.

Com tantas situações incontroláveis que alimentam a insegurança jurídica e afastam os investimentos internos e externos tão caros ao Brasil neste momento de saída da crise e retomada de crescimento é, no mínimo, temerária, a proposta de extinção dos conselhos administrativos de recursos.

(*) Glória Faria é advogada, formada pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro - UERJ, com mestrado ‘latu sensu’ em Direito Empresarial pela Universidade Cândido Mendes com Certificação em Didática de Ensino Superior, IAG Master em Seguro da PUC-RJ, especialização em Previdência pela UERJ, Presidente do Conselho da Associação Internacional de Direito de Seguros – AIDA Seção Brasil, período 2016/2018. Membro da CEDSS - Comissão Especial de Direito Sanitário e Saúde da OAB-RJ, Consultora Jurídica da CNSeg.

(20.02.2019)